A importância (ou não) dos honoríficos

honoríficos

Na sua opinião, é melhor que a Sakura diga “Sasuke” ou… “Sasuke-kun”?

Sempre que algum manga popular chega ao Brasil, principalmente aqueles que possuem fãs ardorosos, a questão da tradução é discutida. Se foi bem feita, se deixou a desejar. E em algum momento vêm à tona os famosos honoríficos.

Afinal, o que são honoríficos? Onde habitam? Do que se alimentam? Como se reprod… opa, desculpa, me deixei levar pelo espírito do Graveheart.

kurosakikun

A definição de honorífico no dicionário é: que honra, que torna distinto. Os honoríficos japoneses são os famosos -chan, -kun, -san, -sama etc. São usados para “honrar”, para demonstrar respeito em relação às outras pessoas. Entretanto, eles também servem para indicar sexo, nível de intimidade, tipo de relacionamento, enfim, várias coisas. Só para se ter uma ideia, veja como funcionam os honoríficos mais comuns.

-CHAN: normalmente usado para crianças pequenas de ambos os sexos e mulheres jovens. Quando o alguém usa o -chan para um homem isso indica relação de grande intimidade – amigos de infância, por exemplo. Pode ainda indicar que a pessoa que usou é mais aberta e menos formal nos relacionamentos de modo geral. Ao contrário dos outros honorificos, que indicam formalidade, o -chan também pode ser usado para demonstrar proximidade e afeto, mais ou menos como o “-inho” funciona no português (Zequinha, Joãozinho, irmãozinho, etc.).

-KUN: usa-se o -kun para homens que sejam iguais ou “inferiores” (em idade ou status social). Para mulheres, usa-se -kun para aquelas forem subordinadas de alguma forma, por exemplo, as estudantes de uma escola em relação ao professor, ou funcionárias de uma empresa em relação ao chefe. Chamar estudantes ou funcionárias de -kun também pode ser uma forma do professor ou chefe indicar que as considera no mesmo nível que os estudantes/funcionários homens.

-SAN: é bem parecido com “senhor/senhora”. Usa-se tanto para homens quanto para mulheres, geralmente “superiores” (novamente, em idade ou status social). Também pode ser usado com profissões, por exemplo, “omawari-san”/ “senhor guarda” e com nomes de empresas ou escolas para referir-se a seus representantes. As crianças pequenas costumam usar -san também com animais, por exemplo, “kuma-san” / “senhor urso”.

-SAMA: é um honorifico mais formal do que -san. Atualmente é mais usado na escrita do que na fala. Geralmente cartas, convites e outros escritos formais chamam o destinatário de “-sama” independente de idade ou status social.

SENPAI: diferente dos honorificos anteriores pode ser usado com ou sem o nome, por exemplo, “Fujita-senpai” ou simplesmente “senpai”. É parecido com “veterano” em português. Na escola, usa-se para os alunos mais velhos. No trabalho, o senpai é geralmente um colega que está na empresa há mais tempo. Embora não seja uma regra absoluta, frequentemente espera-se que o senpai seja responsável pelos mais novos, que dê orientação e dicas sobre a escola ou empresa.

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Honorificos familiares

ANI/ANIKI/ONII-SAN: usa-se “ani” para falar do irmão mais velho para outra pessoa, por exemplo, se você vai apresentar o irmão para alguém (ani no Akira desu => este é o meu irmão mais velho Akira). Para falar diretamente com o próprio irmão, usa-se “onii-san”(mais formal), “onii-chan”(mais afetuoso) ou “aniki” (mais informal). “Onii-san” também pode ser usado como “moço”, “rapaz”. Por exemplo, se você está perdido em algum lugar e chama um rapaz que está passando para pedir informações (“onii-san, sumimasen…” => “moço, com licença…”). “Aniki” também é usado por membros de gangues para se referir ao seu chefe.

ANE/ANEKI/ONEE-SAN: usa-se para irmãs mais velhas e segue as mesmas regras citadas acima.

