Quadrinhos nacionais

brasilYo!

Com as postagens referentes ao Projeto Motikomi e principalmente à brincadeira que eu e o Lancaster fizemos no Primeiro de Abril, ficou ainda mais evidente pra mim o quanto os brasileiros querem se bandear o mais rápido possivel para o Japão. E eu entendo isso, claro, logo eu, que ESTAVA no Japão…

 

À dez anos, eu me formei no colegial e, ainda confuso com o futuro, não sabia o que fazer: seguir meu sonho, de criar histórias, ou continuar no seguro, fazer faculdade de direito e seguir carreira.

Em dez anos, eu provavelmente já estaria estabelecido na profissão. Quem sabe eu não tivesse um escritório próprio até? Mas naquele dia, eu me imaginei com 50 anos. E não gostei de me imaginar um senhor arrependido.

Desisti de faculdade e fui para o Japão, primeiro, pra juntar dinheiro e montar um estúdio no Brasil, mas depois, pra tentar a sorte nos concursos japoneses.

A época era acolhedora às pequenas produçôes nacionais. Minha intenção era aproveitar isso e lançar uma revista com meus amigos. História que muitos artistas brasileiros devem compartilhar. Num cenário desacolhedor como o dos quadrinhos nacionais, quem curte quadrinhos costuma viver de apoio dos colegas, em pequenos grupos de sonhadores.

Com o tempo, me adaptei mais ao Japão. Já sabia falar bem a língua, lia e escrevia um pouco e minha prateleira de mangás era completamente em japonês. Por que nâo? pensei comigo mesmo. Estava na hora de arriscar o mercado local.

TrueLove01 Na época, eu só tinha a experiência de meus fanzines e histórias amadoras. Adaptei uma de minhas histórias longas para o formato de 45 página da Shonen Jump. Era uma comédia romântica.

O resultado foi obvio, mas na época, eu não conseguia entender. Eu me sentia apto, pronto pra ser profissional. Esperava pelo menos meu nome mencionado. Mas nem isso.

Fiquei decepcionado, o que ainda provava que eu estava com o psicológico fraco também. Passei meses sem desenhar, vivendo a vida. Até decidir rever meu material. E me lembrei de cada detalhe. Foi quando percebi o quanto eu ainda era prepotente.

A história era fraca, os personagens… Além disso, eu ainda tinha dificuldades técnicas banais. Não sabia usar as marcas dos papéis específicos, errando linhas de corte e posições de balões. Minha arte era instável, não tinha um estilo certo durante toda a hitória e a arte-final tinha erros imperdoáveis.

Eu ainda não tinha nada pra apresentar à ninguém. Era óbvio que os outros trabalhos estavam à minha frente. Então, decidi estudar mais. Mais desenho, mais arte-final. Direção de cena. Roteiro. Narrativa. E então, em 2005, tentei mais uma vez. Fiz Cyberserk, uma história de ação, que misturava skate com conspiração e robôs.

Cyberserktn38 Novamente, não foi um material ao contento. Tive pouco tempo, corri pra fazer as páginas e ainda não estava bom de roteiro. Ainda assim, enviei, não tinha nada a perder mesmo. Mas desta vez, sabendo por mim mesmo que não estava bom ainda.

Decidi estudar mais e nos últimos anos, devorei todos os livros que pude. Estudei não só quadrinhos, mas o japonês também. Aprendi a me virar, deixei a vida fluir e abandonei valores que me prendiam, pra poder ganhar algo que todo roteiro precisa: experiência de vida.

Li sobre filosofia, ficção, engenharia, psicologia, design. Li também sobre coisas que não acreedito, astrologia, religiâo. Li livros para crianças, para adolescentes, para mulheres, velhos. Para quem gosta de carros, quem gosta de futebol, quem gosta de pôquer, aprendi fotografia, fui acampar, fui viajar…

E li Platão. Syd Field. Sun Tzu. Paulo Coelho.

