Green Blood – Editora JBC – Vol. 1

Apertem seus gatilhos e amolem suas facas, pois as gangues de Five Points estão a postos para a rinha… e que vença o melhor ou morram tentando com Green Blood da editora JBC.

 

Green Blood é um manga seinen de cinco volumes publicado originalmente pela Young Magazine da editora Kodansha, cuja autoria é de Kakizaki Masasumi, também autor de Hideout, manga de volume único lançado ainda este ano pela editora Panini. Masasumi também é responsável pela ilustração da consagrada obra Rainbow: Nisha Rokubou no Shichinin, manga de 22 volumes que ganhou uma adaptação para anime em 2010 com 26 episódios.

O quadrinho é ambientado na Nova Iorque de 1865 e conta a história de dois irmãos, Luke e Brad Burns, que vivem no distrito de Manhattan, mais especificamente em Five Points, a pior favela do mundo. Em uma época de crise econômica, dezenas de imigrantes europeus desembarcavam na cidade todos os dias atrás do “sonho americano”, mas se deparavam com uma realidade bem diferente e devastadora. Formados principalmente por irlandeses, chineses e italianos, esses imigrantes eram visto com uma escória e não tinham muitas oportunidades a menos que fossem ricos. Sendo assim, restava à maioria sujeitar-se a pesados trabalhos braçais que pagavam mixarias ou se ligarem a alguma das tantas gangues da cidade.

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Em meio a essa realidade, Luke é um rapaz trabalhador, que se recusa a se envolver com qualquer tipo de gangue, desaprovando os atos brutais que as permeiam, mantendo seus ideais e alimentando com esperança seu sonho de um dia ser realmente livre. Em contrapartida, seu irmão Brad é visto como um vagabundo, passando os dias dormindo, sem fazer nada, nem ao menos se esforçando para ajudar seu irmão nesses tempos difíceis. No entanto Luke nem imagina que Brad possui uma identidade oculta, saindo à noite para praticar seus serviços a mando da gangue Grave Digger, sendo conhecido como o mais perigoso matador de aluguel da região, o “Grim Reaper”.

O personagem de Brad, que é o principal, não é exatamente original, utilizando um estilo já bem conhecido em filmes como Van Helsing, Jonah Hex, Solomon Kane, entre outros, mas coube magistralmente na atmosfera apresentada. Ele é bastante atrativo, pode-se dizer. Apesar da proposta de história com vários clichês, ele não deixa de ter seu charme pessoal, sendo bem desenhado, aparentando feições mais maduras do que sugere sua idade. Ademais, não é apenas um protagonista cheio de ódio e sem propósito, pelo contrário, possui um lado humanitário que se mostra apenas quando está perto de seu irmão caçula, ao qual protege carinhosamente, talvez enxergando nele uma pessoa justa e otimista, que ilumina sua existência nebulosa.

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Enquanto seu irmão sonha com um futuro belo e simples, pode-se dizer que as intenções do nosso matador são um tanto sangrentas, mas que envolvem a vida de uma única pessoa que ele busca para se vingar, a qual você só vai descobrir quem é, lendo. Se existe uma pessoa à qual Brad realmente se expõe sem temores, seria Emma, uma jovem prostituta com a qual ele passa seu tempo livre entre um trabalho e outro. Apesar do que possa parecer, em nenhum momento mostra-se cenas em que eles têm algum tipo de relação íntima, mas seus diálogos proporcionam raros momentos de autenticidade.

Além dos ótimos personagens, não podemos ignorar que o enredo por si só colabora para chamar nossa atenção, por se tratar de uma obra baseada em fatos históricos, retrata a chegada dos imigrantes europeus à Nova Iorque, mostrando bem as esperanças de um futuro promissor e o duro choque do preconceito social e religioso.

A religião cria uma desigualdade sem tamanho, obrigando eles a viverem praticamente como escravos, menosprezados. Observando os fatores que circundavam essa realidade, dá para entender porque muitos optavam pela marginalidade, afinal se não podiam obter respeito, eles forçariam esse caminho com a brutalidade, impondo o medo, criando assim um cenário onde diversas gangues lutam pelo domínio do território, fazendo prevalecer literalmente a lei da selva: sobrevivem apenas os mais aptos.

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Considerando que os irlandeses sofriam forte preconceito, sendo obrigados a aceitar o emprego que lhes fosse proposto ou morreriam de fome, as condições de trabalho eram desumanas. O pagamento por dia trabalhado era muito inferior ao necessário para se viver. Dentro do contexto da própria história, o preço cobrado por matar uma pessoa era 10 dólares, sendo cogitado que uma quantia considerada alta, seria 50 ou 100 dólares por cabeça. Como a vida valia pouco, não?

