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O fim de Beck

OfimdeBeck

Yo!

Essa semana saiu o último volume de BECK, um dos meus must read. Comprei meio por impulso quando vi na loja de conveniência, esquecendo que saiu uma versão com a camiseta que o Koyuki usa no ultimo Greatful Sound. Vou ter que comprar mais dois volumes 34 de BECK…

Bem, mas o que eu queria no final das contas era falar sobre o poder narrativo de BECK. Afinal, quem nesse mundo iria se arriscar em fazer um manga sobre música onde não se escuta nada? Alias, vendo entre os detratores do manga, a maioria costuma trazer essa questão. Como um manga sobre rock pode ficar bom sem som?

E realmente, no começo  BECK não tem a técnica pra preencher esse espaço  Quem aqui leu o começo ou assistiu o anime, sabe que a historia quase não se apoia em seu lado musical, sendo uma especie de romance colegial com um background musical. E ele é bem competente nesse lado, ainda mais se pensarmos que o autor, Harold Sakuishi, vinha de dois mangas completamente diferentes.

Mais ou menos onde acaba o anime, começa uma nova fase de BECK, onde praticamente toda a trama pessoal dos personagens acaba ou é jogada em segundo plano pra que a historia se volte completamente para a banda e a carreira musical. É a partir desse ponto que vemos uma evolução grande no autor, na narrativa, na forma de colocar som em páginas mudas.

Em 20th Century Boys, Naoki Urasawa faz uma passagem onde Kenji canta uma musica. Essa musica é importantíssima pra trama, então  Urasawa teve a ideia de escrever a música e fazer a melodia, jogando nos quadros. Ele, nas horas vagas, tem uma banda de prog-rock, o que ajudou muito. É uma ideia…

Mas Harold Sakuishi nunca jogou nenhuma melodia em BECK. E todos que leram puderam sentir a música, inclusive perceber quando é uma balada e quando é uma musica mais agitada, quando a bateria explode, quando entra o solo de guitarra, tudo, só de acompanhar a leitura. E sem uma palavra, ninguém fala nada, nenhuma narrativa, às vezes, nem onomatopeias, só imagens. Isso é o que qualquer mangá com música busca, contar com imagens até mesmo o som.

Em uma passagem desse ultimo numero, logo no começo  temos uma sequencia que explora perfeitamente isso. Um quadro mostrando o vento forte soprando as árvores. As lojinhas sofrendo com a tempestade, e depois, um quadro mostrando o palco principal do Greatful Sound, com algum som entrando bem baixo, em onomatopeias discretas. O público vibra e o som parece aumentar. Em contraluz, Chiba aparece pulando, todo contraído  com o pessoal de fundo, fechando a página antes da virada. E ao abrir a seguinte, a gente dá de cara com um quadro em que Chiba se estica e começa a cantar. A página não tem um balão  até as onomatopeias somem. Mas dá pra sentir a explosão da música, o público gritando. O som corre as páginas como corre no ar, sem onomatopeias, sem imagem. Atravessa os olhos como atravessa os ouvidos, chegando dentro de nós.

Depois de BECK, muitos mangás com musica se deram bem de uma forma ou de outra. Porém, todos usam algum artificio para burlar os momentos musicais, emudecendo cenas onde deveria ter som. Não vou negar os méritos narrativos de Nana, Nodame Cantabile, Detroit Metal City e outros, eles são competentes, mas só usam a música como background. BECK ultrapassou esse limite, com dificuldade, em longos capítulos, mas esse último volume mostra o quanto Harold Sakuishi aprendeu a usar o som mudo de suas páginas. Quem iria fechar seu manga de maior sucesso com musica muda?

Comparando esses mangas que eu citei com BECK, a diferença se torna gritante no momento em que BECK perde os limites do shonen manga comum para ser o primeiro manga de música, de verdade. Como eu disse no final da minha auto-avaliação de TRUCO!, uma historia pode ser de qualquer coisa, mas sua essência é algo completamente à parte do assunto. Em Nana, temos como principal tema, a amizade e o relacionamento dos personagens. E isso é muito bem frisado e, claro, bem realizado. O background musical nunca sai do fundo, nem ao menos temos momentos musicais, paginas só de gente tocando. Nem ao menos sabemos que tipo de música as bandas de Nana tocam, tanto é que cada adaptação que Nana já teve tem um ritmo diferente, um tom diferente. Eu também leio Nana religiosamente, mas por outros motivos. Não pela música, mas pela aula de tratamento de personagens.

Nodame corre pelo mesmo caminho. Temos momentos onde até podemos ouvir a música, mas é porque a música clássica é quase natural, é fácil jogar som na imaginação de gente que já sabe como é o som. Fora isso, assim como Nana, Nodame Cantabile trata da relação dos personagens, como pede a cartilha dos mangas femininos. Sinceramente, lendo Nodame Cantabile, eu cansei. Gosto das piadas e o ritmo é bom, mas parece não levar a lugar nenhum. O anime empolga mais e as piadas de som ficam muito mais claras. Gosto da equipe que fez o anime, o mesmo de Hachimitsu to Clover. O desenho é simples, a animação é cuidadosa e o ritmo da direção é bom, não pesa, mas não deixa a peteca cair. Se pegasse historias com mais ação, não sei se funcionaria do mesmo jeito, mas neste tipo de história, é perfeito.

Detroit metal City… Bem, eu não gosto tanto. É engraçado às vezes, a ideia é perfeitamente idiota, como pede, mas não entendo… Até onde eu li, não sei bem o que pode salvar a historia de não cair na vala comum dos gag manga. Fiquei curioso por causa do hype em cima do manga, gente comentando na TV, altas recomendações em revistas… Talvez tenha pegado em algum ponto fraco do meu gosto, sei lá… Mas até filme isso virou, e com o Matsuken, o atual ídolo-maior-otaku-dos-cinemas, o cara que fez o L, do Death Note. E parece que o filme vai bem…

BECK se provou pra mim como não só um manga muito divertido sobre rock independente, mas como uma nova proposta de narrativa, um caminho novo pros mangas. Aguardo ansioso o próximo trabalho de Harold Sakuishi e espero poder falar bem. O cara eh talentoso!

Pra fechar, os meus atuais must read, depois do fim de Beck:

One Piece – Criativo, ritmo perfeito, engraçado e mesmo depois de mais de dez anos, não parece precisar de um fim.

Hunter x Hunter – Aula de manga, narrativa, criatividade, roteiro imprevisível,  inteligente. E completamente feito sem assistentes, só umas vezes que a mulher do Togashi, a Naoko Takeuchi, ajuda ele.

Zetman – Porque sou fan do Masakazu Katsura. E tenho motivos, ele tá ótimo, em todos os sentidos. Zetman não é pop, mas é bom sim! Ajudaria se tivesse menos texto e mais história.

Pluto – O último trabalho restante de Naoki Urasawa, meu mestre espiritual dos quadrinhos. A filosofia dele pros quadrinhos é perfeita, ser popular sem deixar de ser inteligente e tecnicamente ousado.

Worst – Continuação não continuada de Crows, que virou filme recentemente. Na verdade, só usa o mesmo cenário e alguns personagens. Engraçado como um manga sem linha de historia, sem destino e completamente sem sentido pode ser tao interessante.

Tiro Nana que caiu muito ultimamente, Eyeshield 21 tá acabando e Besharigurashi ainda tá mais ou menos…