E ao mesmo tempo, voltei aos quadrinhos. Li o livro do Yoshiyuki Tomino, sobre direção e roteiro. Devorei tudo que podia que não fosse sobre desenho. Li um camalhaço de entrevistas de Hitchcock. E foi quando eu percebi que havia levado oito anos pra me sentir melhor com as histórias que eu criava.

workspaceNessa época, eu pensei seriamente em voltar ao Brasil. Eu poderia tentar o Japão, mas algo me dizia que o Brasil precisava mais de mim do que o Japão, onde eu seria mais um em um nível regular. Não voltei por problemas pessoais.

Mais um ano e meio se passaram e eu finalmente decidi que precisava voltar ao Brasil. Mas antes, precisava enfrentar de novo o meu desafio. A Jump. Mas dessa vez, eu queria ir bater a porta.

Foi aí que nasceu o Projeto Motikomi. Motikomi é como são chamadas as visitas aos editores, onde o autor leva material pra ser avaliado na hora. E era o que eu ia fazer. Vocês podem acompanhar o que aconteceu nas postagens desse blog referentes.

Mas o tempo chegou e eu não consegui terminar a história. De passagem marcada, eu terminei o lápis e pensei “vou assim mesmo”. E liguei para a Shueisha, pra marcar hora. Insisti por uma hora, mais ou menos, e quando consegui marcar… O único horário que me conseguiram foi uma semana depois do meu dia de embarque.

Voltei ao Brasil, para tentar no país. Atualmente, estou trabalhando em Rapsódia, fantasia aventuresca, junto de Carlos Sneak, criador da história e desenhista, além de projetos próprios.

Journey Begins_Cover teste1Hoje, no Brasil, não temos exatamente um mercado simpático ao autor. As editoras, com a comodidade de ter um material de renome a um custo baixo, pouco investem em produções próprias.

Isso tem seus motivos. Hoje em dia, não vale tanto a pena publicar revistas. As tiragens encalham fácil. O custo de um artista é alto. O retorno do público é pequeno e em geral, pedem mais material estrangeiro.

Também tem outros fatores. O material nacional apresentado é claramente inferior, em todos os sentidos. Algumas vezes, ainda temos uma arte notável. Mas tão oca quanto os cofres dos artistas.

Falta nível para o material brasileiro. No entanto, os parâmetros da tabela da Associação dos Cartunistas ainda estipula um valor, claro, justo para o artista, mas irreal para a produção de uma revista nos moldes atuais.

Por outro lado, as editoras trazem valores que são tão irreais quanto os da Associação. Coisa entre 2000 reais por um conjunto de 200 páginas, sendo que o trabalho pra isso, levaria meses. Não é um valor que dê para ter uma vida digna.

Sobra aos autores os editais e incentivos culturais, para que eles próprios editem, distribuam e produzam seu material. O problema é que isso não se torna um incentivo cultural, e sim, uma massagem no ego alternativo na prática. Dessa forma, os autores publicam sim, mas dentro de uma estrutura muitas vezes mais amadora que o material produzido. Assim, poucas pessoas conhecem e compram suas revistas. E sem continuidade, isso se torna apenas mais um livro no meio de varios livros. Livros mal lidos.

Para aquecer o mercado, precisamos de material popular, que aumente o alcance dos quadrinhos no povo, na cultura do país. E de periodicidade, para criar o hábito de acompanhar, assim como uma novela ou um seriado de TV.

Isso envolve um trabalho intenso na criação de profissionais qualificados na criação de histórias, na parte editorial e administrativa especificamente de quadrinhos e materiais autorais.

Temos autores sem a menor formação artística, que não têm fundamentos, base para trabalhar com isso. E temos editores que desconhecem tudo isso, e ficam esperando o material chegar inteiro, para serem meros atravessadores, laranjas de luxo do mercado editorial.

Os problemas são muitos e as soluções ainda estão nubladas, distantes de nossa vista. Alguns são óbvios, e poderiam ser feitos. Coisas como rever a planilha de custos, buscar meios de acelerar a produção de páginas, e meios de cortar os custos maiores, que são os do revendedor (30% do preço de capa) e do distribuidor (40% em média). Por isso que vendas diretas, como em eventos, rendem mais. Para a editora, claro, o autor sempre recebe igual, entre 8 a 12% do preço de capa.

