Idols Japoneses, Fãs Possessivos e Namoros Proibidos – Parte 2

A segunda parte do post sobre a história dos idols no Japão!

Na primeira parte do post especial do Mithril com a história dos idols no Japão, falei sobre como eles surgiram, a febre nos anos 80 e também o declínio de popularidade que os idols sofreram na década de 90. Nesta segunda parte, seguindo a linha do tempo, falarei sobre o retorno da cultura idol no Japão a partir dos anos 2000 e tudo o que gira em torno dessa super indústria como polêmicas, estilos e o que podemos esperar do futuro!

O  retorno sem precedentes da cultura idol japonesa

Desde a metade dos anos 90 alguns grupos idols de garotas começaram a surgir, mas devido ao grande numero de bandas de j-rock e até os idols masculinos, eles continuavam sendo apenas grupos de pequenos nichos. O primeiro grande grupo que começou a ter um relativo sucesso nessa época foi o SPEED, grupo formado por quatro garotas de uma renomada escola de atores de Okinawa, a mesma onde Namie Amuro se formou. Após assinar contrato com a gravadora Toy’s Factory e não com a Avex, casa de Namie e a gravadora que dominava completamente o mercado fonográfico japonês, o SPEED começou aos poucos ganhar notoriedade depois que seu primeiro single “Body and Soul” vendeu mais de 665 mil cópias em 1996. Foi um sucesso tão grande que com seu primeiro álbum elas já conseguiram alcançar o número 1 da Oricon como álbum mais vendido. A carreira do SPEED crescia ano após ano, cada vez mais até que fizeram uma tour pelos quatro grandes Domes do Japão: Tokyo Dome, Nagoya Dome, Osaka Dome e Fukuoka Dome, sendo assim o primeiro grupo feminino da história do Japão a conseguir tal feito.

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SPEED

Em 1999 o SPEED anunciou que iria acabar, pegando muita gente de surpresa pelo fato do grupo estar no auge de sua carreira, vendendo singles álbuns e fazendo shows em tudo quanto é canto. Tal separação aconteceu para diminuir o ritmo do grupo, mas elas nunca chegaram a se separar de verdade, apenas não lançavam mais coisas como antigamente e não faziam mais shows sendo que anos mais tarde o grupo iria voltar a ativa com as integrantes mais velhas e com uma visão de sucesso e personalidades muito mais maduras.

Com o sucesso do SPEED o mercado começou a ver que as idols femininas ainda tinham espaço no mundo da música, bastava apenas saber quem atingir. Foi assim que surgiu o Hello! Project e consequentemente o Morning Musume em 1997. Produzido pelo músico Tsunku, nome artístico de Mitsuo Terada, da banda Sharam Q, o Morning Musume surgiu de uma audição envolvendo uma solista, Michiyo Heike, que canta até hoje mas que foi ofuscada pelo grupo formado por 5 garotas que haviam perdido a audição para solista. Tsunku decidiu lançar um desafio para o grupo: Vender 50.000 cópias de um demo chamado “Ai no Tane” em eventos específicos. As meninas conseguiram o feito e assim Tsunku criou o Morning Musume com a premissa de ser o maior grupo feminino da história do Japão.

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Morning Musume

O Momusu a cada geração se renova, sendo que nos últimos anos essa renovação se tornou quase anual, e o grupo segue um estilo muito próprio de se fazer música, principalmente pela influência de Tsunku. O Hello! Project após o Momusu começou a lançar mais e mais grupos e idols solo vendo que o mercado só aumentava para esse tipo de artista. A variedade de estilos é tão grande dentro do Hello! Project que surgiram coisas como um clube de futsal chamado “Gatas Brilhantes H.P.”, assim mesmo em português, que consiste em pegar várias idols e juntar para jogar uma pelota. Consequentemente, desse clube de futsal surgiu um grupo de música, o Ongaku Gatas, porque claramente eles precisavam de algo a mais do que idols jogando bola. Vários outros grupos surgiram no Hello! Project, todos com seus estilos muito bem definidos e sonoridade bem distinta.

Ainda antes da virada da década, Johnny Kitagawa, produtor dos grupos da Johnny’s Entertainment decidiu criar mais um grupo para o seu já estabelecido leque de grupos de idols masculinos. Era verão em 1999 e Johnny decidiu juntar alguns garotos que eram Juniores em sua agência com outros que acabaram de entrar para formar o Arashi, aquele se se tornaria o maior grupo da agência após a “retomada” do mercado da música pelos idols. Junto do Arashi vieram outros grupos como o NEWS, o KAT-TUN e o Kanjani8, todos influenciados pelo sucesso inicial do Arashi mas cada um com suas características e estilos completamente diferentes. Se o SPEED foi o responsável pelo retorno dos grupos idols femininos, o Arashi foi o responsável pelo retorno dos grupos idols masculinos, aproveitando o fato de que o SMAP não deixou que essa indústria acabasse nos anos 90 segurando o gancho para que os idols não sumissem.

