Autora de Thermae Romae fala sobre adaptação de biografia de Steve Jobs

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Yo!

Traduzido safadamente do Comic Natalie, uma entrevista legal com a tiazinha que trouxe Thermae Romae ao mundo. Bora ver!

Mari Yamazaki, autora de Thermae Romae (lançamento da JBC esse mês) fala sobre seu mais novo trabalho, a adaptação do best seller Steve Jobs: A Biografia, de Walter Isaacson (no Brasil, pela Companhia das Letras). A premiada autora do mangá sobre termas fala sobre o peso do material e sua experiência.

Originalmente publicado na Comic Natalie, tradução Fabio Sakuda.

 

Meu filho e meu marido diziam “Você faz ideia de como é incrível esse novo trabalho?”

Comic Natalie — Quando saiu a prévia do primeiro capítulo, teve uma enorme repercussão. Tivemos resposta por todo o mundo. Nós pesquisamos notícia sobre mangá em geral em resultados aqui no Japão mesmo, foi espantoso. Yamazaki-san, parece que você é mesmo do tipo exportação.

Mari Yamazaki — Não, foi mais porque Jobs é internacionalmente famoso, o livro original é um best seller. Depois temos que lembrar que a edição da revista onde a série começou foi o primeiro número da renovação da Kiss (revista feminina da Kodansha), com uma capa cheia de brilho, feito pela Akiko Higashimura (autora de Kuragehime). Tudo isso deu o pontapé inicial para a fama. Eu não fiz nada…

CN — Realmente, a reação mundo afora foi “O Japão é bizarro! Algo KAWAII (bonitinho, no próprio termo japonês) e a sobriedade de Jobs na mesma revista.” Você não sente algo estranho, em uma revista feminina, com um traço realista, contar a vida de Jobs?

MY — No começo eu me preocupava, mas se pensar bem, publiquei “Thermae” na Beam (revista da Enterbrain), uma revista completamente misturada. Tudo bem, não é à toa que se chama “magazine” (o termo japonês “zasshi” vem direto do termo inglês magazine, coletânea, variedade), é bom variar.

CN — Mas no começo qual era sua preocupação?

MY — Eu perguntei à eles “Vai ser na Kiss mesmo? Pode?” e meu editor disse “Pode. Digo mais, isso é perfeito!”

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CN — Nos fale mais sobre o começo deste novo trabalho.

MY — Kamakura (seu editor responsável na Kiss) me chamou. Todos pensam que eu recebi a proposta para “adaptar o best seller que vendeu 1 milhão de cópias no mundo todo”, mas eu recebi como um livro que acabou de sair no Japão, numa época em que não sabíamos ainda se estava vendendo ou não. Não me inspirou o fato de ser um empresário centralizador e disse “Não tenho interesse”, recusando. Mas quando cheguei em casa, falei disso para meu filho e meu marido, que é engenheiro. Ele disse “A trajetória de Jobs?! Mas o que você tá fazendo?! Faz ideia de como é incrível esse novo trabalho?” e me convenceu com sua exaltação. (risos)

 

Queria escrever sobre um cara que você pensa “Por que você diz coisas tão rudes” e isso é divertido

CN — Seu filho é fã de Jobs?

Quando Jobs faleceu, eu tive que acompanhar ele até uma Apple Store, onde ele levou flores. Um fã nesse nível.

CN — Foi acompanhar a dor dele?

MY — É, e eu vi uma quantidade enorme de pessoas de toda a cidade indo lá, pessoas humildes e já de certa idade adulta, chorando a morte de Jobs. Foi quando eu percebi e pensei “Nossa, dizem que ele é tão chato, mas parece que era bem famoso”. Mas na época eu não tinha o menor interesse! (risos)

CN — Bem, então agora que passamos desse início um pouco à força, diga, o que acha do material que está escrevendo? Está se divertindo?

MY — Claro! Me divirto muito escrevendo. Porque Jobs é um cara muito ruim! Quanto mais cenas “Por que você diz essas coisas que as pessoas não vão gostar?” aparecem, mais eu me divirto. Já escreveram muito sobre os santos, né? Os ruins na verdade empolgam mais para escrever, fico muito animada. Normalmente, eu já gosto de fazer namorados e coisa assim como pessoas ruins.

CN — E qual o lado bom em escrever sobre pessoas ruins?

MY — Para começar, minha base vem da pintura à óleo. Minha especialização foi retrato. Por isso, acho que sou boa em colocar o interior, a verdadeira face nas expressões, e gosto disso. Thermae também, mas o de agora é estrangeiro, né (o protagonista)? Minha longa estadia no exterior me deu um estoque, acho que sou melhor que as outras pessoas quando, por exemplo, preciso fazer os gestos e a expressão do homem ocidental que chega atrasado a um compromisso. Sou boa nisso.

