Guest Post: Kamen Rider, a saga do justiceiro de Ishinomori

GPTrajetoriaKamenRider Mais um Guest Post, com uma convidada: Deise Bueno (@rinaharo). Ela fala de Kamen Rider, assunto de uma pesquisa que faz para a USP. O post faz parte da homenagem à Shotaro Ishinomori, o Rei do Mangá.

Kamen Rider, a saga do justiceiro de Ishinomori

por Deise Bueno

Quando me surgiu uma nova oportunidade de fazer pesquisa no campo de cultura japonesa para a Universidade de São Paulo, me veio à cabeça que as pessoas deveriam saber um pouco mais sobre como é rico o mundo do Tokusatsu e cheio de referências à própria história do comportamento japonês. Em meio à pesquisa vi que não poderia deixar de fora uma das principais criações de Ishinomori, Kamen Rider, que eu já acompanho com entusiasmo por alguns anos e nas ultimas semanas procurei conhecer mais profundamente. Muitos dos leitores deste blog já devem conhecer este “motoqueiro mascarado”, principalmente graças às novas produções que saem anualmente pela Toei. Com este artigo espero poder adicionar algumas informações ao conhecimento de vocês sobre este que é um dos principais heróis japoneses da atualidade.

Ultraman vs Kamen Rider 2 O sucesso de Ultraman no fim da década de 60 fez com que a empresa de entretenimento Toei Company também almejasse um super herói que se tornasse marca registrada e fizesse história por muito tempo. Ao contratar o autor de mangás Shotaro Ishinomori para ajudar na criação de um novo conceito de super herói, a Toei assinava o contrato para o sucesso permanente, que faria com que a empresa se tornasse a maior no ramo do tokusatsu atual. Com o objetivo de criar um herói diferente de tudo que já havia sido criado, para concorrer com “O Regresso de Ultraman”, Ishinomori foi peça principal na autoria do herói que a Toei queria introduzir, construindo um personagem que não possuía tamanho gigante nem vinha do espaço como os sucessos da época. Ishinomori construiu um herói humano. Surgia assim em 3 de abril de 1971 o seriado Kamen Rider. Kamen Rider era um jovem que foi transformado em ciborgue pela organização do mal Shocker, ele se transformava através de um cinto tecnológico num ser parecido com um gafanhoto e montava em sua moto para lutar contra a mesma organização. O principal elemento que diferenciava o herói dos outros já lançados era que ele originalmente era um ser humano, e como ser humano possuía todos os sentimentos e ações de uma pessoa comum. Kamen Rider era um herói que não possuía poderes extraordinários como os seres espaciais que o antecederam na tv. Ele dava saltos, socos e chutes ao invés de soltar raios. Os elementos do enredo causaram uma aproximação enorme entre os telespectadores, afinal o que eles estavam vendo era um herói humano, que foi forçado a passar por uma espécie de “mutação” e mesmo assim usou essa tragédia para proteger o bem. Além disso, a aparência do herói lembrar a de um inseto (que era muito mais fácil de ser encontrado que, por exemplo, um ser extraterrestre) também causou aproximação. As crianças simplesmente passaram a amar Kamen Rider logo de início. Por volta do capitulo 13 da série, o ator Hiroshi Fujioka, que interpretava o protagonista Takeshi Hongo, sofreu um acidente de moto durante as gravações e foi afastado do programa. Para substitui-lo, foi contratado o ator Takeshi Sasaki. Para que a imagem da série não fosse prejudicada por esta mudança de elenco, foi necessário alterar o enredo, assim o herói Takeshi Hongo foi para o exterior lutar contra membros da Shocker e entrou em cena Hayato Ichimonji, que seria a partir daí o novo Kamen Rider. Quando Fujioka se recuperou foi possível ver capítulos em que os dois Riders lutavam juntos. Apesar da confusão causada pela troca de elenco o fato de ter dois heróis juntos lutando contra o mal agradou aos telespectadores, que passaram a chamar os riders de Kamen Rider Ichigo e Kamen Rider Nigo, literalmente “numero 1” e “numero 2”. A temática de um ciborgue criado através de pura tecnologia que usava utensílios normais para se deslocar (ao invés de naves espaciais era usada uma moto) e lutar, que possuía os sentimentos e revoltas de um jovem comum e que tentava destruir a própria organização que o “criou” revolucionou o gênero Tokusatsu e fez com que Ishinomori fosse contratado inúmeras vezes para criar heróis para a TV, como por exemplo, o seriado Himitsu Sentai Goranger, primeiro da franquia Super Sentai. kamen rider ichigo & kamen rider nigo Por outro lado, Shotaro Ishinomori não criou Kamen Rider para ser apenas um herói ídolo das crianças. A faceta de um jovem perturbado por ter sofrido uma mutação forçada e que sofria por nunca mais poder viver como uma pessoa normal devia ser mostrada de alguma forma. Então o autor lançou simultaneamente ao seriado de TV um mangá de mesmo nome, contando de forma muito mais sombria e cheia de críticas a vida de Takeshi Hongo e posteriormente também a de Hayato Ichimonji. Apesar de a série de TV já conter críticas à ambição tecnológica que surgia no Japão (representada pela própria Shocker, que através da tecnologia pretendia dominar o mundo, com membros