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Por que eu indico? -Crows/Worst =ATUALIZADO=

 

Yo!

Vou tentar – tentar – fazer uma serie de postagens indicando bons mangas e tentando explicar por que alguem deveria ler. Comecando com a minha principal indicacao no momento, a serie Crows, e sua continuacao Worst.

BUSOH

Se trocarmos em miudos, essas series sao historias sobre nada de mais, ou sao historias colegiais nao romanticas, ou sao historias de gangues e briga. Em miudos, claro. A historia em si, tem um grande merito, que eh ser simples e marcante, o suficiente pra poder ser estigmatizadas com poucas palavras, mas nessa simplicidade, conseguir prender o leitor.

Eu sempre me surpreendo com o talento do autor, Hiroshi Takahashi, em narrar o nada, momentos estupidos de garotos estupidos, com um futuro nada promissor, um presente tambem nao muito motivante e simplesmente nada de melhor pra fazer da vida, alem de ir pra escola, encontrar os amigos, fazer bagunca… e brigar, claro, sempre com algum motivo.

A trama de Crows – trama soh inicial, claro – gira em torno de Harumichi Bouya, o tipico moleque de gangue dos anos oitenta (o visual, o topetao – que se chama Regent). Depois de arranjar problema no colegio onde ele estava, Bouya vai para o colegio Suzuran, conhecido como o lar dos corvos, o pior colegio da rede. Apesar de ter motivos pra nao gostar de se juntar em turminhas, Bouya logo consegue amigos leais, que o seguem, por amizade, respeito e ateh pra resolver rivalidades.

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Logo a trama jah muda de rumo. Mesmo tendo em Harumichi Bouya o seu protagonista, Crows eh sobre a sociedade fechada dos colegiais japoneses, distante das comedias romanticas azedo-adocicadas. Distante um pouco tambem dos colegios dramaticos de outros mangas, como GTO e Life. Crows eh sobre a vida da turma do fundao, mas num colegio onde o fundao vai ateh a mesa do professor.

E eh incrivel como o motivo tao simples – brigas entre colegios, entre gangues – consegue virar ateh uma especie de historia de guerra. Existem estrategias, aliancas, conquista de territorio e baixas. Companheiros que vao pro hospital, alguns morrem e por mais estupido que seja, eh real. Muito real ateh.

Vemos tambem, claramente, uma sociedade particular. Existem gangues, grupos, rivais, grandes ameacas, uma certa cerimonia as vezes, regras particulares e um codigo de moral muito particular, mas tambem muito forte. Como historias de cadeia.

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70726f647563742f776f727374312e4a50470032353000 Mas ateh ai, o que tornaria Crows distante de um filme imbecil de gangues americano? Acho que eh o lado sentimental de toda a historia. Nao, nao sentimental-romantico. Alias, sao poucos os romances, acho que podemos contar as personagens femininas nos dedos de uma mao soh. Nas duas series! O sentimento que aflora nessa historia eh o companheirismo, a amizade.

Crows mistura momentos de acao, com brigas entre colegios, com momentos reais e dramaticos, como quando um membro da gangue descobre ter uma hemorragia grave no cerebro, fruto das brigas interminaveis. Mas nao temos momentos chorosos. Vejam bem, sao um bando de moleques com o orgulho e a testosterona no pico. Nao tem espaco pra acucar. Os companheiros, todos quebrados e burros, soh conseguem pensar em uma coisa. Juntam todo o dinheiro que podem numa jarra e dao pro companheiro, pra pagar pelo menos uma parcela pequena do tratamento. Sem tristeza, esperando sinceramente o melhor.

crows Esse acaba sendo o charme de Crows. Os personagens, verdadeiros ateh a medula, sao burros, assumidamente, mas se esforcam por alguma coisa, pra melhorar pelo menos um pouco, mesmo que eles nao facam nem ideia de como melhorar o mundo. A visao de Takahashi para essa historia nao eh a de um bando de arruaceiros armando o barraco e comentendo crimes. Takahashi, que jah foi um desses corvos, ve esses garotos como pessoas realmente bem intencionadas, querendo uma vida melhor, mas sem saber pra onde ir.