 

 Nos quadros de retração, tomo coragem e deixo branco e em quadros que detalho e em máquinas, tomo muito cuidado

CN — Em Thermae, Lucius e Hadrianus mesmo sendo da Roma antiga, são basicamente homens ocidentais. Mas parece que desta vez, sua forma de desenhar é um pouco diferente.

MY — Simplesmente mudei de material. Em Thermae, eu usei um Maru-pen (pena mosquito), com linhas finas em excesso. Isso fazia sentido para aquele universo. Mas desta vez, os personagens são todos em caneta-pincel. Queria aproveitar a linha simples, feita apenas com a força do pulso, assim, de uma vez.

CN — Então era tudo caneta-pincel?

MY — É, aqueles de 100 iene (2 reais) da Sailor, que vende no Daiso (rede de lojas tipo 1,99). Sempre que eu vinha para o Japão, comprava em grande quantidade, mas muitas vezes não achava nem no Daiso. Por isso agora eu peço diretamente para a Sailor. Precisa ser aquela lá.

CN — E o que a fez escolher os traços da caneta-pincel?

MY — Eu já disse isso em várias entrevistas, acho que se Jobs estivesse lendo, ele iria preferir isso, sabe? Fazer este material, claro, é importante o leitor e o editor, mas acho que faço me preocupando mais com o que Jobs pensaria se lesse.

CN — Ele era muito ligado à cultura Zen, tem algo a ver com isso?

MY — Não é como se fosse simplesmente porque ele gosta de sumiê, mas porque ele não escolhia o simples, tinha essa personalidade experimentalista, né? Por isso que nos quadros de retração, tomo coragem e deixo branco e em quadros que detalho, preencho completamente.

CN — As ruas da Índia, assim como as de Roma, parecem exalar um pouco do ar para mim.

MY — E também as máquinas! Jobs gostava de máquinas, por isso, se eu desenhasse máquinas de qualquer jeito e ele visse, iria ficar bravo! Por isso, onde tem aparelhos, eu uso dois de meus assistentes que são bons com máquinas e os faço desenhar com perfeição. Os dois ainda me ajudam na pesquisa de época. Às vezes, o livro só nos dá um número de modelo para um condensador por exemplo. Levamos um dia inteiro na pesquisa disso! (risos)

 

A cena em que conversam, fiz acontecer debaixo do céu estrelado. Esse é o poder único do mangá.

CN — Acho que este é o primeiro trabalho em um bom tempo em que você trabalha em uma adaptação, realmente, mesmo que esteja escrito, não dá para visualizar, né?

MY — É, as máquinas também, mas por exemplo, uma cena de diálogo, qual era a expressão dele ao falar? Só posso imaginar. Isso é duro, mas faz parte da adaptação para mangá, certo? Eu tento seguir o original mas existem coisas que são específicas do mangá, quer dizer, se não houvessem, não haveria motivo para eu fazer. Tomo cuidado nisso.

CN — Coisas do mangá? Além das expressões, o que isso significa?

MY — Por exemplo, a cena em que Jobs e Woz (Stephen Wozniak, parceiro de Jobs no começo da Apple) conversam. Eu que decidi fazer debaixo de um céu estrelado. Uma pessoa que viveu daquele jeito, com aquele pensamento, imagino que ele deve ter passado muitas noites olhando a liberdade das estrelas.

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CN — Entendo. Me explique mais um pouco o que é “aquele jeito”.

MY — Ele devia carregar uma enorme solidão. O que fez com sua primeira namorada foi terrível (nota – Jobs negou a paternidade da filha que tiveram por dois anos) e acho que é algo de alguém que tem a solidão impregnada no fundo de sua alma. Seus pais disseram “não quero” e o expulsaram, seus pais adotivos repetiam “você é alguém especial”… Ele pensava “Ok eu estar”, em forte oposição à tudo aquilo. Senão, o “zen” seria só superficial, ele jamais pensaria em se tornar um monge. Ah, e tem os Estados Unidos!

CN — É uma coisa dos Estados Unidos?

MY — Eu percebi isso claramente  quando vivi nos EUA, uma pessoa como Jobs só existiria lá. Os Estados Unidos é um país onde os estudos importam ainda mais do que no Japão. Eles têm orgulho de seus estudos, demais. Vendo meu filho mesmo, ele está no colegial e eu o coloquei em algo como as classes especiais avançadas do Japão. Desde então, ele traz os colegas e o que eles conversam não é normal. Ele ficam falando sobre ter ou não ambição.

CN — Ambição você diz, se tornar famoso ou ficar rico?