Queria convidar os leitores do blog à discutir esse assunto. Não com mensagens derrotistas, mas vendo, sim, um meio de termos boas histórias, que possam render boas franquias culturais no Brasil, e manter um mercado de criações brasileiras, que criariam profissionais experientes e gabaritados à, agora sim, investir no exterior. Não só o Japão, nem os EUA, mas Europa, America Latina, Oceania, Asia geral, Africa. Talvez nem indo diretamente ao mercado deles, e sim, vendendo nossa cultura, da mesma forma que eles nos vendem a deles.

Deixo em aberto para vocês. E volto depois, para escrever mais sobre o assunto!

11 ideias sobre “Quadrinhos nacionais”

  1. Já pensou que o maior problema dos quadrinhos nacionais pode estar na divulgação? E não me refiro a posteres fixados do lado da banca mas a algo concreto veiculado em mídia televisiva. Eu tenho ministrado um curso (está mais para workshop de longa duração) de mangá e tenho percebido esse movimento. Os meus alunos chegam ao mangá por meio do acesso ao anime em 90% dos casos. Os outros 10% são pessoas que se tornaram efetivamente leitores deste gênero. Então porque não adotamos a estratégia da Bandai, de vender bonequinhos para vender quadrinhos? É verdade que uma animação não se faz da noite pro dia, mas é um caminho a se pensar. A Rovio ganha horrores não com o Angry Birds mas com os produtos derivados.

  2. Seria bom montar nao só uma mais em varios lugares pequenos, grande grupos indepedentes que criasse pelo menos uma história boa, com nossa cultura, jeitos e mentalidade, Como novelas, Bope, Cilada ponto com. E esses grupos de desenhistas, autores, editores nao pensasse no lucro e sim injetar, atrair, Funk, Pagodeiros, Gauchos etc a ler, a consumir como mais um entretenimento.

    Assim na minha umilde opnião 10% de lucro mais certo. Para as editoras colocarem seus olhos gordos e apoiarem, mas isso demoraria tempo, dinheiro,

    quem quer ser pioneiro sem ganhar um centavo???

    Mas só acreditando e mudando a cultura nossa de que “ler é obrigação” e não algo tão normal como ver tv, Face, Twiter, onde vc aprende, rir também numa história fictícia de gunda e Aliens: o que é solidão, males familiares… Como algo adulto: Avenida Brasil, A grande familia, Piratas do caribe…

    E tirando o espirito de que só presta si for o mais barato, e fuck os criadores que na maioria precisão abandonar as artes pra alimentar seu filhos. Ou com sorte ir pra fora do pais sendo xingado de ganancioso, aquele que defeca por pais sendo rico no exterior..

    O mestre God disse: – A vida é importante e só o esforço a recompensa.

  3. >Qual é o nome do livro do Tomino que você citou?E quanto a discussão, acho que seria interessante um post futuro sobre os quadrinhos que você mesmo publicou. Até pra quem tiver interesse tentar ir atrás pra dar uma olhada.Valeu, e parabéns pelo blog.

  4. >Eu acho que de inicio,deveria se começar com o básico.A Difusão de cursos de desenho desse estilo no país.Não em todo beco de esquina,mas pelo menos que tivesse em cada capital um curso qualificado.Ai nós teriamos bons profissionais(claro que ja temos,porem o numero aumentaria)-2:A Criação de revistas ou implementação dessas histórias em revistas para o publico jovem,como a NEOTOKYO,seria uma boa.-3:Apoiar a criação de fanzines e doujis,como está sendo feito na revista que vai ser lançada pela net,Pulo Mensal.Faz que quem queira fazer queira estudar mais o estilo pra publicar suas histórias.E os eventos de mangás e animes estão ai justamente,também,para espalhar o mangá/anime.Fortalecendo esses eventos concerteza aumentará o numero de consumidores o que poderá acarretar no surgimento de um mercado Nacional ou apenaas do Sudeste(o que já seria algo muito bom.