Existe uma tradicao na historia de Crows e Worst. A cada fim de ano, quando os alunos mais velhos se formam, duas tramas sempre acontecem. A despedida dos personagens e o reestabelecimento da hierarquia dos colegios, com a entrada dos novatos.

theater8_mastermaind_01-thumb-450xauto-10410 Nas despedidas, sempre vemos uma mistura de sentimentos. O respeito dos mais novos, a saudade que fica nos formandos, os sonhos crescendo e em alguns casos, a realidade batendo. Claro, afinal, todos nos sabemos que o futuro de quem nao estudou no colegio eh bem estreito. Um caso que foi bem forte pra mim foi o fim que levou um dos capangas do vilao de uma das tramas. Largando o colegio pra ir trabalhar, o garoto bateu de frente com a frieza do mundo com as pessoas que vieram de um colegio com mah fama. Pior, as cicatrizes no rosto, marcas de alguem que lutou por seu orgulho, agora sao vergonha. O orgulho, que ele mostrava nas suas primeiras aparicoes jah tinha apagado, e agora ele abaixava a cabeca pra um magrela de oculos, que poderia muito bem estar tremendo de medo soh de olhar pra ele.

Essa camera documental do mundo das gangues que eh tao particular de Takahashi, rendeu frutos. Crows tem fans famosos no Japao, e apesar de ter passado anos sem ter um grande destaque, quinze anos apos sua estreia, Crows explodiu.

th_matsuri Nao que jah nao tivesse fama. Crows tinha seus leitores fieis, jah da epoca de sua publicacao original, de 1990 a 1998, mas foi com o kanzenban, a edicao definitiva, que saiu em 2004, que Crows explodiu.

Crows eh a serie mensal que mais vendeu em kanzenban. Num geral, suas vendas ficaram ao lado de grandes sucessos, como Slam Dunk e Dragon Ball. E isso eh um grande feito, ainda mais para uma historia publicada na Shonen Champion, a “quarta revista” shonen, sempre, sempre a sombra da Magazine, Sunday e Jump.

E isso rendeu frutos. Crows finalmente virou filme, nas maos de Takashi Miike, aquele que fez Sukiyaki Western Jango. Ok, aquele filme em que o Quentin Tarantino faz uma participacao. O que importa eh que ele eh um diretor cultuado no Japao, por sua visao pessoal e bem forte. No filme, Crows ficou um pouco mentiroso, por conta das pessoalidades do diretor, mas o que interessa estah lah. O orgulho, machista e fedido, o respeito e amizade entre os companheiros e aquela impressao de que todo mundo quer apenas encontrar o seu lugar no mundo, mas nao sabe como, e precisa tentar. E por isso eu considero um filme legal, mesmo nao sendo uma adaptacao fiel.

618TXHSqUcL Alias, a historia do filme se passa antes do manga. Os novatos do filme sao os veteranos do manga. E o segundo filme, que estah estreando dah continuidade direta ao primeiro filme, mas ainda nao chega a historia de Bouya.

Essa eh na verdade, a segunda adaptacao. Na decada de noventa, Crows jah virou uma serie de OAV, que adaptava a batalha do colegio Suzuran contra a gangue Busou Sensen.

Se eu ainda nao consegui convencer voce a ler esse manga (ou nao, nao sei em quantas linguas ele jah foi traduzido – POR FAVOR, nao leia scan!!!!), se voce realmente nao se interessa por esse universo machista e suado, entao, soh posso dizer mais uma ultima coisa. Tente ler soh dez paginas (em geral nao tem tanto texto, eh rapido de ler) e parar. Tente parar de ler Crows. Serio! Eu li a serie toda em poucos dias, 26 volumes, mais alguns de Worst, que ainda estah sendo publicado. E como nao consegui parar, fui atras de outras series do autor, como QP e Kick. E series de seus assistentes/discipulos, como Hey! Riki. E de series inspiradas ou de fans, como Drop (que tambem virou filme recentemente, dirigido pelo proprio autor). E isso por que eu li no comeco PRA FALAR MAL!

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Eu indico Crows/Worst e toda a bibliografia de Hiroshi Takahashi. Katsura eh minha meta, Urasawa eh meu idolo, mas Takahashi com certeza eh o espirito. O espirito de querer contar uma boa historia, de todo jeito.

