O primeiro filme dessa série, “Homem de Aço” (que, naquele momento, claramente não estava sendo pensado como a primeira parte de um processo), é, no fim das contas, um filme sobre escolha. Toda a desnecessariamente complicada e longa introdução do filme (são vinte minutos!) em Krypton tem a função de, no fim das contas, criar um novo (novo?) elemento de sua mitologia: Kal-El, ao contrário do resto de Krypton, é “natural”. Não foi projetado geneticamente para uma função específica. Ele tem infinitas possibilidades. Mas, em sua incoerência, o filme passa toda a sua extensão dando ao personagem apenas uma escolha: Kal-El deve ser Superman. Um herói. Um ideal. Um símbolo. E a cereja no bolo: Superman termina o filme não escolhendo nada. Tudo que faz é reagir. Em seu filme de estreia, o personagem título inexiste. É só uma “imagem”, batendo em coisas que se põem em sua frente.
E com esse não-personagem, chegamos a um segundo filme, “Batman vs. Superman”, no qual deveríamos ver um confronto, digamos, ideológico, entre Superman e Batman. O primeiro não tem ideais nem ideias próprias. O segundo acabou de chegar, e, ao longo do filme, é basicamente um hipócrita: Acha que o Superman é uma ameaça por matar (ou causar a morte de) pessoas, mesmo que as salve com frequência; e assim, passa o filme todo matando pessoas e buscando maneiras de matá-lo. Se não há espaço para gostar do personagem novo (além das nossas próprias lembranças como leitores das histórias originais), o filme não se esforça para que gostemos do Superman em nenhum momento, também. Quando não está em tomadas angelicais em contraste com a luz do sol ao fundo, está em silêncio, fingindo estar triste (Henry Cavill é uma porta)… isso quando não está ameaçando o Batman de morte (é, isso acontece), o que o coloca exatamente no mesmo ponto em que o conhecemos no primeiro filme: um imbecil que só reage à agressão com mais agressão, como quando destrói um caminhão inteiro porque um bêbado o contrariou no bar. Ou seja, temos um confronto entre um não-personagem contra um personagem impossível de se relacionar.
Com isso, Zack Snyder consegue juntar “O Cavaleiro das Trevas” e “A Morte de Superman” e, em vez de contar qualquer uma dessas sagas clássicas, acaba adaptando (mais uma vez, diga-se) “WATCHMEN”. Lembre-se: A primeira (PRIMEIRA) fala do filme é uma narração em off do Bruce Wayne do Affleck dizendo que o mundo era perfeito até que “coisas caíram do céu”, numa alusão ao Superman, e tudo ficou pior, para sempre. Sim. Este é o filme do Superman que afirma que o mundo é PIOR por causa do homem que tem “esperança” escrito no peito (bom… talvez seja só um “S” mesmo). E a partir disso, conta a história de um deus distante, onipotente e sem emoção (já falei que o Henry Cavill é uma porta?) e um herói sem poderes, velho, cínico, cansado e assassino. Até o péssimo Lex Luthor de Jesse Eisenberg acaba, involuntariamente, funcionando como um Ozymandias, criando uma ameaça externa hiperpoderosa em comum, que une os heróis.
E chegamos ao único personagem que move a trama e, paradoxalmente, o pior e mais incompreensível de todos: Lex Luthor. Motivado por seja lá o que a cena do momento queira (uma hora é uma aversão ao conceito de deus, na outra é a lembrança de apanhar do pai… ou algo do tipo), Luthor usa a sua megacorporação que cria… coisas… científicas… (?) para pôr em ação um complicadíssimo plano, cheio de passos (um incidente no Oriente Médio, uma explosão no tribunal, etc, etc) para jogar o Batman, que já era contra o Superman… contra o Superman. Mas nada disso importa, porque ele já estava, por algum motivo misterioso, criando o Apocalipse em segredo, uma solução muito mais fácil para tudo o que ele queria… seja lá o que ele queira. Porque, no fim, o que ele ganharia com o Apocalipse? Só ver “o mundo pegar fogo”? Bom, com esse plano inconsequente, quase fica compreensível a composição de personagem quase como um Coringa, maluco e cheio de tiques.
O fim do segundo ato, e todo o terceiro ato, são uma piada. A luta entre Batman e Superman termina do jeito mais conveniente e risível que eles puderam criar (nem vou estragar essa surpresa pra vocês), Batman muda de opinião quanto ao Superman por motivo nenhum, e uma longa batalha de computação gráfica em tons de cinza e laranja se segue por uns, sei lá, 40 minutos, conseguindo ser melhor que o final de “Homem de Aço” por muito, muito pouco. Talvez seja o fato de ter mais elementos na ação, com o Batman e a Mulher Maravilha (mais uma “imagem”, bonita e, por enquanto, vazia e sem significado, que passa pela história apenas incidentalmente, e podia muito bem não existir neste filme). No fim, ficamos com a perspectiva da formação de uma equipe de super-heróis em um mundo que provou que 1) não vale a pena ser salvo, e 2) é muito pior justamente porque super-heróis existem. Eu realmente não entendo por que pegar os dois maiores e mais icônicos heróis de todos os tempos (até eu que sou Marvete sei que não tem ninguém maior que esses dois) pra contar uma história que, basicamente, critica o conceito de super-heróis e, principalmente, odeia o Superman. Qual vai ser a história da Liga da Justiça? Eles se reúnem, brigam e explodem o planeta?
“Batman vs. Superman” é um filme preguiçoso (eu podia escrever um texto inteiro só sobre a cena de Clark na montanha conversando com o fantasma do pai), feio, bagunçado e vazio. Com essa base, não me surpreende que o próximo filme desse universo seja, justamente, um em que vilões, psicopatas e assassinos se juntam pra salvar o mundo. Afinal, acabamos de assistir essa mesma história e, por algum motivo, deram a ela o nome de “Origem da Justiça”.
[Por que não em vídeo? Bom, ainda estamos ajeitando nossa agenda de gravações, e meu quarto novo – sim, eu me mudei – é péssimo pra gravar… ainda não achei uma solução. Além disso, quis exercitar a escrita, então, fiquem com minha “crítica” por escrito por enquanto.]