  5. >Seu problema não é apenas técnico.É de concepção, criação e mercadológico.Isso que você oferece NINGUÉM QUER LER. O mercado nacional não precisa disso, não quer isso e se você lançar por conta própria, vai fracassar.Brasileiro gosta d eler, sim. É só ir na FNAC e ver a imensa quantidade de livros.Ou ir nas bancas e ver quantos gibis estão pra vender.O que não rola é o autor nacional, tipo você, oferecer um produto que seja agradável ao leitor e, por conseguinte, ao editor.Você não tem nada, a não ser um desenho.E isso qualquer um faz.Tenha idéias.Elas são preciosas.

  6. >HQ, ZezinhokunEu também vejo a idéia de usar os quadrinhos como conteúdo de revistas, algo interessante, mas pra isso, teriamos que ter um material que fosse interessante de alguma forma à essas revistas ou jornais. De cara, seria dificil pra qualquer uma delas aceitar isso.Provando a viabilidade de material, com alguns autores conceituados, e um pouco de indicação, poderiamos facilmente introduzir algo desse tipo.Falta um tempo ainda…

  7. >Opa! Obrigado, Bruno Alex!Eu uso o Windows Live Writer, às vezes rola uns erros por conta da automação+falta de atenção.Valeu!

  8. >Fábio Pra começo de conversa na minha opinião como você disse precisamos alcançar um resultado mínimo na arte Agora por quê não trazermos pessoas que a dominem que tem expêriencia? Poderiamos montar uma franquia nacional em que nós recebecemos só o nemu por exemplo e depois analisariamos e diriamos se é bom ou nãose for bom treinariamos a pessoa até um nível aceitável (mas a pessoa teria de pagar é lógico né?)e só depois lançariamos,no começo seria apostar mas conforme os volumes e o sucesso poderiamos aumentar a taxa pois nenhuma editora gostaria de perder um grande nome é só apostando.Outra coisa que penso é se nós literalmente nos juntarmos e batermos na porta da editora se o título for bom aceita se não deixá prá la.Pensei uma vez em capítulos para jornais seriam entre 2 a 3 semanas mas os capítulos seriam responsabilidade da editora enviá-los conforme o sucesso isso concerteza se expandiria e haveria inúmeros jornais que gostariam de ter uma parte com mangás e conforme os capítulos formariam-se os volumes então já seria lançado pela editora e não pelo jornal assim concerteza nó ganhariamos bem amsi por cada jornal com um certa taxação e nem a editora e nem o jornal perderiam pois os adolescentes o leriam atraindo mais pessoas para o jornal.Poderia ser ao contrário também se nós lançassemos em grandes jornais os capítulos e depois a editora se interesasse pelos títulos aí nós poderiamos lançar já com certo preço se a editora não quiser o jornal lança para a própria regiãoos volumes mas se fizer sucesso poderiamos melhorar a idéia. kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkksão tudo meio mirabolantes mas é só idéiasVlew Fábio

  9. >O brasileiro médio não tem o hábito da leitura: fato. Neste país nós vemos vários aborrecentes chegando para fazer faculdade (uma minoria, ainda assim) e eles mal tem base para escrever e compreender uma frase de um livro de Machado de Assis.O público consumidor de quadrinhos e mangá neste país são os nerds, uma minoria endividada e sem grande pode aquisitivo para comprar tudo o que queria. Hoje em dia nem Turma da Monica, que é de massa, vende anto assim – dando apenas uma guiinada razoável neste Turma da Monica Jovem, mas mesmo assim…É inútil correr do nosso já ferado nerd – temos que criar quadrinhos para quem NÃO lê quadrinhos e possa vir a gostar um dia. Poderíamos tentar publicar algumas histórias em quadrinhos em revistas e periódicos como Super Interessante ou Época ou Exame – sim! tentar formar um público leitor logo de cara no segmento que pelo menos LE de vez em quando e TEM dinheiro para pagar por uma revista.No entanto seria um trampo de formiguinha até formar um público leitor que gostasse tanto da história que a compraria à parte, além do que é publicado na revista. Bem de formiguinha MESMO!

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