MY — Não, não. Não é uma ambição pessoal, mas “o que eu vou fazer para honrar as glórias do meu país, o que o meu talento pode fazer para tornar os Estados Unidos da América ainda maior”. Esse tipo de senso já os separa claramente. Se você não tem qualquer ambição, tá, pegue seu Sub-Prime Loan (empréstimo residencial, como o Minha Casa, Minha Vida) ou qualquer coisa, segregam assim. Mesmo se tiver, depois o que lhe espera é como vai pagar uma famosa faculdade, esses papos tão sérios. É esse país da liberdade.

 

Mesmo alguém bizarro e estranho não é demitido. Esta América de braços largos é que criou Jobs.

CN — Jobs é uma pessoa dessa elite, não?

MY — Não. O ponto de Jobs era seu pensamento “Eu sou especial” e “Eu vou mudar o mundo”, ele tinha essa ambição ao mesmo tempo que trancou uma faculdade que nem era tão famosa assim. E alguém assim se tornar um líder é algo completamente raro. E por ser raro, o autor do livro, Isaacson, o achava um bom objeto de observação.

CN — O imaginava como alguém de outro tipo?

MY — Isaacson é uma pessoa dessa elite, que se formou em uma grande faculdade, ele é desse lado. Por isso, essa biografia não é bem literatura, mas um estudo ou testamento, ele expressa muito bem o lado do legado. O que eu espero ao transformar isso em mangá é pegar este testamento, a verdade, e buscar o “Por quê” que há por trás, para levar isso aos leitores.

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CN — Ele saiu do caminho da elite para depois se tornar alguém além da elite. O que você acha que o levou a isso?

MY — A especialidade de Jobs sempre foi seu talento para ultrapassar os limites. Na engenharia, na arte, no zen, o lado direito e esquerdo do cérebro, negócios e arte, ele estava sempre pronto para ir além desses limites impostos. Por exemplo, Wozniak fica grudado no lado tecnológico. E isso o fez criar coisas que Jobs não poderia, mas isso não o tornou especial como Jobs. Porque Jobs, quando jovem, estava fazendo o que os jovens comuns da Califórnia faziam na época, seguia tendências. Bob Dylan, o zen, a viagem para a Índia…

CN —  Mesmo hoje, na Costa Oeste, tem multidões de pessoas assim, né? Herança dos hippies.

MY — É, mas o Jobs também tinha a habilidade com engenharia mecânica e computadores, talento com as exatas. E outro motivo que eu aponto os Estados Unidos é que quando Jobs trabalhava para a Atari Computer, ele era cabeludo, fedia e só brigava, mas não era demitido. Se o turno diurno era impossível, eles o jogavam para a noite. Essa coletividade, sabe? Mesmo alguém como Jobs é aceito pelos braços largos da América. E o ajudou a ir para a Índia ainda. Eu também sou uma pessoa que vagou por muitos países sozinha, entendo Jobs nisso. Sem tomar banho, fedido, ele estufava o peito e dizia “Sou demais por estar na Índia!” (risos)

 

Mulheres procurando parceiro deveriam olhar para homens como Jobs.

CN — Pra você, Jobs é um homem charmoso? Sei lá, ele tem o charme dos gênios?

MY — Ah, não tem, não! Jamais me apaixonaria. Ele vivia discutindo, era uma pessoa muito ruim. Como amigo sim, mas se namorar, passaria por situações terríveis! Se fosse alguém realmente muito amável talvez, mas alguém com uma genialidade arrogante como ele não inspira nenhuma atração.

CN — Por ser em uma revista feminina, achei que o interesse feminino também havia sido levado em conta.

MY — Garotas apaixonadas por Jobs? Não, não. A Kiss atualmente, mesmo daquele jeito, tem leitoras de mais ou menos 30 anos, procurando casamento como dizem, sabe? E que ainda assim, não conseguem casar, dizem que não tem parceiro. Acho que exigem demais. Talvez seja irresponsável, mas queria dizer para elas tentarem sair com alguém como Jobs. Meu marido também é bem estranho mas depois de casar, é só ir lapidando. Bem, se for do nível de bizarrice do Jobs, sinto muito, eu passo.

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Edição americana, sem ligação com o mangá.

CN — Ha ha ha. Entendi. (risos)

MY — Mas quando ele começa a envelhecer, fica bem melhor. Enquanto desenhava o Jobs com rugas, meu sangue de amante de homens mais velhos aquecia! Realmente é importante a cara que ficamos quando envelhecemos. Ontem eu vi Bill Cunningham New York, um documentário, muito lindo! Sobre um senhor que tira fotos de moda em Nova York há 50 anos! (nota: documentário premiado sobre a vida do fotógrafo de moda de rua do New York Times.)

CN — Eu também vi. As fotos dele são incríveis, mas eu passei a gostar muito da pessoa de Bill Cunningham.