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Arashi

Mesmo a Johnny’s Entertainment, ou JE, sendo extremamente influente no mercado de idols japoneses, principalmente com relação à música, não podemos nos esquecer que lá ná década de 90 os idols começaram a se expandir para diversos ramos do entretenimento japonês e um desses ramos, talvez o mais importante junto da música, é o de atores e atrizes.

A Watanabe Productions, empresa que existe desde 1955 e foi fundada por Shin Watanabe e sua esposa Misa Watanabe, é um grande grupo de mídia japonês que já praticamente trabalhou com tudo relacionado a televisão no Japão. Em 2000, com a visível volta da popularidade dos idols, eles decidiram criar uma subsidiária especialmente voltada para esse mercado: A Watanabe Entertainment. A WE trabalha produzindo conteúdo para TV e rádio sendo que em 2004, querendo pegar a fatia do mercado voltada para atores, decidiram criar os D-BOYS, um grupo que ao contrário dos Johnnys da Johnny’s Entertainment que começaram como grupos de música que tinham membros que se tornariam atores mais tarde, tem o foco em atores japoneses que começam a carreira relativamente jovens e que além de demonstrar muito talento, são verdadeiros “cavalheiros” (ikemens, ou homens muito bonitos, com aura de príncipe encantado). No caso dos D-BOYS o caminho foi inverso, com atores se tornando ocasionalmente cantores anos mais tarde.

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D-BOYS

Outra empresa de idols bastante conhecida no Japão é a Stardust Promotion, outra gigante do mercado de entretenimento japonês que atua tanto no mercado de cinema e televisão com doramas, como na música com grupos e cantores solo. Caminho parecido tem a Amuse, que assim como a Stardust, atua em diversos meios voltados para o entretenimento. As duas empresas surgiram no final da década de 70 e desde aquela época tem uma grande rivalidade entre seus agenciados, principalmente porque muitos deles batem de frente no mercado de gravure, televisão e música por serem idols mais ou menos da mesma idade e mesmo estilo, além de um público extremamente semelhante.

É importante ressaltar que os atores japoneses sempre foram considerados grandes estrelas do cinema e da televisão, mas foi a partir da década de 80 e principalmente depois dos anos 2000 que eles começaram cada vez mais serem agenciados por empresas como a Stardust e a Amuse, totalmente voltadas para idols de todos os estilos para os mais diversos mercados. Pode-se considerar que mesmo atores e atrizes não tendo a mesma exposição ou até mesmo a multidão de fãs e produtos relacionados a sua carreira expostos quanto grupos de músicas, eles são sim considerados idols pelo seu estilo, suas personalidades e forma como são tratados pela mídia no geral.

Durante toda a primeira metade dos anos 2000 cada vez mais grupos idols surgiam, tanto masculinos como femininos e a cultura idol começava a se restabelecer no Japão, até que em 2006 Yasushi Akimoto, um produtor músical que fez carreira produzindo programas na TV e escrevendo músicas para grandes artistas durante a década de 90 e 2000 decidiu criar, depois de sucessivas tentativas – aquele que é considerado o grupo idol de maior exposição e vendas que o Japão já viu: O AKB48.

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AKB48

Yasushi criou o AKB48 com o intuito de juntar tudo aquilo que havia feito sucesso nos anos 80 e mesclar com a cultura otaku e idol de grandes centros urbanos que ferviam no Japão. O local e o nome não poderiam ser mais sugestivos: Yasushi decidiu fazer no bairro de Akihabara o centro de seu Teatro de idols, o AKB48 Theater, um local que para o tamanho da fama do grupo é até que muito pequeno, mas que tem todo um significado para toda a indústria idol até hoje.

Se nos anos 2000 os grupos idols já estavam de volta com toda a força para o entretenimento japonês, com o AKB48 esse domínio tomou proporções inimagináveis com a ajuda da internet, televisão, rádio e tudo aquilo que os idols sempre fizeram, mas agora voltados totalmente para atrair cada vez mais publico e vender cada vez mais produtos. A indústria dos idols havia finalmente tornado uma indústria bilionária no Japão com grupos femininos e masculinos surgindo a todo momento, como um verdadeiro renascimento dos anos 80, agora com muito mais força e meios de se espalhar pelo mundo todo.