OJI/OJI-SAN: significa “tio”. Do mesmo modo que “ani”, usa-se “oji” para falar do tio para outra pessoa e “oji-san” para falar diretamente com o próprio tio. “Oji-san” também é usado para chamar homens de meia-idade de modo geral (oji-san ga ippai ita => estava cheio de senhores/ “tios”).

OBA/OBA-SAN: significa “tia” e segue as mesmas regras para “tio”.

SOFU/OJII-SAN: significa “avô”. Usa-se “sofupara falar do avô para outras pessoas e “ojii-san” ou “ojii-chan” para falar diretamente com o próprio avô. “Ojii-san” também é usado para chamar homens idosos de modo geral. Existe a forma “Jijii”, que quase sempre é pejorativa e frequentemente acompanhada de algum xingamento, por exemplo, “sukebe-jijii” (velho mulherengo).

SOBO/OBAA-SAN: significa “avó” e segue as mesmas regras para “avô”. Também existe a forma pejorativa “Babaa”, que também pode ser um xingamento, por exemplo, “oni-babaa” (velha diaba).

nogamenolife

Honoríficos em animes e mangas

Em Kuroko no Basket, os personagens Aomine e Momoi são amigos de infância. No passado a Momoi chamava o Aomine de “Dai-chan”, depois mudou para “Aomine-kun”. Isso pode significar que ela quis deixar bem claro que os dois não eram mais crianças, ou indicar um sinal de afastamento por que o Aomine, que antes era um garoto bacana, virou um babaca. Quem viu as duas temporadas do anime e prestou atenção na conversa dos dois depois do segundo duelo Touou x Seirin deve saber qual era a verdadeira razão da mudança.

aomomo

Em Haikyuu, Tanaka e Nishinoya acham extremamente importante serem chamados de “senpai” pelos novatos Hinata e Kageyama, talvez pelo fato de os dois sentirem que não são tão levados à sério pelos colegas, Tanaka por conta de sua atitude e Nishinoya por causa de sua altura. Em pelo menos um momento crítico durante um jogo, o fato de Hinata chamá-los de “senpai” é crucial para os dois.

Que os honoríficos podem ser importantes em certos tipos de histórias, não há dúvida. A questão é: como traduzi-los para pessoas que não têm conhecimento da língua e costumes japoneses sem encher as páginas dos mangás ou as legendas dos animes de textos extras? Existe uma solução que faça os otakus felizes mas ao mesmo tempo não complique a vida dos não-otakus?

senpai

Pessoalmente, acredito que o melhor caminho é adaptar o máximo possível. Onde o honorifico não tem uma função específica e importante para o entendimento da história, não há necessidade de mantê-lo na tradução. Há casos e casos, claro. Cabe aos profissionais decidir. E se eu, como leitora, não gosto do caminho que o tradutor escolheu, cabe a mim pensar bem antes de reclamar: a tradução foi mal feita mesmo, ou apenas não foi feita do jeito que eu queria? Será que o jeito que eu quero é o melhor para todos?

E, finalmente, volto a perguntar: é melhor que a Sakura diga “Sasuke” ou “Sasuke-kun”? Eu, que sou interessada em idiomas, história e cultura, prefiro “Sasuke-kun”. Mas e aqueles que só querem descansar a cabeça depois de um dia duro de trabalho/estudo e se divertir com batalhas épicas de ninjas? Será que para eles “Sasuke-kun” é tão melhor do que “Sasuke”?

Sobre liviasuguihara

Instrutora de inglês, "arteira", amante de animes e mangás. Você também me encontra no Twitter (@lks46), no Behance (https://www.behance.net/lksugui7ac5), e no Instagram (liviasuguihara).

Na sua opinião, é melhor que a Sakura diga “Sasuke” […]

17 thoughts on “A importância (ou não) dos honoríficos”

  1. Can i tell something about this? Its RIDICULOUS!
    Eu realmente queria que na hora das traduções eles não colocassem esses honoríficos, sério. Alguns são inteligentes e não colocam, outros não.

    Eu acho ridículo e algo que… Porra, pra que? ‘-‘

  2. Concordo com o “adaptar o máximo possível” e seguir o contexto de cada cena. A Panini prova em mangás mais de fantasia e que não se passam no Japão que é ótima nisso, pena que prefere insistir nos honoríficos desnecessários. Só não pode é bagunçar, traduzir pra alguns casos e deixar o honorífico para outros, na minha opinião. De qualquer maneira, ótimo post e a discussão é bem interessante.