>Bakuman – parte 2

>Yo!

O post anterior na verdade, deveria ter sido a segunda parte do post sobre Bakuman. Lembrei depois que terminei.

O assunto em questao deveria ter sido a diferenca entre os autores, a forma de criar. Em Bakuman, isso eh enfatizado pelo rival da dupla da historia. Niizuma Eiji eh a natureza da criacao. Genial, talentoso, sua vida se resume ao manga. Quando estah criando, ele entra na historia e em certo ponto, ele mesmo diz que nao sabe o que esperar de suas historias, ele mesmo fica ansioso pra saber como vai ser. Isso porque ele deixa os personagens viver e escolher os caminhos.

Por causa disso, sua forma de criacao tambem eh diferente. Ele nao faz o nemu, o rascunho da historia. Eiji parte direto pra producao das paginas. Vai desenhando direto com a pena, sem lapis. Pra uma pessoa comum, isso eh impossivel. Voce precisa ter uma imagem muito forte da cena e uma habilidade muito grande pra passar essa cena pro papel.

A outra opcao eh a de Akito, escritor da dupla. Ele faz sinopses, pensa em historias por dias, e soh entao eh que ele faz o nemu, para que seu parceiro desenhe. Suas historias sao planejadas, as reviravoltas sao colocadas sob medida e a trama eh mais inteligente. Para algumas historias, isso eh simplesmente inevitavel, voce precisa de um pouco de planejamento, por exemplo, se quiser fazer uma historia de suspense, ou uma grande conspiracao, como 20th Century Boys.

Em 20th Century Boys, Naoki Urasawa, autor de Monster, faz uma historia de herois completamente peh no chao, usando elementos pops e a onda de nostalgia que se espalhou pelo mundo todo nesses ultimos anos. A historias comeca com flashs diversos de historias que vao aparecer somente dez, vinte volumes pra frente. Sao anos de publicacao! Talvez ele nao tivesse tudo planejado, mas de certa forma, ele precisou armar um esquema para que a historia seguisse um trilho.

Porem, alem disso, Urasawa eh um meste em criar personalidades. Cada pessoa que aparece na historia eh verdadeiro, real. Cada um tem um jeito diferente, lembra alguma pessoa real que voce jah deve ter visto e age conforme o esperado.

Eh a uniao do modo Eiji, de deixar os personagens agirem, com o modo Akito, de planejar tudo.

Ai, volto para minhas antigas historias. Na minha experiencia (??), eu jah fiz de tudo. Ateh Dream Maker, eu praticamente nao fazia rascunho, desenhando direto, soh finalizando depois. Minhas historias soh tinham mais ou menos a quantidade de paginas marcadas – quatro ou cinco folhas sulfites dobradas no meio, que dao mais ou menos vinte paginas por historia – e eu ia escrevendo e deixando as ideias cairem na folha. Assim, em duas horas eu tinha a historia completinha. As vezes, menos. E eu escrevia muito e tinha muitas ideias! No Brasil, eu tinha um armario onde um espaco, de mais ou menos um metro cubico, era soh de historias em folhas sulfite dobradas no meio. Eu gastava um bloco de 500 folhas em um mes, dois. Era cliente da Kalunga da Vila Mariana…

Eu era um Eiji. Nao tinha pretensao de virar profissional, era soh um hobbie, que nasceu do meu gosto por desenhar, mais o prazer de ler, que eu tinha descoberto a pouco tempo, com X-Men. Meu negocio era desenhar, criar personagens, historias, imaginar.

A primeira mudanca na forma de escrever aconteceu quando eu comecei a fazer fanzine com alguns amigos da escola. Escrever em grupo, com tres, quatro pessoas no mesmo comodo, conversando e trocando ideias, ou simplesmente com os outros lendo no meu ombro, enquanto eu escrevia, jah mudava.

O modo Eiji de escrever infelizmente eh um jeito bem egoista de escrever. Voce escreve pra voce mesmo, o que voce quer, da forma que voce preferir. Por isso, eh o terreno dos genios. Fazer algo realmente bom disso eh algo em torno de um em um milhao. Nao existe um know how de como fazer leitores, voce precisa esperar o resultado. Nesse caso, o modo Eiji eh uma loteria, onde voce tem soh o talento criativo como arma.