Para quem está familiarizado com as HQs da Marvel, Five Points pode lembrar o famoso bairro da Cozinha do Inferno, onde são concentradas várias gangues de bandidos de Nova Iorque, cenário de lutas de conhecidos heróis como Demolidor, Homem-Aranha e Luke Cage, para citar apenas alguns. Pode ser que os criadores da Marvel Comics tenham se espelhado fortemente na realidade de seu passado sombrio. Vale lembrar que no final do século XIX começou uma reestruturação na área de Five Points, resultando na prisão ou execução de muitos bandidos. Ainda assim, o que sobrou da “máfia” chinesa e italiana, se concentra hoje nos bairros de Chinatown e Little Italy, respectivamente, ainda em Manhattan.

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Por fim, como falar de Green Blood sem citar a arte espetacular de Masasumi que sempre chama atenção em suas obras pelo detalhismo e traço excepcional? Nesse trabalho não poderia ser diferente. A ambientação sombria, com vários enquadramentos em plano detalhe, lembrando os filmes de velho oeste e sangue para todo lado à la Quentin Tarantino não poderiam ser mais perfeito para um cenário de brigas de gangues do submundo. O traço do autor é muito bonito, bem feito; as minúcias das construções não são delineadas com descaso.

A leitura de Green Blood certamente foi espetacular, deixando com um formigamento de ansiedade sobre o que vai acontecer, com muito ainda a descobrir. Vale a pena acompanhar e eu deixo uma dica pra quem se interessar: vá atrás da história de Five Points porque você vai descobrir muita coisa bacana, não apenas sobre a área dominada pelas gangues europeias, como filmes relacionados, livros, o que ela se tornou hoje, quais os bairros predominantes de Manhattan, muita coisa mesmo. É uma excelente oportunidade de aproveitar o pique do manga para entender fatos reais sobre a cidade.

Sobre Karina Herbsthofer

Artesã, fotógrafa, escritora, otaku, comilona, amante de gatos e dança. Viciada em cheirar livros! Mora no estado de São Paulo. Escreve no blog do Gyabbo! desde 2014.

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10 thoughts on “Green Blood – Editora JBC – Vol. 1”

  1. Excelente resenha. Equilíbrio perfeito, onde sua elegante ausência de spoilers instiga a curiosidade dos leitores. Fala o suficiente sem entregar o ouro. Isso é ouro nessa época onde até mesmo o saber se tornou ostentação vulgar, insensível ao ritmo de descoberta dos outros. Bom caminho. Continue assim. :)

  2. Ótima resenha, irei pesquisar mais sobre os fatos históricos citados! Mas tenho uma dúvida: o traço é fenomenal, mas aqueles vários “riscos” brancos que aparecem em várias páginas fazem parte da arte do mangá? Isso me incomodou um pouco, inclusive pensei se tratar de uma falha de edição da jbc…

    1. Oi Robson
      Os “riscos” que lembram fios de teia, fazem parte do estilo do próprio Masasumi, inclusive no outro mangá dele, Rainbow, ele também utiliza essa característica. Acredito que ele tenta expressar com isso um ambiente mais sombrio. Alguns filmes de suspense também utilizam essa pratica nas capas. Com o decorrer da leitura, dá pra se acostumar. ^^

  3. Queria saber mais à respeito da qualidade técnica: tradução, adaptação, honoríficos, notas, glossário e talz. Gostaria muito de assinar os 5 volumes, mas JBC neh, não dá pra ir seco.

    1. Oi Mike
      A tradução contém um erro ou outro, mas não é nada que afete a leitura em si, quanto a adaptação está muito boa ao meu ver. Não ah utilização de honoríficos, mas no caso desse manga, isso ficou perfeito, afinal não caberia no contexto manter esse estilo de leitura. Infelizmente não ah utilização de glossário ou notas no final do volume, o que achei uma pena porque devido o imenso conteúdo histórico, algumas coisas poderiam ser esclarecidas, mas as notinhas básicas para o entendimento dos fatos e tradução, têm. O resto é pesquisar por conta própria como eu fiz! Eu já assinei um manga deles uma época e não tive problemas, recebi cada volume no mês de lançamento com marcador de página, as edições vieram sem defeito, tem um tempo de uma ou duas semanas para chegar, mas chega! De resto, existe uma polêmica sobre o final de Green Blood não ter agradado a todos, mas quem não arrisca, não petisca! ;D

      1. Obrigadão pela resposta Karina!
        Detalhou exatamente oque eu queria saber. Os últimos dois volumes que sairão de HxH adquiri por assinatura, vieram sem defeitos e com dois marcadores do Another. Como moro no interior vou fechar a assinatura da JBC, muito tenso ter só um local que venda mangas em toda cidade ;<

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