[Coluna Hanyan #2] Stepping on Roses

Olá!

Em primeiro lugar gostaria de agradecer pela recepção calorosa que vocês têm me dado desde a  estréia da coluna, muito obrigada pelo apoio!

Hoje vou falar de um mangá bem diferente dos anteriores, Stepping on Roses.  Porém antes de dissertarmos a obra em si, eu gostaria de fazer um pequeno parêntesis sobre a discussão que define os limites entre qualidade e gosto. Os meninos do Mangá² recentemente gravaram um podcast (muito bom) sobre o tema, mas gostaria de deixar a minha opinião registrada aqui: “Qualidade” é objetiva, enquanto “gosto” é subjetivo. Agora vou tentar desenvolver um pouco essa ideia.

Eu acredito que exista um conceito objetivo de qualidade. E pra ele não podemos considerar apenas a nossa opinião e sim avaliar um conjunto de opiniões de pessoas especializadas no assunto e que possuem mais conhecimento do que nós, o que gera uma espécie de consenso pra determinar se tal coisa é “boa” ou “ruim”. Quando eu digo especialistas, não me refiro apenas a críticos profissionais, mas também à pessoas com um bom nível de conhecimento e capacidade analítica.

A qualidade de uma obra deve ser classificada com base em aspectos concretos, como a originalidade, o impacto que ela teve na sua época, o desenvolvimento da história e dos personagens, o refinamento da arte, a capacidade do material de se conectar com o seu público alvo, etc. E o ponto central: se a obra executa o que ela se propõe a fazer.  Originalidade também é importante mas não é tudo. Mais vale um clichê bem desenvolvido sob uma perspectiva interessante do que uma ideia nova “queimada” com um desenvolvimento pobre.

Seguindo a lógica da minha “tese”, a obra ser boa ou ruim não depende da nossa opinião sobre ela. Mas aí caímos no outro lado dessa questão: o gosto. Esse sim, pessoal e intransferível. Porque as suas experiências, a sua formação intelectual e social e até mesmo o momento de vida em que você se encontra contribuem muito para determinar isso. Porque não tem o menor problema você gostar de uma coisa ruim, contanto que você saiba que ela é ruim! É para isso que existem os guilty pleasures. Não vejo  nada de errado em se divertir pra caramba com uma coisa evidentemente ruim. É o famoso “é ruim mas eu gosto”.

Considerações feitas, vamos partir para a obra desse mês: Stepping on Roses.

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Hadashi de Bara wo Fume (que é um pouco mais dramático do que o nome comercial americano e significa “pisando descalço em rosas”) de autoria de Ueda Rinko foi publicado originalmente entre 2007 e 2012 na revista shoujo Margaret e teve seus nove volumes licenciados nos Estados Unidos pela maravilhosa editora Viz Media, sendo essa a edição que acompanho.

A protagonista Sumi é órfã e vive na miséria, batalhando para dar sustento aos seus cinco irmãos caçulas adotivos, coletados das ruas por seu irresponsável irmão mais velho Eisuke. Como se não bastasse, Eisuke (um charmoso michê e canalha profissional) gasta todo o dinheiro que ganha com supérfluos e acumula enormes dívidas de jogo.

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Diante de cobradores ameaçadores, Sumi não vê outra alternativa, ela vai para o distrito da luz vermelha na tentativa de manter a sua família vendendo o seu corpo.

Porém a nossa heroína é muito jovem e ingênua, decidindo cobrar o preço integral da dívida para o homem que quisesse ficar com ela, o que faz com que se torne uma espécie de piada. Contrariando todas as probabilidades (e obedecendo à todos os clichês), aparece um jovem disposto a pagar tal fortuna à menina. Mas ele não a quer apenas por uma noite…

O jovem é Souchiro, neto do dono de um conglomerado que só poderá legitimar a sua posição como herdeiro quando se casar. Então surge o acordo que determinará a história daqui para a frente: a proposta de um casamento de fachada em troca de dinheiro à Sumi, não apenas para pagar a dívida mas também para sustentar sua família para o resto da vida.

A mocinha desesperada aceita o acordo, mesmo sabendo que era uma condenação para ambos. Afinal, o casamento traria enormes vantagens financeiras para os cônjuges, porém os prenderia em um compromisso sem amor para o resto da vida.