Por isso, trabalhar em grupo foi uma coisa muito boa. Alem de agregar novas ideias e formas de criar, voce ainda tem um feed back instantaneo. Voce sabe o que agrada e o que nao agrada na hora. Claro, tem aqueles que gostam de passar a mao na cabeca e tudo que voce faz eh muito bom. Mas nao deixa de ser proveitoso, nem que seja como apoio moral.

Dessa epoca, eu tive minhas primeiras experiencias de colaboracoes. Em geral, eu escrevia para alguem desenhar. Basicamente, eu fazia o que eu sempre fazia, sem finalizar. Dai, alguem desenhava por cima.

Com o tempo, isso me ensinou como eh importante ter algum planejamento. Pensar nos leitores eh uma coisa, mas pensar em um possivel parceiro de trabalho eh completamente diferente. Se voce nao passar a ideia certa, nao souber expressar sua visao da forma correta, o desenhista pode errar, pode fazer diferente, pode colocar elementos que nao existem e nao colocar outros, e na pior das hipoteses, pode mudar a historia.

Mais pra frente, eu pretendo escrever sobre algumas formas que eu conheco de como indicar o desenhista.

Escrever, quando passa da fase do escrever por prazer e passa a ser escrever para alguem, com algum objetivo, eh algo muito mais complexo. Esse inclusive eh o tema das historias mais recentes de Bakuman. Nao importa o quanto voce ache que tem talento, que eh um genio. Lidar com a sorte, jogar com seu publico pode dar uma chance pra voce um dia, mas nao todos os dias.

Em Bakuman, os proprios editores falam que Eiji eh o tipo do sucesso instantaneo, mas descartavel. Eh o tipo de pessoa que faz um grande sucesso mas nao consegue implacar outros. Pro lado da editora tambem eh uma loteria…

Historias antigas e personagens bons.

Yo!

Eu estava arrumando meu quarto, coisa que soh acontece em ano bissexto, e milagrosamente aconteceu esse ano. Entao, no meio da bagunca, achei algumas historias antigas, umas que me deixaram particularmente orgulhoso, outras, nem tanto.

Eu pretendo algum dia poder avaliar algumas delas aqui. Tenho varios capitulos de Dream Maker, uma comedia romantica que fiz no impulso de I”s e outros mangas que eu lia na epoca. Tem o meu primeiro fanzine publicado, Demon, que eu criei anos atras, aos dez, onze anos. Uma historia nada saudavel pra uma crianca escrever, sobre um cara que faz um pacto com o demonio e volta ao mundo dos vivos pra descobrir que toda sua vida jah andou sem ele. Logo em seguida, Todd McFarlane anunciou que seu titulo, na vindoura Image Comics, tinha a mesma ideia.

Pra mim, a historia era completamente diferente, apesar da mesma premissa. Voltando minha memoria, lembro de como fiquei revoltado quando soube disso, mas pensando bem, Spawn era bem diferente. Demon era humano, somente um grande feladaputa, sadico, mentiroso… Minha diversao na epoca era criar as torturas e ameacas mais estupidas, do tipo arrancar a pele com uma colher de pau, quebrar os dentes e fazer engolir… Meus amigos morriam de rir com essas ideias estupidas.

Alem de tudo, ainda tinha a mascara, que era uma copia clara da mascara do Wolverine. Na epoca, eu lia X-Men religiosamente, o que explica. Todo mundo tem um heroi copia de outro. Mais pra frente, me cansei dos meus colegas de zine chamando Demon de Wolverine de ferro e mudei o visual, tirando a mascara e colocando um tapa olho, pra fechar um olho que ele vaza no meio da historia.

Ele foi o meu xodoh por anos, ateh eu cansar de historias de heroi e comecar a tentar coisa diferentes. Foi ai que eu fiz Dream Maker. Eu comecei a ler manga, ainda em japa, mais ou menos nessa epoca. Trabalhava na Liberdade, entao, sempre dava uma olhada nas livrarias da regiao.