O  AKB48, porém, não é o único grupo feminino que faz sucesso hoje em dia explorando o que os idols tem de melhor a oferecer a seus fãs. O Momoiro Clover Z, grupo que fiz um post há 2 anos prevendo o futuro aqui no Mithril, é um ótimo exemplo de como a indústria idol está diversificada hoje em dia. O Momoclo pega elementos de diversos grupos e estilos musicais, além de vários ramos da cultura japonesa e faz uma grande mistura.

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Momoiro Clover Z

É seguro afirmar, em suas devidas proporções, que o Momoiro Clover Z tem tanta influencia na indústria japonesa de idols e músicas de idols quanto o AKB48 e outros grupos provenientes do Hello! Project. No meu post sobre elas falei que o grupo queria dominar o Japão e elas estão conseguindo isso com maestria fazendo shows cada vez maiores em estádios e locais que dificilmente outros grupos idols fazem apresentações.

Hoje em dia existe uma infinidade de grupos idols de sucesso que se fossem citados aqui não caberiam devido a quantidade e a velocidade que eles surgem a cada ano, principalmente pelo fato de existirem festivais como o “TOKYO IDOL FESTIVAL” voltado exclusivamente para a descoberta e promoção de jovens idols. O Japão está cada vez mais imerso novamente neste tipo de cultura de massa, mas será que o mundo dos idols é só alegria, felicidade, fama e estrelato?

Novos Idols para novos tempos

Desde sempre a fama atrai olhares e curiosos para saberem cada vez mais sobre como tudo funciona. É assim no mundo todo e no Japão não é diferente. Tabloides, revistas especializadas e programas voltados para grandes estrelas fazem sucesso em qualquer lugar que tenha um grande número de pessoas famosas e no Japão, com o passar das décadas e com o maior acesso a informação, essas mídias voltadas para a descoberta e acompanhamento de idols no Japão se tornaram cada vez mais presentes, fazendo o triângulo entre elas, as agências de idols e seus fãs.

Como já mencionei tanto nesta parte quanto na primeira parte do post sobre idols, essas personalidades sempre foram muito visadas e para manter sempre o seu padrão pré estabelecido lá no começo da indústria de “pessoas perfeitas”, as agências cada vez mais tinham que fazer contratos e outras coisas que tornassem tais celebridades pessoas praticamente inalcançáveis, afinal a definição de idol, em seu intimo, é alguém puro, perfeito, que não comete erros e que vive a sua vida para o entretenimento e para o bem de seus fãs de admiradores. São verdadeiros deuses do entretenimento que uma pessoa comum jamais poderia alcançar.

Kashiyagi Yuki, do AKB48, e Tegoshi Yuya, do NEWS

Kashiyagi Yuki, do AKB48, e Tegoshi Yuya, do NEWS

O problema desse pensamento é que, querendo ou não, os fãs aos poucos começam a ser condicionados a pensar que isso é verdade. Sabem aquela frase de que “uma mentira contada 1000 vezes acaba se tornando uma verdade”? Então, esse pensamento e essa aura endeusada que os idols foram se submetendo durante todas essas décadas se tornaram cada vez mais enraizadas na cultura japonesa e o mais incrível é que isso não se restringiu apenas a pessoas reais, mas também a personagens de animes e mangás, mídias que, como já falei, estão de uma forma ou outra relacionadas com o mercado de idols japonês.

Uma palavra frequentemente usada para tratar sobre assuntos relacionados a vida pessoal dos idols por tabloides e sites de notícia é “escândalo”, o que remete a algum absurdo que tais celebridades cometem, mas que é totalmente errado se você for pensar que na maioria das vezes o conteúdo de tais “escândalos” nada mais é do que idols se relacionando com outros idols ou pessoas fora do mundo do showbiz de forma natural como qualquer outra pessoa. O condicionamento de seus fãs e do público em achar que idols cada vez mais se tornaram pessoas intocadas e que vivem unicamente para seus fãs fizeram com que cada vez mais esse tipo de notícia, que teoricamente deveria ser natural, acabassem se tornando grandes polêmicas envolvendo tais pessoas.

As agências na maioria das vezes falam que seus artistas são totalmente livres para fazerem o que quiserem, saírem com quem quiserem e se relacionar, mas é visível que por conta de tanto tempo tendo esse pensamento que eles são deuses o negócio não é bem assim. Uma discussão bastante recorrente sobre isso são os chamados “contratos contra relacionamentos” que os idols são submetidos e que claro, as agências nunca mencionam a existência, sendo considerados grandes lendas dentro deste mercado.

Minegishi Minami do AKB48, protagonista de uma das histórias mais polêmicas envolvendo idols até hoje.

Minegishi Minami do AKB48, protagonista de uma das histórias mais polêmicas envolvendo idols até hoje.