Só para contextualizar um pouco: a história se desenvolve durante a Era Meiji que foi, entre outras coisas, um período de grande progresso e modernização, no qual o Japão começou seu processo de ocidentalização. Era chique na época trajar roupas ocidentais e adotar costumes europeus, e as famílias mais ricas passaram a viver nesse padrão.

Então além de ter que se adaptar aos refinamentos da alta sociedade, a protagonista também tem que aprender a lidar com uma cultura totalmente diferente da sua em mais uma moderna re-interpretação do mito de Pigmaleão. Percebam que passamos de uma história extremamente dramática nas sarjetas pra virar algo leve parecido com My Fair Lady que depois evolui para um melodrama com gostinho de insanidade. Cenários (pouco plausíveis) que não duram muito e logo se transformam em outra coisa: isso é Stepping on Roses.

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Stepping on Roses não é apenas uma história cheia de clichês, ele conseguiu ser uma enciclopédia do gênero. Qualquer coisa dramática que você imaginar tem grandes chances de acontecer durante a série, então espere por grandes reviravoltas durante todo o desenvolvimento. É um conto de personagens extremos e estereotipados que por vezes são ambíguos; com psicopatas que se fazem de mocinhos e de mocinhos que se permitem serem cruéis.

É por isso que eu carinhosamente a chamo de “a novela mexicana dos mangás”.

Como toda boa novela, o mangá tem propriedades adictivas inacreditáveis. Em cada capítulo acontece alguma coisa e você sempre acaba desesperado para saber o que acontecerá no próximo. Não importa o quão batido o enredo seja, você sempre vai ficar se perguntando “e agora?”. E sempre acontece alguma coisa. Sempre.

Ueda Rinko criou em sua série um verdadeiro desfile de absurdos, com uma sucessão de acontecimentos improváveis (e, porque não, alguns bastante imprevisíveis).  Não importa o quão extravagante seja a situação que ela crie: fica aceitável; tudo o que poderia ser considerado forçado se passa com naturalidade. O maior mérito da autora foi a criação de um universo tão exagerado que lhe dá a liberdade de carregar a história para o rumo que ela quiser! E deixa os leitores em um constante paradoxo, porque ao mesmo tempo em que estamos ansiosos para o que acontecerá a seguir, também aceitamos passivamente qualquer coisa que ela nos entregar (por mais lunática que seja).

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O grande trunfo da série é a sinceridade que ela tem consigo mesma. Stepping on Roses nunca se propôs a ser um material sério ou inovador. É uma história de tipos, muito bem executada que não apenas tem noção dos seus clichês e do seu teor dramático exagerado, mas tira o máximo proveito disso, conseguindo fazer do que poderiam ser seus pontos negativos o seu grande diferencial. Em diversos momentos nós leitores podemos observar os personagens tão surpresos quanto nós pelos rumos que a história toma, e isso apenas prova que a autora tem plena consciência do tipo de material que ela tem nas mãos.

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Então se você gosta de uma boa novela, com direito à muito drama; ganância; (muita) loucura; viradas surpreendentes e paixões desenfreadas, Stepping on Roses será entretenimento garantido. Mas não vá esperando encontrar a série da sua vida.

Com isso voltamos à discussão inicial. Hadashi de Bara wo Fume é um bom mangá? Não sei. Porque se analisarmos superficialmente ele será considerado clichê e (aparentemente) forçado. Mas quando pensamos que ele foi feito exatamente com essas intenções, será que ele não seria considerado um mangá eficiente na sua proposta? Se é bom ou se é ruim eu não consigo definir, mas que eu gosto, gosto. E gosto muito.

Tentei fazer uma review sem spoilers (o que é muito difícil em uma série que muda constantemente) mas se você se interessou pelo assunto, eu recomendo as análises dos volumes que a Valéria tem feito para o Shoujo Café.

O ministério dos otakus adverte: nem tente começar a ler  esse mangá no meio de uma semana de provas ou em uma época de muito trabalho, porque a história vai te manter refém até o final.

Até o mês que vem com a volta da nossa coluna Hanyan!

Mallu

Sobre Gabriela N.

Apaixonada pelo cinema, pelo teatro e pela literatura. Devota das artes e das ciências sociais e humanas. Fã de séries e de HQs. Fangirl, geek, retrô. Clichê.