Dream Maker envolve algumas viagens minhas, algumas experiencias e meu gosto por comedias romanticas. Reler os capitulos me fez relembrar como eu me esforcava em fazer piadas. Vou ser sincero, nao nasci pra comedia. Meu senso de humor eh muito peculiar, nao eh facil fazer os outros rir assim. Mas em Dream Maker, eu arriscava historias inteiras disso, sem contar as passagens romanticas, que me enchem de vergonha.

Depois de Dream Maker, eu pensei em fazer uma historia que misturasse as comedias romanticas com acao e piadas diferentes. Foi quando eu criei Ace Spade, uma historia de espionagem e comedia, com um pouco de romance.

Relendo Ace Spade, eu percebi meu ponto alto nas piadas. Eu consegui rir delas, mesmo que as paginas ainda estivessem sem texto (eu parei na metade, desisti dela). Tambem foi uma epoca em que eu comecei a testar um traco mais leve, agil, com mais angulos ousados e comecando a usar um pouco de narrativa visual de verdade.

Meu proximo manga seria True Love, outra comedia romantica, com cupidos tentando acertar um triangulo amoroso para poderem subir de cargo. Foi meu primeiro trabalho feito pra teste na Shonen Jump. Hoje, soh guardo de boa lembranca, uma pagina onde eu testei um giro de camera, uma ideia muito legal, que eu uso ainda hoje.

True Love foi ainda meu primeiro manga em papel especifico pra manga. Ateh aqui, eu usava sulfitao. Foi um trabalhao pra aprender o que significava as marcacoes, e me inibiu muito na diagramacao. Nao sabia qual era a linha de corte, ateh onde eu podia desenhar, colocar baloes…

Chegamos entao em Cyberserk. Pra mim, foi o ponto alto. Finalmente um trabalho onde eu pude aplicar narrativa, uma historia bem pensada, planejada… Foi minha segunda historia para concursos da Jump e a primeira que saia do genero de comedia romantica. Era claramente uma historia de aventura. Nao que eu nao tivesse feito nada diferente disso antes, mas Cyberserk foi provavelmente a primeira vez que eu consegui algo realmente significativo.

Revendo essas historias antigas, eu pude ver muita coisa. O quanto minhas historias precisavam de narrativa, o quanto eu fugia do assunto principal que eu gostaria de abordar em cada historia. Nas primeiras, ateh a essencia fugia, por que eu pretendia somente me divertir com herois. Nao havia nada pra contar, eu somente fazia historias com coisas que eu achava legal.

Eh tao estranho voltar no tempo e ver o que mudou. Ver o quanto eu gostava de super heroi, depois, de comedia romantica. E apesar de tentar outras coisas, eu estava sempre centrado em fazer o que eu gostava. As vezes nem ao menos tinha algo pra contar, eram soh historias de porrada ou coisa assim. Mas ai eu percebi uma coisa que eh muito interessante pra mim hoje.

Meus personagens pareciam vibrar na historia. Eles tinham mais vida, eu via eles viverem na historia ao invez da historia os levar.

Isso me lembra o texto final do quarto volume de QP, manga de Hiroshi Takahashi, autor de Crows.

Takahashi agradece o pessoal que se voluntaria pra ser assistente dele e que sonha em ser mangaka. E depois dah umas dicas basicas do que fazer pra se tornar um. A primeira eh escolher o genero que quer fazer, mas nao do tipo “…entao, vou fazer um manga de esporte”. Tem que ser aquele que te escolhe, que voce nao tem como fugir, aquilo que voce gosta, entende e poderia falar por horas, dias, sem parar. A segunda eh criar um personagem principal cativante. Por que? Por que ter um personagem cativante e bem estruturado eh praticamente jah ter sua historia. Um personagem bom nao precisa de historia, mas a reciproca nao corresponde.

Isso me fez voltar aos mangas de Takahashi e lembrar o que torna ele tao bom.

Vou explicar. Eu comprei um volume de Worst, continuacao de Crows com outro protagonista, meio sem pretensao, soh por curiosidade. Afinal, existe um ar cult nesse manga que era inexplicavel pra mim. Serio, figuras da serie sao vendidos a 15, 30 mil ienes alguns (dah uns 300 dolares! Imagina agora, na alta do iene).