em sua maioria de cientistas e gênios) as principais críticas foram guardadas para o mangá, que poderia tratar delas de forma mais livre. No final do mangá de Kamen Rider há a citação de uma personagem dizendo “o triste é ver que nós humanos temos usado a ciência, a ‘arma da civilização’, para lutar contra o inimigo errado”, com o intuito de que o problema não eram as criaturas que surgiam com base nos experimentos da organização do mal, tampouco era a própria organização do mal, e sim a própria sociedade, assim como seus governantes, que precisavam mudar de postura quanto aos problemas do mundo e passar a usar a tecnologia que surgia para gerar o bem do próximo ao invés do lucro próprio ou de armas de guerra. Essa crítica era frequentemente usada, visto que neste período o Japão, já recuperado da crise financeira do pós-guerra, investia mais do que nunca no mercado tecnológico. A série de TV de Kamen Rider se tornou sucesso absoluto, chegando a ofuscar as outras séries de super herói da época. Como já era de se esperar, Kamen Rider ganhou em pouco tempo uma continuação, surgindo em 1973 Kamen Rider V3. Com alguns elementos semelhantes à primeira série, além da presença dos protagonistas anteriores, V3 agradou em muito o publico, gerando a necessidade de criar novas séries com o nome Kamen Rider. Surgia assim uma franquia, que posteriormente traria as séries Kamen Rider X, Amazon, Stronger, Sky Rider e Super-1. 2b80446b896e80_full A franquia Kamen Rider criada por Ishinomori passou a não ter ligação com as duas primeiras séries, mas possuía elementos sempre parecidos, que ligavam todas elas: Os heróis eram humanos que passaram por mutação e enfrentavam uma organização maléfica. Quando se transformavam, aparentavam algum animal, geralmente um inseto (com exceção de Amazon, que mais parecia uma piranha). Logo a palavra “Henshin” (transformar) se tornou característica também de Kamen Rider, já que os heróis a usavam com frequência. Isso se tornou tão aparente que em qualquer lugar do mundo a palavra remete à franquia. Em 4 de outubro de 1987 surgia a série Kamen Rider Black. Com um roteiro moderno para atrair a audiência, a série possuía um enredo muito mais sério e sombrio que as anteriores. A história prendeu os telespectadores na frente da TV, ganhando uma infinidade de fãs inclusive fora do Japão. O fato de o publico fã de Kamen Rider ter amadurecido foi importante para que pudesse ser criada uma série um pouco mais jovem e com temáticas polêmicas. A série também ganhou uma continuação, Kamen Rider Black RX, que foi a ultima série da franquia produzida para a TV com o acompanhamento de Ishinomori. blackrxqp7101 Após o sucesso de Black e RX, que renovou a marca (que andava um pouco desgastada), ainda foram lançados especiais durante a década de 90, Shin Kamen Rider, Kamen Rider ZO e Kamen Rider J. Com o falecimento de Ishinomori em 1998, a franquia passou por reformulação, surgindo então no início do ano 2000 a primeira série Heisei, Kamen Rider Kuuga. A chamada Era Heisei é datada no Japão a partir de 1989, mas são chamados Riders Heisei apenas Riders criados a partir de 2000. Por que a mudança de nomenclatura? Porque após a morte de Ishinomori, uma nova era totalmente diferente surgia para Kamen Rider e para as crianças que o acompanhavam a partir de então. imgf8c8a154zik1zj Sem obrigação alguma em manter ligações com as séries criadas por Ishinomori, as características dos Kamen Riders Showa desaparecem com a chegada do século XXI. Com a produção de uma série a cada ano, hoje é possível acompanhar nas TVs japonesas a 14ª série da Era Heisei, Kamen Rider Wizard. Nas séries atuais, não existem mais Impérios do Mal nem heróis que sofrem mutações cibernéticas após operações, mas a raiz da franquia, que mostra um herói humano, que destrói diversos inimigos com seu “Rider Kick” ainda é mantida e com ela, o respeito por uma das mais notáveis obras de Ishinomori. 1297100675943 No Genkidama, leia mais sobre o Rei dos Mangás, Shorato Ishinomori. XIL – Redescobrindo Ishinomori – Guest post de Felipe Onodera XIL – Shotaro Ishinomori, o Rei dos Mangás Gyabbo! – Skull Man por Shotaro Ishinomori

Uma ideia sobre “Guest Post: Kamen Rider, a saga do justiceiro de Ishinomori”

  1. Muito bom o post. =D
    A @rinaharo escreve muito bem, de maneira simples e objetiva.

    Não tem como pensar em tokusatsu, sem se lembrar do grande Ishinomori. Ele criou, além de Kamen Rider, séries de grande importância, como o Robot Keiji K, Kaiketsu Zubat (interpretado pelo Hiroshi Miyauchi, que fazia o Kamen Rider V3, o Ao Ranger – Goranger, o Big One – JAKQ Dengekitai e o Chefe Massaki de Winspector), Kikaider, Inazuman e muitas outras sempre lembradas com muito carinho pelos fãs.

    Dentro tudo que ele criou, com certeza a série de maior destaque é o Kamen Rider. Apesar da série ser voltada para as crianças, o enredo da maioria delas é super denso, principalmente os Riders da Era Showa.

    Eu diria que todo mundo que não conhece a enorme “franquia” e quer começar a assistir Tokusatsu, deveria ler esse post antes.

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