    1. Realmente fica estranho chamarem o Edward Elric de “Ed-kun”, sendo que Fullmetal tem uma ambientação nítidamente européia, por exemplo. Obrigada Naty, fico feliz que tenha gostado do post. ^^

      1. Eu acho q o único anime q eu vi q respeitava a “falta de honoríficos” por não se tratar do Japão foi Monster. Mesmo q o espectador ouça o idioma Japonês (que claramente não é o idioma q eles estão falando) os Honoríficos não aparecem, eles chamam de Nina, não nina-chan e chamam de Dr. Tenma, não de Tenma-sempai ou Tenma-sama. É só um exemplo q eu achei interessante citar.

  3. Geralmente prefiro que se retire ou se adapte o honorifico. Como quando estou lendo procuro estar o máximo possível “dentro da obra” estas palavras acabam sendo muitas vezes um ruído que atrapalha minha leitura. Mas é unicamente uma questão pessoal e não deixo de ler uma boa obra por este motivo.

  4. A não ser que seja uma obra história ou que fale de uma coisa mais longe da nossa cultura ocidental (tipo historias de samurais), acho bobagem traduzir honoríficos.

    Alias lembro que há alguns anos assisti um anime que adaptava a obra de Agatha Christie… assisti em japonês e achei esquisito o dublador chamar o detetive Hercule Poirot de ‘Poirot-san’. Mas entendo que isto era necessário para os japoneses entenderem melhor a relação dos personagens, pois isto fazia parte da cultura deles. Em nenhum momento ouvi eles usarem ‘monsieur Poirot’.

    Se os japoneses fazem isto para ficar masi fácil para eles, por que vamos traduzir honoríficos para complicar nossa vida?

    1. Realmente, se fosse pra chamar de “monsieur” os dubladores japoneses iam sofrer com a pronuncia, coitados…XD

      Eu gostei dessa série da Agatha Christie apesar de estranhar um pouco a menina com o pato, hehe…

  5. Em “Haikyuu” dava pra substituir muito bem o “senpai” por veterano. E tem outros casos que dá de se adaptar. Muitas vezes é possível -e até desejável- colocar o “chan” como diminutivo.

      1. Sim, no manga da Love Hina mesmo, a Shinobu chama o Keitaro e a Naru de Veterano Keitaro e Veterana Naru. Pra mim, fica pior doque se colocassem logo Keitaro-senpai e Naru-senpai. Neste caso, em vez de adpatar, ficaria melhor ignorar de uma vez então. Mas dai perde um pouco o entendimento dos costumes sociais do Japão.

  6. No primeira vez que eu li um mangá é claro que estranhei os honoríficos, e não sentiria a menor falta se eles sumissem. Mas agora já acostumei, e acharia muito estranho se tirassem. Acho válido tirarem os honoríficos quando a história do mangá não se passa no Japão, ou a maioria dos nomes não têm origem japonesa (ou seja, não tem aqueles silabasinhas maneiras).
    Acho interessante o uso dos honoríficos pra demonstrar o nível de intimidade ou de consideração, já que normalmente eles são muito fechados (pq são muito reprimidos né, enfim). Mas eu realmente acho muito estranho quando os casais nas histórias têm muita intimidade, até já fizeram certas coisas e usam honoríficos; ou pior, ainda se chamam pelo SOBRENOME!

    De qualquer forma, eu fiquei muito curioso pra saber como esses tais honoríficos de reprod… (“reprod” o que mesmo?)

  7. Realmente é uma questão bastante dificil de se opinar. Infelizmente, a lingua japonesa possui esta característica que é muito importante para o entendimento da relações sociais dos japoneses. E, os honoríficos, simplesmente não são adaptáveis para as linguais ocidentais. Ou você adapta e fica algo estranho, ou você mantém e explica ao leitor ou simplesmente ignora e o leitor perde parte do entendimento da história, mas que na maioria das vezes, não influencia para o entendimento da obra como um todo.

