Review Retrô: Samurai Champloo

No “Review Retrô”, vamos revisitar obras consagradas, observando essas animações com os olhos de hoje. Aproveitar para ver uma ou outra curiosidade e, quem sabe, apresentar para você, que não conhece, uma nova velha obra para se deleitar! O primeiro anime será Samurai Champloo, então pegue o seu kimono e coloque pra tocar o seu low-fi favorito e bora lá!

Fuu Seizo, uma das protagonistas do anime, segurando um prendedor de cabelo na boca.

Primeiramente, Samurai Champloo é uma animação original dirigida pelo lendário Shinichiro Watanabe, o mesmo de Cowboy Bebop (que em algum momento também estará aqui no Review Retrô), produzido pela Mongoble Inc. e exibido pela Fuji Tv em 2004. No mesmo ano, o anime ganhou uma adaptação pra mangá através da revista Shōnen Ace.

Os três protagonistas de Samurai Champloo. Da esquerda para direita: Mugen, Fuu e Jin.

Porque você precisa assistir Samurai Champloo

Ele conta a história de uma adolescente que trabalha como garçonete num Japão fictício, no meio do período Edo. Fuu busca encontrar um samurai que cheira a girassóis, contando assim com a ajuda de dois espadachins: Mugen, um troglodita vagabundo, e Jin, um ronin rigoroso. Misturando a estética do Japão Feudal, recheada de samurais e lutas de espada, com a musicalidade e personalidade do Hip Hop atual, Samurai Champloo é visto como uma das obras primas na carreira de Watanabe.

Samurai Champloo é um dos animes que estão presentes na lista universal de “indicações para converter o seu amigo ao mundo otaku” (ou ICAMO, tenho esperança que essa sigla pegue). Isso por conta de como a obra não viaja muito nos conceitos mais estabelecidos e enraizados do nicho das animações japonesas. É uma obra “pé no chão”, o que facilita cair no gosto do público ocidental.

Outra imagem que demonstra os três protagonistas enfileirados.

A narrativa

A narrativa tem várias brincadeiras e mesclagens com o gênero do Hip Hop, e conta com algumas técnicas de direção conhecidas no cinema. Como o fast-forward, que consiste em avançar uma gravação, seja de vídeo ou áudio, em uma velocidade acima do normal (como quando você acelera um vídeo no YouTube ou um filme no seu VHS… DVD player?). Ou mesmo o uso do Scratch, aquele som característico no Hip Hop, no qual o DJ “arranha” o disco.

Também são usadas outras inúmeras convenções, como a narração de um dos personagens sobre os últimos causos do grupo na forma de uma rima freestyle de rap. Ou a confusão proposital entre as épocas, mostrando o século 21 por um breve período, mas rapidamente retomando para o período Edo, para assim continuarmos acompanhando a busca dos protagonistas. Isso tudo entre outras formas criativas  de nos conduzir pela narrativa.

Sem dúvida, esse é o trabalho mais inventiva de Watanabe, no qual ele não só se propõe a mesclar um estilo musical a sua obra, método bastante usado por ele e conhecido do público que o acompanha, mas também a “colidir em harmonia” as duas culturas em uma coisa nova. Para o tempo que estamos agora, é como se Akira Kurosawa (de Sete Samurais) e Kendrick Lamar tivessem trocado uma ideia ou outra e o resultado final fosse uma amizade longínqua. Não à toa, Champloo tem essa conotação de “mistura” no dialeto de Okinawa no Japão.

Jin, Fuu e Mugen olhando em direção a câmera

Fuu, Mugen e Jin

Os protagonistas funcionam muito bem juntos, mas também tem seus momentos solitários ao sol, o que não deixa nada a desejar. As personalidades conflitantes dos três é o que, particularmente, conduz a sua atenção à história. Os momentos nos quais as propostas de choque cultural entre o Japão Feudal e o Hip Hop atual também são presentes na narrativa, com personagens característicos ou dramas no enredo. O anime funciona de maneira episódica ou procedural, na qual cada episódio, em sua maioria, se fecha em torno de si, embora a busca dos protagonistas pelo Samurai que cheira a girassóis seja o plot principal.

É um anime curto de 26 episódios bastante cativantes, funcionando muito bem até os dias de hoje. A animação não fica pra trás e a colorização, embora pouco saturada, entrega um aspecto retrô (olha só!). Mas o coração desse anime está na sua trilha sonora.

Mugen e Jin, protagonistas de Samurai Champloo, ambos cobertos por sombras.

A trilha sonora

Nujabes, Force of Nature, Fat Jon, Shing02 e Tsutchie são os responsáveis pela melhor composição de trilha sonora do mundo da animação. As influências que esses caras conseguiram passar por conta do seu trabalho em Samurai Champloo e o impulso na carreira de todos por ter participado dessa produção é enorme!

Nujabes, ou Seba Jun (nome real do compositor e produtor musical), é provavelmente o mais benquisto nessa projeção. Afinal, além das colaborações com inúmeros rappers do outro lado do continente, ele foi o percursor do Chill Pop, ou melhor do Low-Fi Hip Hop, aquelas músicas que misturam jazz com beats de Rap, além de samples de inúmeras influências. O conceito se baseia na distorção proposital da composição para que ela ganhe o aspecto de home-studio (parecendo que ela tenha sido gravada em casa, como todos os ruídos e interferências, dando a sensação de nostalgia para os ouvintes) 

Ou, simplesmente, é aquela música com a garotinha estudando quase caindo no sono que você coloca de fundo quando quer dormir ou se concentrar.

Dito tudo isso, o Review Retrô termina com: Samurai Champloo continua sendo uma das obras primas e mais inventivas do cenário de animação japonesa, o que com certeza o torna uma experiência imperdível.

Revisão: Felipe Haguehara

Kaed, é formado em design(seja lá o que isso queira dizer) e ilustrador de fundo de quintal, gosta de dissecar e falar groselha sobre quadrinhos e animação com piadinhas no meio para descontrair e não parecer um esnobe de monóculo, além de ser uma tiete em tempo integral dos seus artistas favoritos de mangá. Para conferir um rabisco ou outro desse desocupado, confira o @dudesken no Instagram.