Lendo esse volume, numero um de Worst, eu entendi. A historia simplesmente nao existe. Eh somente o cotidiano do colegio Suzuran, lar dos maiores vandalos da cidade, que nunca tem o nome citado, mas parece ser algum lugar em Yokohama. Mas voce nao consegue parar de ler.

Os personagens arranjam brigas, lutam por territorio, jogam conversa fora, falam sobre seus sonhos pra depois de se formar, sobre o que gostam… E mais nada! Claro, tem uma coisa ou outra, sem relevancia alguma, muitas vezes esquecida, que poderia ser um fiapo de historia. Mas o mais interessante eh como os personagens te fazem acreditar na historia e muitas vezes, ateh sentir respeito e admiracao por eles.

E nao eh todo personagem que voce pode fazer isso. Eh dificil criar um personagem que atraia algum sentimento real, ainda mais o respeito. Po, eh um pedaco de papel! Mas quando a bidimensionalidade dah lugar a profundidade de um personagem, o mundo parece tomar forma.

Eh esse tipo de personagem que eu pretendo construir. Que qualquer um deveria pretender construir. Um personagem certo, com gosto, que odeia algo, que tem manias e que possa parecer humano. Eh uma coisa que eu sabia pela natureza, que eu fazia sozinho, mas que o tempo e a obcessao por tecnicas que o estudo trouxe matou.

O melhor de criar bons personagens eh que ele te indica o caminho. Um personagem bem construido te diz nao quando voce quer que ele faca alguma coisa indevida a personalidade dele. E muitas vezes, anda sozinho, decide dentro de sua cabeca o que vai ser da historia e como ela vai terminar.

Demon era sadico. Era doente de tao sadico. Mas ele seguia suas regras, gostava claramente de algumas coisas, respeitava algumas coisas e detestava outras. Lembro que isso definia a historia, depois, eu soh dava o rumo, deixando o personagem decidir.

O proprio Wolverine, hoje arroz de festa da Marvel, comecou a ser festejado por isso. Ele eh (ou era) um personagem simples e definido. Ele nao tinha neuras, traumas. Ele gostava de algo, nao gostava de outra coisa. Fumava, bebia e matava, mas tambem era o cara que segurava os personagens que passavam do limite. Nos viamos a personalidade dele e suas historias eram condizentes. Nao tinha como errar, o Wolverine era “o melhor no que faz” e ponto. Ateh os caras decidirem lah de cima que ele viraria o Emorine. Mataram a praticidade dele e assim, mataram as chances de boas historias.

E o que dizer de Naruto? As primeiras historias mostravam o lado mais interessante dele, o olhar certo, pra frente e que nao desiste nunca. Isso o tornava o personagem mais interessante, de longe. Mas ele tambem foi emotizado, ficou triste, raivoso, sei lah. A imagem que tinhamos dele, dando aquele sorriso malandro e gritando que iria se tornar o Hokage, morreu. E com isso, morreu a historia, que hoje eh uma vaca manca, tentando pastar. Se esforca, mas nunca consegue nenhum ponto alto.

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Manga, nao sei o que eh. Mas com certeza, investir nos personagens eh parte do manga. Todo manga investe em personagens coesos, simpaticos ou pelo menos, criveis. Me remete a Tezuka, que dizia que suas historias mudavam de acordo com o personagem que ele usava pra contar.

Nao estou encontrando um jeito bacana de fechar esse post, enorme… A cada linha me vem mais ideias, por isso… Fica pra um proximo post! (nao fechei!)

PS – O Hiroshi Takahashi continuou, com uma terceira regra. Criar nomes marcantes. Nomes legais ajudam a manter o personagem na memoria. Ele tem o costume de pegar o dicionario e escolher dois kanjis e completa-los pra formar um nome. Ou pega do meio de listas de resultado de concurso. O importante eh o nome bater com o personagem, por que eh como ele vai ser chamado sempre.

>Bakuman – parte 1

>Yo!

Fechamos um ano, entramos no proximo e finalmente eu estou postando de novo!

Quero aproveitar o lancamento do primeiro tankohon de Bakuman para discutir alguns pontos interessantes. Coloquei parte um por que eu jah espero ter muito assunto.