Olá! Em primeiro lugar gostaria de agradecer pela recepção calorosa […]

12 thoughts on “[Coluna Hanyan #2] Stepping on Roses”

  1. Concordo com tudo que você disse! Hadashi é uma novela mexicana sem fim! Tudo é clichê: o casal que se apaixona aos poucos, o vilão que tenta os separar, conflitos familiares, traições, etc.
    Gostei muito do mangá, apesar do clichê , prende a atenção. Ótima resenha, estou ansiosa para as próximas!

  2. Mallu, já tinha lido as resenhas do Shoujo café mas confesso que a tua me fez ficar com mais vontade de conhecer esse “Drama mexicano da nação Japonesa” hehe.
    Como você disse no começo da resenha, existe sim o “é ruim mas eu gosto”…Lembro bem de lá por 1999, 2000 eu ter começado a assistir uma novela chamada Betty a feia, porque era o tempo que eu tinha entre chegar do trabalho e ir para o cursinho. E eu adorava, e as pessoas diziam: “Roberta como tu podes assistir isso?” e eu dizia: “É ruim mas eu gosto!” hahahaha. Enfim, eu nunca li essa história mas já estou vacinada, sei que ao ler terei que abstrair essas grandes mudanças de enredo!
    Senti uma semelhança entre essa história e Hapi Mari…na parte de a menina assumir a dívida da família e ter que se comprometer com um casamento para pagar essa dívida, o que beneficiaria o herdeiro que precisa se casar para usufruir a herança/cargo…etc…O Hapi mari claro, com toda carga erótica que nesse manga não sei se existe.Obviamente enredos semelhantes são comuns mesmo…
    Enfim, eu acho que deve ser uma boa leitura, daquelas grudentas que nem tu disse, que não podemos ler quando estamos cheias de tarefas e trabalhos hahahaha! Vou conferir!
    Obrigada por mais essa resenha, e aguardo ansiosamente a próxima :)

    1. NOSSA, BETTY A FEIA!!!! Era legal demais!! Eu AMAVA a série americana que fizeram inspirada na novela!!! (Mas confesso que nunca vi a original…)
      E acho que ler Stepping on Roses é válido, ainda mais no seu caso que também é adepta do “é ruim mas eu gosto” hahaha

      Hapi Mari eu não conheço! Vou procurar! Mas quanto carga erótica, existe sim em Stepping on Roses. Como um bom dramalhão, tem uma boa dose de tensão sexual sim, mas é um erotismo bem dramático (e com uma carga as vezes bem exagerada e brega, como tudo mais na série), nada pornográfico.

      A leitura é bem gostosa, divertida e grudenta sim :D Se gostar depois me fala!

      Obrigada pelo carinho e pelos elogios e espero te ver aqui mais vezes!

  3. Nossa, toda a descrição lembrou a minha aula de arte barroca – dramático, excessivo, assimétrico, dentre outros- hahaha mas me deu vontade de ler. Acho que pela sua opinião de seguir a proposta. deve ser um mangá bom, sim. :}

    1. Ah mas barroco é bom e bonito -Q
      Então, é um mangá bem legal, e eu acho que vale a pena ler sim! Mas se é bom… hahahahaha
      Volte sempre pq eu sinto a sua falta tá?

  4. Ok, confesso que fiquei curiosissima pra ler esse mangá! *-*
    E realmente, me lembrou muito de Hapi Mari (que acompanho o melhor que posso, lancem por aqui pra que eu possa comprar, plz D:), mas no caso o inicio da história é um tantinho diferente :D

    1. GENTE VOU FICAR COMPLEXADA POR NÃO TER LIDO ESSE HAPI MARI! hahahahahahahahahahah
      Vai pra lista de prioridades urgentes XD
      Eu acho que vc vai gostar de Stepping on Roses, Pers!!
      xoxo

      1. hahahahahaha o enredo é bem parecido, mas pelo que li da sua resenham, Hapi Mari é bem mais simples!!! E se vc disse que eu vou gostar de Stepping on Roses, é pq com toda certeza eu vou gostar!!! rs

        Bjs

  5. Comecei a ler hadashi de bara fime e não consegui parar aff ele é d+ muitos acontecimentos inesperados mais isso é q prende a atenção do leitor
    Ja tinha lido alguns mangas escrito por Ueda mas esse eu amei

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