Ikkyu-san, um bom anime religioso

Yo!

Este review faz parte do especial para a semana da criança no Genkidama.

Pessoas torcem o nariz para produções de cunho religioso. Poucas vezes o tema “religião” é ligada à entretenimento de qualidade para quem quer que esteja assistindo. Este é o caso de Ikkyu-san.

O anime, produzido pela Toei Animation para a Asahi TV em 1976, trazia a história adaptada do monge budista Ikkyu Soujun, um dos mais famosos monges japones. O tema histórico, aliado ao fato de ser um anime religioso, torna tudo muito polêmico, ainda mais sabendo que não é fiel e toma diversas liberdades, tanto quanto à figura histórica de Ikkyu quanto à religião budista. Ao ler até aqui, tudo parece muito chato, e até mesmo os produtores achavam isso.

Ikkyu-san nasceu de um projeto de adaptar histórias famosas do Japão. Em 1960, a Toei começou a pensar em diversas histórias para adaptar para animação e mesmo depois de escolher a figura única do monge, a incerteza comercial do projeto engavetou ele por muitos anos. Foi na mão de Kimio Yabuki (diretor de Tiger Mask, outro grande sucesso de público) que o pequeno monge ganhou as telas, com toda a simpatia, questionamentos e, claro, os ensinamentos budistas.

O anime é fruto de uma época. Nascido em meio à revolução cultural japonesa da década de 70, onde nacionalismo e um senso crítico voltado à sociedade se batiam em todo lugar e os mangás fantásticos davam lugar ao gekigá pé no chão, este anime pegava o horário nobre de uma quarta feira, chegando a assombrosos 27% de audiência, chegando a 42% em Kansai, região onde fica Kyoto, terra natal de Ikkyu.

Seu segredo era com certeza o traço simpático, como todo anime infantil deve ter, aliado à temas filosóficos profundos mostrados de forma simples e clara até mesmo para crianças, mas sem agredir a inteligência de adultos. Ikkyu era retratado como um garoto bem jovem, e foi assim até o fim da série, mesmo quando adaptava histórias da vida adulta do monge. Nascido do sangue nobre do clã Fujiwara, famoso na política da Era Heian, Ikkyu era apadrinhado pelo próprio Emperador Gokomatsu, mas por intrigas políticas, foi sugerido à ele abraçar a vida de monge, sendo afastado da mãe aos 6 anos de idade. Ele viveu uma era de grandes guerras e viu de perto a vida comum ser modificada distante dos livros.

Gravura que ilustra os últimos anos de vida de Ikkyu Soujun

Em cada capítulo, o sábio e sagaz Ikkyu, mesmo com seus poucos anos de vida, encontrava soluções para vários problemas do dia-a-dia, sempre com seu positivismo, criatividade e, claro, com o Tonchi, sua meditação especial que sempre o ajudava a encontrar a resposta certa. Porém, apesar de ser um anime que exaltava que sempre existe um meio pacífico de se chegar à um acordo, também mostrava que a guerra não era tão simples assim de resolver, com capítulos em que o próprio Ikkyu perdia sua esperança. Em meio a caprichos do shogun local, serviços de seu templo e brincadeira com os amigos, ele via muitas crianças orfãs e se deparou com o dilema de ter que incriminar crianças delinquentes e, em um episódio em especial, ele conheceu o Dochite Boya. Esse é o apelido de um garoto tão novo que ainda nem sabe falar direito. Ele aparece na vida de Ikkyu do nada e passa a segui-lo, sempre perguntando sobre tudo. Parecia ser só um retrato das crianças dessa idade e sua curiosidade natural, servindo como prova para o monge que tinha resposta para tudo. Até que descobrimos o background do garoto, que perdeu os pais camponeses na guerra e não sabia porque eles não voltavam.

A Toei fez 296 capítulos de Ikkyu-san, o que fazia a série ser a mais longa do estúdio, até que One Piece a bateu em 2007. Com tantos capítulos, o monge viu de tudo e tratou de dar respostas simples para todos os grandes dilemas dessa nossa vidinha e até de esforçou para encontrar respostas para problemas maiores. No entanto, ele continuava humano e nem sempre resolveu seus problemas, fazendo o público se questionar e pensar um pouco mais também. Ao contrário do que costuma acontecer em animações religiosas, Ikkyu-san não joga textos sagrados na sua cara o forçando a acreditar nos mitos, e sim trazendo os ensinamentos e filosofia para um cenário comum e realista, tão realista que nem sempre é perfeito. Você não precisa ser budista e nem vai querer se tornar um depois para apreciar e entender, se emocionar e guardar na memória os episódios. Em alguns países, como Tailândia e China, Ikkyu-san é mais famoso do que Pokémon e passa em constante reprise, como o Chavez aqui.

Na vida real, o monge Ikkyu ficou muito famoso por sua filosofia e desde muito jovem ele foi reconhecido e respeitado pela sociedade. Existe, em Kyoto, um museu com várias peças que ele usou para mostrar as soluções para diversos problemas de forma prática. Teve uma vida longa, quase 90 anos, e levou seus ensinamentos para diversos lugares usando seus livros. Em vida, seu maior dilema pessoal era o amor por sua mãe, a quem não podia ver por causa de seus votos de monastério. Quando ela faleceu, Ikkyu tinha 25 anos e tentou se suicidar pulando de uma ponte. É ironico que uma figura conhecida por seu positivismo tenha passado por isso. Foi salvo por um samurai e sua depressão depois o levaria a fazer vários textos sobre o valor da vida. Esse aspecto, apesar de bem escondido, é muito usado no anime. A música de encerramento é uma triste música de saudade, falando diretamente para sua mãe e contrastando com o alegre tema de abertura. A figura da mãe aparece em alguns episódios do anime mas nunca se encontra com seu filho, apesar da saudade ser mútua. Fora cartas e um ou outro momento em que eles chegam bem perto de se ver, os votos são mantidos e ela o incentiva a ser forte.

A história do monge foi adaptada para teatro, cinema e TV diversas vezes, inclusive em um programa de suspense, com um Ikkyu detetive. Muitas vezes, era uma adaptação deste anime diretamente, tamanho o sucesso, que enraizou sua influência e particularidades na memória dos japoneses. O mais recente programa a usar a figura de Ikkyu foi um especial da Fuji TV, ainda de 2012, que fazia o personagem histórico viajar no tempo para os dias de hoje, e é produzido pela mesma Toei do anime, usando a imagem de Ikkyu do anime como base.

Quer um bom anime para ver com a família toda? Esse vai te dar boas horas de diversão (e pode ser visto no random, apesar de ter uma certa cronologia).

2 ideias sobre “Ikkyu-san, um bom anime religioso”

  1. Aonde eu posso assistir esse anime legendado????? Fiquei muito interessado mas não acho em lugar nenhum

  2. Fiquei interessado em assistir esse anime ,parece bem interessante .Mesmo sendo católico ,vejo idéias bem interessantes no budismo ,e um anime como esse parece ser uma forma de o conhecer melhor ,além é claro ,de divertir e descansar .Pena eu não ter mais tempo de ver algo tão grande .

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