MY — É verdade! As mulheres do ambiente também, acho que para ficar com aquela cara ao envelhecer, você precisa continuar a trabalhar. Por esse lado, o Jobs mais velho tem uma boa cara. Não que eu queira namorar com ele, mas há um charme nisso.

 

Sob o critério de se Jobs estivesse lendo, fiz o layout em 3 quadros generosos

CN — O livro virou best seller em vários lugares do mundo. Este mangá tem a mesma pretensão?

MY — Não sei o que dizer agora. Mas eu evitei quadros geométricos, usei mais layout de 3 quadros, me acomodei nesse modelo bem autêntico (nota: não me culpe, foi o termo que ela usou). Isso foi pensando naquilo de se o Jobs estivesse lendo, por isso escolhi ir para o sólido e simples. Além disso, pensei que se fosse para o exterior, poderia ser lido pela maior quantidade de gente possível. O layout generoso acabou mudando a previsão inicial de dois volumes.

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CN — Falando em mercado externo, a opinião de Isaacson também é importante, não?

MY — Bem oportuno. Desde o começo, parece que a licença foi cedida no “ah, sim, vai em frente”, sabe? Lá saiu um comic, sabe, quadrinho americano. Saíram sei lá quantas revistinhas fininhas assim sobre a vida de Jobs e, bem, o conteúdo é bem vago, é como se fosse um guia de Steve Jobs. Mas o primeiro número (da versão mangá) virou notícia, apareceu até no The Guardian, sabe? Eles não esperavam aparecer em um jornal tão famoso. Tomaram um susto.

CN — Então, aquele que falou primeiro para você pegar o serviço, seu filho, o que ele acha?

MY — Meu filho? Ele está orgulhoso. “Viu, valeu a pena fazer, né?” ele diz.

CN — Posso imaginar! Já estamos chegando ao fim, então diga algo aos leitores da Natalie.

MY — Qual a porcentagem dos leitores da Natalie que acessam por celular?

CN — Já passam de 60%.

MY — Incrível. Bem, devem ter bastante Androids no meio, mas acho que se somar quem lê por iPhones, iPads ou mesmo em MacBooks ou iMacs, deve dar um número muito grande. Por isso, você que leu esta entrevista, quer saber por que o seu produto da Apple tem esse formato? O motivo está nesse mangá! Acho que é isso, tudo bem?

Conteúdo original do Comic Natalie.

Página oficial do mangá

 

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O que eu acho? A mulher é meio sem noção ou bem sincera. Beeeeeeem sincera. Meteu os hadouken no próprio Jobs, no autor do livro, no autor da HQ americana, nas leitoras da revista e no entrevistador, várias vezes. Tinha tanto hadouken nessa entrevista que parecia um gameplay de Street Fighter de rodoviária!

Mas é uma entrevista bacana, é legal ver a mente dissecada de uma autora conceituada falando sobre como produz, o que ela acha importante. E essa visão dela do Jobs, como se ele fosse o Dr House dos computadores, é brilhante. Fiquei interessado no livro e no mangá. Bora encher o saco da JBC pra trazer ele!

E o mais importante é que este post foi feito com muito carinho e dedicação para pescar os iFãs do Jobs, os jobetes. Usando meu PC com Windows e dicionário do meu celular Android! Aproveitem para conhecer o resto do XIL! CLICAQUI!

8 ideias sobre “Autora de Thermae Romae fala sobre adaptação de biografia de Steve Jobs”

  1. HAHAHAHA sem papas na língua, virei fã dela, geralmente vejo entrevistas e japas são tão contidos. Me lembrou a Rumiko Takahashi distribuindo coices em diversas entrevistas. Naoko Takeuchi também é dessas º/

  2. Realmente dispertor, um interesse eu mesmo nunca pesquisei ou me importei! com há apple ou mesmo com criador! Essa falta de pesquisa e interesse, faz perder coisas que podem ser boas de ler e se conhecer! “Quando alguém cria um boa ideia” você realmente pode mudar um pouco o pesamento. Diminuir a ignorância de se fechar só para mesma coisa.

  3. Interessante essa entrevista, principalmente pela quantidade homérica de Hadoukens, e fico feliz de ler que quem está adaptando a biografia tem uma opinião tão franca.
    Pessoas podem ser mais sinceras como ela.

  4. Pior que a tiazinha sem noção conseguiu me convencer a ler, hehe. Vou tentar me informar mais.

    Aliás, estou super feliz por saber que os 3 quadros em uma página que eu uso é algo roots e inovador! Acho que tenho talento natural!
    Hahahah!

  5. Boa entrevista. E putz, fiquei maluco pra ler esse mangá agora, comofas?

    A visão que ela tem de Jobs parece ser muito interessante, tomara que alguém traduza logo essa poha nas internewebs.

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