Casos de “quebra de contrato” cada vez mais estão presentes no mundo dos idols japoneses, principalmente pela facilidade com que as informações circulam hoje em dia, sendo que alguns desses casos se tornam famosos mundialmente mostrando uma visão um tanto quanto ruim não só para as empresas que agenciam tais idols como para o mercado como um todo. Artistas já tiveram que sair de grupos por causa de relacionamentos, outros já tiveram até que abandonar suas carreiras, sem falar de casos extremos como o que uma idol raspou sua cabeça por estar arrependida de ter feito algo que, para padrões totalmente deturpados, estava errado. A discussão aqui não é questionar a validade de tais contratos, os termos que idols se submetem a assinar pela fama ou outras coisas relacionadas a isso, mas sim falar sobre como tudo isso infelizmente se tornou um efeito colateral dessa cultura ao longo de todos esses anos.

Leia também: O caso Minami Minegishi: Quando um contrato vale mais do que a dignidade humana (No Gyabbo!)

É engraçado perceber que algumas coisas nisso tudo acabaram se tornando pontos fora da curva quando o assunto é relacionamento de idols. Momoe Yamaguchi, que falei sobre lá no começo da primeira parte, decidiu terminar a sua carreira depois de se casar para cuidar de sua família. Seiko Matsuda, mesmo se casando e com uma filha, continou tendo sucesso e ganhou até uma alcunha devido ao fato de ser uma idol mãe. Alguns atores e atrizes são casados e vivem tranquilamente as suas vidas, tem filhos e se relacionam, ao mesmo tempo que alguns cantores tem mulher e filhos, mas jamais são mencionados pela mídia. A experiência de vida dos idols acompanham o amadurecimento de seus fãs?

Takahashi Minami, integrante do AKB48 em um programa de variedades onde ela fez uma pegadinha de escândalo pra enganar o resto do grupo.

Takamina, integrante do AKB48 em um programa de variedades onde ela fez uma pegadinha de escândalo pra enganar o resto do grupo.

Por ser uma industria de “jovens” de até 30 anos, sendo que segundo estimativas, a idade máxima de uma idol feminina para ter sucesso é os 25 anos, o público também é mais jovem e consequentemente mais individualista perante a seus relacionamentos. Pode ser que nos últimos tempos, principalmente depois de grandes repercussões, as agências tenham diminuído um pouco a cobrança em cima de seus artistas, mas o fato é que o mercado de idols e o relacionamento de amor e ódio com seus fãs separados por uma linha tênue de acontecimentos continua existindo e pode acabar durando ainda mais algum tempo.

O futuro dos idols no Japão certamente é muito lucrativo e a onda que começou lá nos anos 2000 com certeza não demonstra sinais de enfraquecimento, principalmente porque ao contrário da década de 80, desta vez o mundo inteiro consome esse tipo de indústria vinda do Japão, mesmo lá continuando o centro de toda a cultura dos idols e o país ter uma política protecionista muito forte quanto a sua cultura. Tirando alguns casos específicos, a disseminação dela para fora do Japão é sempre uma consequência da facilidade com que as coisas circulam num mundo globalizado. Resta saber se daqui a alguns anos uma nova onda irá tomar conta do entretenimento japonês ou se os idols continuarão dominando o país com suas roupas coloridas, visuais descolados e tudo de incrível e massificado que gira em torno desse mundo de maravilha e fantasia.

Referências:

The Johnny’s Entertainment Pimp Post
http://orahen.livejournal.com/17776.html

A Brief History on Idol Culture in Japan and The Ascent of The Superfan
http://www.jpopasia.com/news/a-brief-history-on-idol-culture-in-japan-and-the-ascent-of-the-superfan::16841.html

Unraveling a fantasy: A beginner’s guide to Japanese idol pop
http://www.avclub.com/article/unraveling-fantasy-beginners-guide-japanese-idol-p-206896

AKB48 member’s ‘penance’ shows flaws in idol culture
http://www.japantimes.co.jp/culture/2013/02/01/music/akb48-members-penance-shows-flaws-in-idol-culture/

Diversos artigos na Wikipédia e também no Generasia, além de sites com a Oricon e também de notícias.

LEO-RODAPE

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One thought on “Idols Japoneses, Fãs Possessivos e Namoros Proibidos – Parte 2”

  1. Eu só adicionaria as participações míticas das Momoclo com grande ídolos do Rock internacional: Na Yume no Ukiyo ni Saitemina / Samurai Son em colaboração com o Kiss, Mouretsu Uchuu Koukyoukyoku Dai 7 Gakushou “Mugen no Ai com o Marty Friedman (ex- Megadeth) e a segunda versão da música, a Emperor Style da Mugen no ai com o Yngwie Malmsteen.

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