    Por exemplo, no caso do senpai, que na lingua portuguesa é uma “característica” da pessoa e não uma forma de tratamento. Acho que para um Brasileiro, vai soar tão estranho a Shinobu ficar falando Keitaro-senpai quanto “Veterano Keitaro”, pois nenhuma das duas formas existe aqui. Outra solução é fazer como nas dublagens antigas e simplesmente fingir que isto não existe, ou seja, deveriam simplesmente traduzir como “keitaro”. Até porque na nossa cultura não existe este “respeito” a um veterano como é lá no Japão.

    -kun, -chan, no portugues até existe algo similar que é o “inho” e “inha”, mas que ao usar com nomes japones soa muito estrano, como “Sasukesinho” ou “Usaginha”. Talvez, o ideal para nossa lingua seria mudar os nomes para nomes ocidentais, como foi feito na primeira dublagem de Sailor Moon e como é feito com Pokémon. Dai, ficaria fácil de adaptar, mas dá arrepio só de pensar em chamar o Sasuke de, sei lá, “Rafael”, dai a Sakura ficaria chamando de “Rafa” por exemplo. Mas, se for pensar em adaptação para públicos novos seria o melhor.

    -sensei até que é adaptavel também, pois até no Brasil costumamos (pelo menos na minha época XD) chamar de Professora Maria ou “o Professor Renato ensinou isto na aula de hoje.”. Mas, não costumamos chamar o professor diretamente desta forma. Normalmente só chamamos de Professor e Professora. Mas, ai já não soaria tão estranho. O único problema é que no Japão, sensei também é usado para Doutor e Doutora, o que complica em alguns casos.

    -san acho que é o único que é bem adaptável. São poucos os casos onde soaria estranho. Por exemplo, aqui no Brasil, os professores não costumam chamar os alunos de Senhor e Senhora. Já nos Estados Unidos, este costume existe, mas não tão profundamente como no Japão.

    Por fim, o que quero dizer é que não existe uma solução perfeita neste caso, devido a grande diferença que existe entre a cultura Japonesa e a ocidental. Qualquer uma das formas vai ser ruim e vai depender do gosto pessoal de cada um. Eu que já me acostumei com a cultura Japonesa, prefiro e muito que mantenham os honoríficos. Mas não nego que quando comecei a ver animês legendados, demorei pra me acostumar com eles e por vezes, em vez de ficar pensado na história, ficava pensando “que diabos é chan, san,kun???”.
    Eu diria que, olhando para o lado comercial da coisa, cada caso é um caso. No caso de dublagem, acho desnecessário a utilização. Ler os honoficos não fica estranho, mas ouvir os honoríficos, misturados com a língua portuguesa fica esquisito e acho que a dublagem de Naruto errou nisto ao mante-los. Em dublagem, acho que os honoríficos devem ser ignorados. Assisti Yu Yu Hakusho, Dragon Ball e Cavaleiros do Zodiaco sem saber disto e fui feliz. Mas, no caso de animês legendados, os honoríficos, assim como o costueme do japones de colocar o nome de familia na frente do nome próprio, devem ser mantidos, até porque escutamos os personagens usa-los e falar desta forma.

    No caso de mangás, é difícil dizer. Mangá é algo muito de colecionador e colecionador no geral prefere que se mantenha os honoríficos. Mas, no caso de tentar atrair um público novo, o ideal é que mangás que ficaram conhecidos através de animês dublados, o ideal seria ter os honoríficos ignorados. Já, mangás que ficaram conhecidos pela internet, devem ter seus honoricos mantidos.

    Finalizando, nossa me empolguei hehe, o ideal mesmo é fazer o que estou fazendo, um curso de Japones.

    1. Concordo que a questão é bastante complexa, Edward. A maioria dos casos acredito que a adaptação é a saída, mas há situações difíceis, por exemplo, uma cena em que um veterano fica super ofendido por ter sido chamado pelo nome por um calouro. Como traduzir algo assim?
      Enfim, é bom ver pessoas dando suas opiniões aqui. Obrigada pelo comentário! ^_____^

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