UN-GO

2011 passou e deixou muitos animes de qualidade a serem lembrados futuramente, agradando aos mais diversos públicos. Mencionando alguns dos destaques, tivemos uma boa mescla de clichês otakus e sci-fi, Steins;Gate; um esforço altamente criativo e narrativo, Mawaru Penguindrum; e até uma obra a caminho de tornar-se um clássico “obrigatório”, Mahou Shoujo Madoka Magica.

E se esses são animes fortes que agradaram uma grande parcela do público, houveram alguns poucos que conquistaram apenas um tímido nicho e passaram um pouco despercebidos – este é o caso de UN-GO, obra inteligente do estúdio BONES que fez a opção de seguir um caminho menos comercial e, apesar de suas falhas, alcançou certo sucesso em sua proposta.

UN-GO é um anime baseado nas novels de Ango Sakuraguchi, escritor nascido durante o período Meiji. Suas obras possuíam um teor crítico à sociedade japonesa pós Segunda Guerra Mundial, teor tal que o anime tenta reproduzir em uma trama de 11 episódios [mais um especial de 40 minutos que foi transmitido nos cinemas, Inga Ron] para o bloco noitaminA da Fuji TV, com roteiro de Shou Aikawa e direção de Seiji Mizushima – os mesmos responsáveis pelo primeiro anime de FullMetal Alchemist.

A princípio, a série causou certo estranhamento no público – apresentada como um anime detetivesco em que o protagonista Yuuki Shinjurou, o “Detetive Derrotado” e seu parceiro Inga com um teor episódico, sua estreia foi mediana demais; porém, com o passar dos episódios UN-GO foi capaz de revelar suas grandes cartadas e melhorar a cada episódio, garantindo um anime que foi um dos mais inteligentes do ano. (Aqui confesso que eu mesma estava a ponto de largar o anime após o segundo episódio, se não fosse uma “pulga atrás da orelha” – que explicarei mais adiante)

Em termos técnicos, BONES sendo BONES; a animação é fluida o suficiente nas poucas cenas de ação e a arte, a princípio um pouco exagerada (com um character design cheio de personagens com rostos pontudos), aos poucos demonstra como é bem encaixada com o estilo sóbrio e direto da série e como foge do padrão mais comercial como estamos acostumados a acolher hoje em dia. Destaque também para o uso de cores e para a trilha sonora – com uma ED que foi uma das melhores de 2011 (Fantasy, do LAMA).

Quanto ao enredo e sua execução, temos um trabalho que cresceu pouco a pouco em qualidade como se detectasse as próprias fraquezas em seu trajeto. A trama basicamente moveu-se de forma episódica, guiada pela dualidade entre Shinjurou e o afamado detetive Kaishou Rinroku em um mundo pós-guerra futurístico em que a manipulação das informações e da verdade por trás dos fatos está sempre em jogo – mas hey, isso não é tão diferente do mundo em que vivemos, afinal…

…E é aí que reside a importância da crítica em UN-GO. Por um lado temos Shinjurou tentando revelar a verdade por trás dos fatos – até por motivos inclusive pessoais (e talvez por alguns que entenderemos melhor após assistir o especial Inga Ron) – enquanto Kaishou é o “queridinho da nação”, figura muito próxima de políticos e entidades públicas, encobrindo escândalos e manipulando informações pelo bem da ordem nacional. Casos envolvendo manipulação de entretenimento de massa, demagogia política e sequelas da guerra em suas vítimas; a verdade deduzida por Shinjurou acerca destes nunca chega ao público, pelo bem de um povo alienado e incapaz de criticar um país em recuperação a partir de métodos questionáveis.

De qualquer forma, sem boas linhas de roteiro e uma direção interessante todo esse diálogo crítico não desperta a atenção; é aqui que entra Shou Aikawa com alguns dos diálogos mais bacanas de 2011 (sem entrar em spoilers posso dizer que os diálogos contidos no episódio 04 são os melhores deste conjunto) e o diretor Seiji Mizushima com uma direção fria e austera que sabe conduzir a informação dos mistérios de forma eficiente pelos arcos – os dois primeiros episódios podem ter sido tediosos e derrubado o interesse de muitos pelo anime, mas a partir daí cada caso torna-se mais elaborado e consegue prender a atenção; por mais que UN-GO mostre muito mais força na crítica do que nos mistérios, os mistérios ganham força e complexidade o suficiente para tocar a essência crítica de forma competente. Mesmo o elemento sobrenatural de Inga, visto com suspeita na estreia pelo risco de “tirar a graça” da resolução dos mistérios, serve aos propósitos filosóficos da série e os arcos possuem conexão entre si de forma adequada.

Não nos esqueçamos do elenco de personagens também. Temos um conjunto que não é dos mais fortes, mas sabe representar bem os conjuntos de ideias necessárias. Shinjurou pode ser considerado um personagem bem humano, deixando até em certos momentos que seu emocional atrapalhe o julgamento de algum caso mas completamente focado em sua busca pela verdade, mesmo que não ganhe reconhecimento por isso. Já seu “oposto”, Kaishou, é um personagem de influência política que opta por seus métodos questionáveis em nome de uma ordem civilizada, goste ou não. Entre os secundários não é possível encontrar nenhum destaque – talvez o maior seja Kazamori – , mas isso não chega a comprometer.

No mais, UN-GO foi um anime que passou 2011 bem underrated mas soube cumprir de forma suficiente seu papel – com uma equipe e estúdio responsáveis fortes, a série soube crescer além de uma estreia mediana e foi uma “zona de conforto” para os fãs de um noitaminA cada vez mais otaku com Guilty Crown no ar e Black Rock Shooter prestes a estrear em Fevereiro. Provavelmente é um anime a ficar restrito entre “hipsters”, mas hey, acho que é bom dar ao menos uma chance para uma série com grande valor de raciocínio como esta. Recomendo a quem quiser uma trama com algo a se pensar e uma produção mais exótica.

E este terceiro Guest Post do Nahel Argama é cortesia de Mary Vanucchi, fangirl, blogueira, 17 anos e que também é a autora do atual header do blog, estrelando Nisemonogatari.

E você pode – e deve – ler mais textos de sua autoria tanto no seu blog pessoal Across the Starlight como na seção Hall da Fama do blog parceiro Chuva de Nanquim. Ou quem sabe avaliado outro anime underrated aqui no Nahel Argama, afinal, sonhar não custa.

2011 passou e deixou muitos animes de qualidade a serem […]

2 thoughts on “UN-GO”

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *