Berserk Ougou Jidan-hen I: Haou no Tamago

O melhor manga de todos os tempos finalmente ganha a adaptação que merece. Será que é isso mesmo?

Apesar de no geral os fãs de Berserk gostarem do anime de 1997 – principalmente da trilha sonora feita por Susumu Hirasawa [tanto que este acaba tendo participação especial neste filme compondo a música de abertura] – a lamentação geral pelo anime de vinte e cinco episódios nunca ter ganho qualquer continuação sempre foi uma constante neste algo quieto – afinal, Kentaro Miura não é conhecido por sua regularidade – mas sempre presente fandom.

E se desde 2009 já tínhamos rumores de que a obra estaria para retornar em toda a sua glória [e o fato das imagens presentes no link acima serem em formato de cinema mostram que tem ligação com o projeto atual], em 2010, quando do lançamento do volume 35 da já extensa saga tivemos a confirmação de um novo projeto. E, claro, com lindos comerciais como este.

O que saberíamos algum tempo depois é que temos um longo projeto de recontar a história do manga em uma série de filmes; e assim foi inicialmente confirmada uma trilogia de filmes que em torno de cinco horas de duração pretende contar o arco conhecido como Era de Ouro, que no original se esparrama ao longo de dez volumes – e como sabemos, comprimir tamanha informação é tarefa para poucos [claro, Sakamichi no Apollon acaba fazendo tarefa similar de forma excelente – mas para isso é necessário um raro Shinichiro Watanabe].

Mas anime é uma mídia visual e a informação que verdadeiramente caiu como uma bomba foi a de que o competente Studio 4C [Genius Party, Mind Game, Thundercats [2011]] estaria usando uma técnica que mistura um pouco da animação tradicional de sempre com os temidos personagens em 3DCG; atualmente já nos acostumamos com carros, cenários e otras cositas más feitas baseadas em modelos feitos no computador, mas seres humanos ainda são terreno de produções que chegam a centena de milhões de dólares investidos – e mesmo assim, em um padrão algo cartunesco.

Mas é claro que a vontade de entregar algo inovador necessidade de economizar dinheiro fez com que Guts e outros ora sejam desenhados ora modelados, a depender da cena – e a óbvia intenção aqui é entregar cenas de ação grandiosas e dignas de um filme, ainda mais um com o nome Berserk.

A intenção é boa e a montagem do resultado final até funciona na teoria; o problema é que na prática a modelagem é ridícula até para os padrões atuais de jogos, quanto mais de filmes, chegando a comprometer mesmo para o espectador mais casual a imersão na obra. E se na época de lançamento já podemos falar neste tom, imagine daqui a dez ou vinte anos? – lembrando que é esta uma tecnologia com ciclo de vida criminosamente baixo. Resultado: um longa animado da Disney pode ser datado, mas nunca feio ou mal-desenhado; já Shrek ou Vida de Inseto claramente estão ultrapassados.

Computadores a parte, os close-ups animados da forma tradicional são algo frequentes e lindos de morrer e acabam dando um pouco do gosto do que aquilo deveria ter sido: algo visualmente plástico o bastante para acomodar esta fábula de um homem que vai viver sua história de amadurecimento da forma mais cruel possível.

Sim, apesar de ser um potencial problema para suas continuações, a fotografia limpa presente aqui acaba se encaixando bem para contar a história do jovem mercenário Guts e seu encontro com o carismático Griffith, líder do Bando do Falcão e aquele que tanto carrega o Olho do Rei mencionado no título deste filme como o agente que aqui e adiante será decisivo na história de nosso anti-heroi.

Para atingir o objetivo acima de resumir tanta informação em tão pouco tempo, foi estabelecida esta linha dorsal da relação entre estes dois interessantes personagens que acaba sendo a faca de dois gumes do filme em seu aspecto narrativo – ao mesmo tempo que garante o mínimo de coesão necessária para a obra funcionar como entretenimento, acaba simplesmente capando todo e qualquer desenvolvimento presente fora do binômio ao qual se resume esta obra: e é na figura de Casca, com participação cronometrada aqui, que podemos simplificar este processo.

Claro que podemos perceber que o forte de Berserk é pegar uma sinopse em teoria clássica e sim, batida, e saber contá-la da melhor forma possível – e para isso desde a arte envolvente, nunca datada e até mesmo simplificada e limpa para este anime até o uso liberal de sexo e violência são necessários; e se os fatores citados acima foram, a sua maneira, mantidos aqui, acabou-se perdendo nesta necessidade comercial de comprimir-se a obra a fagulha que separa o bom do ótimo.

A direção de Toshiyuki Kubooka, experiente character designer mas algo iniciante como diretor, acaba revelando-se dentro da média ao entregar os pontos básicos de uma introdução sem comprometer o resultado final; apesar de um ou outro diálogo ser um pouco mais arrastado do que deveria, conseguimos ter certo equilíbrio entre a ação e o desenvolvimento desta fábula ao menos até aqui focada no desenvolvimento de personagens em meio a um vasto e promissor mundo.

Mas dentro da média certamente não era o que alguém esperava, principalmente ao lembrarmos dos credenciais e expectativas que tão famosa obra traz; infelizmente faltou dinheiro e principalmente minutagem para que a equipe pudesse trabalhar melhor no projeto, para que este tivesse a chance de deixar sua marca. Claro que o nome pesa, e de uma forma ou outra muita gente deve acabar assistindo a trilogia [e provavelmente não passaremos muito disso, dada a recepção morna obtida no Japão], mas estamos diante de algo esquecível.

E nesta parte de um projeto rodado simultaneamente [tanto que os três filmes serão lançados nos cinemas japoneses no exíguo espaço de um ano], vale especular algumas coisas sobre o que virá: primeiro, parte da frustração sentida aqui pode ser por termos visto basicamente um filme incompleto – até tivemos um clímax, mas o tom de introdução é óbvio e o trailer da segunda parte empolga também por vermos que os setenta e cinco minutos de filme estão construindo algo que deve ser explorado mais a frente – e quem leu/viu A Sociedade do Anel sabe como épicos costumam demorar para chegar a seu ponto de ebulição.

Segundo [que é ligado intrinsecamente ao primeiro]: temos aqui a típica obra cujo resultado como um todo depende muito do final; em uma construção focada no clímax, caso este decepcione todo o castelo de cartas vem abaixo e não são lembranças doces que irão salvar uma impressão final ruim. Um começo agradável não é algo fácil, mas o verdadeiro desafio para os realizadores de Berserk ainda está por vir.

E por fim, resta saber se teremos outros filmes depois desta trilogia – com as vendas do primeiro volume girando na casa dos dez mil exemplares vendidos, algo apenas razoável para produções cinematográficas, depende muito das vendas se manterem absolutamente estáveis para que um orçamento igual ou até menor seja o suficiente para que mais Berserk feito desta forma seja considerado economicamente viável.

Claro que há motivos para os redatores do Chuva de Nanquim e Elfen Lied Brasil terem um tom mais pessimista sobre esta obra, mas pelos motivos apresentados acima o veredito é que faltou mais um pouco de polimento em praticamente tudo, mas principalmente graças a um belo de um original e a uma produção que não comprometeu temos sim uma obra divertida e assistível – isso, se não tiver alergia a 3DCG. Só não faz jus ao nome – pelo menos não nesta primeira parte.

O Bom: Excelente interação entre os protagonistas; filme fácil de se assistir.
O Ruim: Muito curto, tendo que cortar certas tramas para caber a história; mistura de animação tradicional com 3DCG que além de não convencer soa barato.
A Peluda: Casca, se você me entende.

O melhor manga de todos os tempos finalmente ganha a […]

4 thoughts on “Berserk Ougou Jidan-hen I: Haou no Tamago”

  1. Bom texto, principalmente na hora de avaliar a parte técnica ao invés de simplesmente atacar como muitos reviews tem feito por aí.
    E realmente, eu q sou um grande fã de berserk, me decepcionei bastante com o primeiro filme, sobretudo no exagero das cgs e partes cortadas do mangá, sobretudo por ter sacrificado o desenvolvimento dos personagens.

    Vejo muita gente reclamando da série antiga, mas sinceramente, ela foi bem mais fiel em desenvolver o enredo do q esse novo filme. Claro q pode parecer um pouco injusto comparar algo q foi contado em uns 13 capítulos de anime com um filme de 90 e poucos minutos, mas ainda assim eu considero q o problema do filme foi a direção q apenas “recortou” algumas cenas do mangá e deixou outras, mas sem preencher os buracos.

    Tbm acho q essa série de filmes não tem muita chance de ir além da trilogia, e se mantiver o nível desse primeiro filme, será merecido.

  2. vi o filme essa semana… fica nakela conversa do “tá bom, mas… mas…”
    não preciso nem me delongar porque o texto acima é irretocavel, partilho muito dessa visão.

    e se é pra fazer um filme limitado, barato e incompleto… melhor não fazer, pois dificilmente um projeto iniciado assim dará bons frutos [vendas, consequentemente continuações].

    torcendo pelo melhor… Berserk é uma OBRA-PRIMA e merece ser mostrado na tela, ou na telona.

  3. Eu não entendi porque “Shrek ou Vida de Inseto claramente estão ultrapassados”? Se vc está falando da história/roteiros são obras boas divertidas mas que não passam de entretenimento, mas se é por causa da técnica e da tecnologia não faz sentido, toda arte audiovisual, como cinema, animação e tv vai evoluir tecnicamente, mas nenhum por isso as boas produções fetas com técnicas ultrapassadas serão esquecidas mesmo as animações em 3d!

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