Sakamichi no Apollon

Será que o anime mais hypado do ano também conseguiu ser o melhor anime do ano?

Introdução e Sinopse

Sakamichi no Apollon [Kids on the Slope em inglês, Crianças na Ladeira em português], anime de doze episódios transmitidos no famoso bloco noitaminA [Fuji TV] entre Abril e Junho de 2012 baseado no premiado manga de nove volumes escrito por Yuki Kodama, conta a história de amadurecimento [coming-of-age] do tímido e certinho Kaoru Nishimi, que em uma cidade do interior do Japão viverá durante os anos 1960 uma história de amor, amizade e música aonde também entram o carismático e briguento Sentarou Kawabuchi e a amiga de ambos, Ritsuko Mukae.

Sinopse manjada que foi bem-tratada por Kodama a ponto de ganhar prêmios e esta adaptação animada que marcou o retorno de Shinchiro Watanabe a direção de um anime [algo que não acontecia desde Samurai Champloo, de 2004] e até mesmo a chance deste fazer uma dobradinha com Yoko Kanno – sim, a dupla famosa por tornar Cowboy Bebop o grande clássico que é, um dos poucos animes com aceitação quase universal – nesta obra regada a jazz.

Parte Técnica

Sim, porque o plano de fundo aqui permitiu que, principalmente nos episódios iniciais da obra [e mesmo depois temos o padrão de ao menos uma jam session por episódio – sendo que diversos dos melhores momentos da obra são compostos por estas], o tema musical tivesse um bom destaque no meio dos demais temas tratados em Apollon. Claro que mesmo a abordagem de Kanno não foi perfeita e não temos uma trilha a ser lembrada ao longo dos anos, mas sim, temos um ótimo resultado que conseguiu tanto ser uma ótima trilha sonora em si [sendo que a OST é boa independente do encaixe feito na obra] como funciona para inserir o espectador naquele mundo e mostrar que estes personagens respiram música.

Se Yoko Kanno, em plena forma, cumpriu o seu papel, Watanabe e a equipe de animadores do novo estúdio do fundador do MADHOUSE Masao Maruyama chamado MAPPA [com auxílio do Tezuka Productions] também consegue somente com recursos levemente acima da média criar uma representação de mundo fiel e imersiva, sabendo sempre ser detalhista ao encaixar as referências certas e muito estável, mantendo o espectador em um estado no qual não chega a notar que com mais dinheiro tudo poderia ser muito melhor, para, nas cenas-chave, produzir alguns dos pontos mais altos que a animação japonesa como um todo viu em alguns anos.

O uso de rotoscopia nas cenas [e o cuidado ao fazê-lo] só ajuda a obra a entregar cenas fantásticas como podemos ver no final deste artigo – além de poderosas por outros fatores, também são sensacionais por mostrarem até aonde pode ir a qualidade de um simples anime televisivo. Isto – que não se limita às sessions [vide algumas lutas do Sentarou dos primeiros episódios] – complementa a ótima fotografia que dá o tom certo para a obra. Pena ainda termos a impressão de que é mais um anime feito no computador – do CG ao contraste entre cenários e personagens podemos ver que Watanabe literalmente fez o que pode para termos aqui algo com algum padrão de qualidade.

Uma História de Amor e Amizade

Como dito acima, o roteiro de Apollon acaba sendo bem simples, sendo que o ponto principal é vermos a grande mudança que acontece na adolescência de Kaoru ao conhecer Sentarou e Ritsuko – sim, temos um triângulo amoroso desenvolvido de forma algo óbvia e principalmente uma história de amizade entre os protagonistas que além desta complicada relação com o terceiro vértice [que infelizmente aqui acaba sendo o polo mais fraco, um personagem genérico que parece estar ali para levar a história adiante e também para servir como referencial ao público-alvo feminino] tem uma bela e forte relação com a música. Amigos, rivais, principalmente melhores amigos.

E a execução desta história acaba sendo definida por dois pontos: o primeiro deles, excelente, é o fato de termos Shinichiro Watanabe como diretor. O manga pode ser bom, mas fica claro a cada segundo que o faro dele para contar da melhor maneira possível uma história continua impecável – praticamente cada cena é útil e adiciona para uma coerência interna desenvolvida de forma brilhante e te fazem esquecer que existiu um original disto: simplesmente não temos trechos em que uma página do manga foi transformada em script, storyboard e finalmente anime sem que os toques necessários para fazer sentido nesta nova mídia estivessem presentes.

Assim, friamente é de longe o melhor direção desta primeira metade de 2012, conseguindo contar uma história com começo, meio e fim excelentes para o que se propôs – a verdade é que diversos fatores, do monstro da expectativa até mesmo um começo aonde a possibilidade de seguir mais a fundo a concepção original do produto [o mote] é presente: a música acaba ficando de lado no terço final de Apollon em prol do amor e amizade, comprometendo o necessário equilíbrio. Emocionalmente até funciona, mas camadas são perdidas de forma desnecessária.