Antes de mais nada, melhor apresentar o trabalho. Bakuman eh o atual trabalho da dupla Oba Tsugumi e Obata Takeshi, a mesma do aclamado Death Note, que virou filme, anime e tudo mais.

Da mesma forma que o trabalho anterior, a intencao da dupla era fazer algo diferente da linha atual da Jump, vencer pela originalidade. E fugiram ateh mesmo dos moldes de Death Note.

A historia conta a trajetoria da dupla Akito Takagi e Moritaka Mashiro, tentando a carreira de mangaka. O tema pode nao ser tao original (existem alguns classicos com o tema, como Manga Michi e Otoko no Jouken) mas a abordagem e a profundidade com que explica o cenario torna Bakuman um manga unico.

Claro, eu podia continuar fazendo um review do manga, mas nao eh essa a intencao do blog. O que eu quero eh falar sobre o que significa ter esse manga nas prateleiras e nos postos altos do ranking de popularidade da Shonen Jump.

Misturando um lado quase documental da carreira de um novo talento dos mangas com uma simples historia de colegiais, Oba consegue fazer um manga interessante, empolgante e ao mesmo tempo, didatico.

Em um unico tankohon ele consegue ser mais util pra um aspirante a mangaka do que um livrao de "aprenda a fazer manga". E nao fica em licoes bestas como aprender a desenhar, aprender a fazer tal coisa. Ele ensina o que voce vai ter pela frente, com que preparo voce tem que enfrentar uma carreira como essa e o quanto isso eh distante da ideia de publicar historinhas de samurais futuristas lutando contra o mal.

Um pouco atras eu comentei sobre Otoko no Jouken e Manga Michi. Os dois sao classicos do manga e apontados por varios artistas como a inspiracao para seguir a carreira. Para quem estah suando por um espaco, ler esses mangas preenche o vazio que sentimos as vezes com a frustracao de um trabalho mal recebido, ignorado pelo publico. Ou aquele que sentimos quando nao conseguimos encontrar a ideia certa, quando o mercado parece tao distante, a ideia de publicar parece tao impossivel. Eh a alma do mangaka.

Bakuman preenche a lacuna da versao dessa geracao para essa alma. Ler Bakuman deixa os dedos cocando, o papel branco parece implorar pra ser rabiscado. Acho que o mais proximo disso no Ocidente sao os livros de Will Eisner (acho os do McCloud interessantes, mas nao inspirantes) mas sao livros, materiais didaticos, conteudo. Nisso, Manga Michi, Otoko no Jouken e Bakuman sao completamente diferentes. Eles nao "ensinam", eles te dao informacoes valiosas enquanto voce le uma boa historia, que jah eh por si soh o melhor exemplo pratico.

—Alias, no Brasil nao conheco NADA parecido. Se bem que seria uma historia dramatica, publicar no Brasil tah mais pra um dramalhao mexicano, daqueles que tem um pobre, ferrado que eh chutado por todos os lados. Imagina, as editoras querendo publicar de graca, o publico que passa a mao na cabeca mas NAO COMPRA, fanzines saindo por editoras, o cara fazendo bico pra poder comer enquanto publica, tomando na tarraqueta, imitando Naruto, Pokemon, Bleach ou Dragon Ball, ou todos ao mesmo tempo… Nao, nao seria nada inspirador, muito pelo contrario.

Eu acho que eh sempre bom ter um manga desse naipe na prateleira, para poder folhear nas horas em que o mundo parece estar contra o teu sonho de ser mangaka. Pode nao te abrir nenhuma porta, mas faz uma coisa importante. Te lembra que voce soh nao estarah lah se desistir…

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Em tempo: no tankohon, foi incluido a evolucao da historia, com o nemu (rascunho posterior da historia) na versao Oba Tsugumi e depois na versao do Obata Takeshi, antes dele desenhar. Eh bom pra ver o quanto Obata eh importante. Ele praticamente refaz tudo, dita o ritmo, acerta a decupagem… a narrativa visual eh completamente trabalho dele. Nao desmerece o roteirista, que ainda eh o dono das ideias otimas e dos dialogos afiados.