Mas o ponto mais cruel aqui – e que nem Watanabe conseguiu contornar sem comprometer ao menos em parte a qualidade da obra – foi transpor nove volumes de história para somente doze episódios, ou quatro horas, de animação. No geral, a edição foi irrepreensível, mas tarefas como a do episódio final – condensar um volume em vinte minutos – são crueis demais para qualquer um; e mesmo assim temos este review do volume nove que é favorável a adaptação.

Uma tendência dos personagens agirem para o enredo, e não o contrário, é a sensação que permeia a parte final da obra: tudo é feito para as pontas soltas se amarrarem em prol de um enredo bem-amarrado, de um clímax, de um fim que faça Apollon ser o coming-of-age que pretende ser.

E isto acaba em parte negando a magia da obra que é termos aqueles personagens adoráveis, complexos e amigos como plano principal de uma série focada nestes [character-driven]; apesar dos pesares, Tsuritama [afinal foi o complemento de Apollon na temporada de Abril/2012 no noitaminA] entende que seus personagens são o prato principal do show e que nem mesmo o enredo deve estar na frente das interações entre estes. Interações estas que fazem com que um Apollon expandido para 2-cour soe como a melhor maneira de contar esta história. Aqui, a minutagem pesou contra.

Conclusão

Um anime acima de tudo sóbrio, em que uma adolescência algo filtrada pelos olhos da nostalgia [da mangaka e do diretor] é contada principalmente através do viés da amizade entre dois personagens tão fascinantes quanto Kaoru Nishimi e Sentarou Kawabuchi. Amar, odiar, torcer por, sorrir e chorar junto – difícil é ser indiferente a esta dupla. Claro que Sentarou é o carisma aqui, mas Kaoru é no mínimo igualmente bem-trabalhado – e real, afinal, é nosso ponto de vista sobre mais um estudante que sobe a ladeira do título, rumo a escola.

Amor, amizade, música: personagens secundários a parte [quem se importa com Jun e Yurika?], tivemos tudo isso refinado ao ponto de podermos dizer, muito pela execução, que estamos diante do anime cult, do provável melhor do ano. É rápido, poderoso, adolescente – e perfeito para assistir numa longa, intensa sentada no sofá.

O Bom: Personagens principais; direção fenomenal; excelente trilha sonora; jam sessions; representação do período detalhista e precisa.
O Ruim: Personagens secundários desinteressantes; ritmo rápido demais do terço final; orçamento apenas mediano.
O Resumo: A abertura, que passa com perfeição o tom pretendido pelo anime.

Bonus

Abaixo, as três melhores cenas do anime – todas sendo jam session.
Sendo que as duas últimas são SPOILER [e a primeira – pule para 17min20s do vídeo – está sem som]

Digno de nota o texto do Noots no Subete Animes que foge lindamente da estrutura mais tradicional deste texto para focar em outros aspectos tão ou mais interessantes que os abordados aqui.

Será que o anime mais hypado do ano também conseguiu […]

6 thoughts on “Sakamichi no Apollon”

  1. Apesar de vc dizer isso sobre secundários: Jun e Yurika tiveram uma das cenas mais interessantes e excepcionais de todos os romances atuais de animes. As discussões foram frenéticas no forum. Fizeram todos mudarem de opinião de até onde um anime nos leva. Por mais que eles não influenciem no desenvolvimento do enredo (afinal são coadjuvantes e nada mais) tiveram seus momentos sim, Qwerty.
    Se não fosse o final que tiveram, concordo que não passariam de mais um casal platônico que aos montes existem em animes.
    Pontos pra direção.

  2. Adorei o texto, Qwerty.
    Sou muito suspeito (expressão clichê) pra falar sobre Sakamichi no Apollon. Eu me apaixonei pelo anime, fazia muito tempo que eu não passava 20 e poucos minutos por semana sorrindo sem parar assistindo a cada episódio. Eu estudo música e, desde que conheci, me apaixonei por Jazz, e ver isso dentro de um anime pela primeira vez (pra mim) foi algo único, inesquecível. Não só o Jazz, os personagens, os dramas, os romances, as paisagens, tudo me fez criar um carinho especial por esse anime que vai ficar gravado na minha memoria enquanto eu viver, tenho certeza. Não foi perfeito, mas passou muito longe de ser ruim. Acho que isso basta.

    Enfim, sem nada que possa ser adicionado aos comentários sobre o anime, só um relato de uma pessoa que ainda se encontra (mesmo depois de algumas semanas) maravilhado com a obra.

    Até mais!

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