O Japão que você devia conhecer: Masutatsu Oyama, estúpido karate

Yo!

O espírito samurai do Japão criou os mais diversos tipos de heróis e uma aura em cima do orgulho pessoal que vai além da própria vida. Uma prova viva do orgulho é o do grande mestre do Karate, criador de um dos mais eficientes estilos, o kyokushin: Masutatsu Oyama, o homem que matava bois com um único golpe. O Karate Baka Ichidai.

Nascido na Coreia do Sul, Oyama se chamava Choi Hyoung Yee (que dependendo da tradução, pode ser escrito de outras formas – achei umas 4 diferentes!). Estudou artes marciais desde os 9 anos, quando seu país estava tomado pelos japoneses. Foi ao Japão, onde viveu em Yamanashi, junto de seu irmão, que estudava para ser piloto. Desde pequeno, tinha um interesse incomum em quebrar seus limites e um sangue quente, que o inspirava a seguir um caminho próprio. Durante a Segunda Guerra Mundial, Oyama escreveu com seu próprio sangue para o alistamento militar, pois queria ser um kamikaze e morrer pelo seu país, seu novo país. Por ser estrangeiro, ele foi recusado no início, mas chegou a figurar as tropas de elite de pilotos suicidas.

Eu tomei café da manhã com todos eles um dia. À tarde, quando voltei, encontrei cadeiras vazias. Eles se foram e eu não entendia por que eu não havia sido chamado. Acho que me foi dada a chance de fazer algo diferente.

Desnorteado e com seu espírito patriótico esmagado, Masutatsu Oyama vagou pelo país destruído e acabou usando seu karatê para o mal. Se tornou segurança de uma gangue local. Nas horas vagas ainda participava de um grupo de coreanos contrário à politica de seu país e que lutava pela unificação das duas Coreias. Sua raiva contra os americanos, o povo que matou seus amigos, explodia na forma de violência física a soldados que rondavam o Japão depois da guerra. Seu nome passou a ser famoso entre a polícia local e seu rosto aparecia em cartazes. Procurado pela lei, ele se refugiava nas montanhas e nesse tempo, ele conheceu a filosofia de outro homem parecido com ele: Miyamoto Musashi!

Ele leu muito sobre o lendário samurai e seu código de honra, criado a partir de sua meditação, sua vida e suas experiências. Inspirado, ele passou a tentar dominar seu lado mais sombrio ao mesmo tempo em que fortalecia seu corpo. Em um longo exílio, ele passou 14 meses distante da civilização, caçando sua comida, cortando lenha com os punhos, fazendo centenas de repetições de kata, treinando suas mãos e pés nas árvores e meditando nas águas geladas das cachoeiras. Para evitar que seu espírito fraquejasse, ele raspou somente uma das sobrancelhas. Assim, ficaria com uma aparência ridícula e impossível de esconder, impedindo-o de ter contato com outras pessoas.

Quando voltou, Oyama se inscreveu e venceu o primeiro torneio de karatê depois da guerra, ainda com seu kimono velho e sujo. Antes mesmo de poder festejar a vitória, Oyama voltou para as montanhas, onde treinou por mais 18 meses. Dessa vez, ele se focou em tornar seu karatê ainda mais direto, prático e eficiente, que possa derrotar seus oponentes com um único golpe. E voltando definitivamente à convivência social, ele fundou seu estilo, o Kyokushin-kai.

Para demonstrar seu estilo, Masutatsu Oyama enfrentou centenas de lutadores, mas sentia que seres humanos não eram mais adversários à altura. Passou a desafiar touros, em um embate onde ele quebrava o chifre do animal com um único golpe. Ele enfrentou 47 touros em sua vida. Matou três quando errou de alguma forma.

Sua fama atravessou continentes e chegou aos Estados Unidos. A Federação de Luta Livre americana o convidou para fazer exibições em seu país. Foi convencido por amigos e por um empresário que o agenciou nessa época, mesmo que tivesse ainda aquela chama anti-americana. Lá, ele ganhou o background de ser um irmão de Great Togo e lutou dentro das regras do Telecatch, mas mantendo sua filosofia: vencia com um único golpe na maior parte das lutas.

Os americanos eram engraçados. Eles realmente fingiam lutar. Eram fracos como lutadores.

Uma breve turnê acabou durando anos. Oyama chegou a treinar militares americanos nessa época e ganhou o apelido de “Hand of God”.  Além disso, seu nome ganhou uma abreviação para Mas Oyama. De volta ao Japão, fundou a sede de sua escola em uma antiga escola de balé em Ikebukuro.

Sua importância para as artes marciais no mundo é tão grande que não se limita ao seu karatê. Oyama foi professor de Tae Hon Choi, o homem que levou o Taekwondo aos Estados Unidos. Também ensinou Sonny Chiba, criador do JAC, clube de dublês de ação, e é coreógrafo de cenas de luta, como por exemplo, em Kill Bill. Seu último aluno foi Nicholas Pettas, campeão do K-1. Claro que seu livro “What is Karate?” é que foi o primeiro grande passo para a popularização das artes marciais orientais no ocidente e tornou o Karatê uma referência para os estilos de luta do outro lado do Tibet.

Haoh Shokoken!

Claro que uma figura tão peculiar não poderia ter deixado de inspirar a cultura pop japonesa. Sua história de vida virou o mangá Karate Baka Ichidai (algo como Uma vida estúpida ao Karate), do aclamado Ikki Kajiwara (de Ashita no Joe e Kyojin no Hoshi), com Jiro Tsunoda e Jouya Kagemaru. A versão animada, por motivo desconhecido, teve o nome do protagonista trocada para Ken Asuka, apesar dos detalhes serem praticamente iguais aos do mangá. Temos ainda a mais óbvia, o Mr Karate dos games da SNK, como Art of Fighting e King of Fighters, Takuma Sakazaki, inspirado em Mas até em sua pose. E podemos contar também a mais célebre, o protagonista da série Street Fighter, Ryu, que além de ter um histórico parecido, ainda usa golpes típicos do Kyokushin e tem uma musculatura inspirada na de Mas. A própria história da série Street Fighter deve muito à Oyama e suas viagens pelo mundo, enfrentando os maiores lutadores de cada estilo. Inclusive o vilão original dos games, Sagat, lutador de Muay Thai, um estilo que rivalizou com a escola de Oyama na época. Mas o mais inusitado personagem inspirado é Sawk, o pokémon carateca.

Oyama foi um homem perdido. Se encontrou ao se identificar com um samurai quinhentos anos mais velho. Criou e difundiu as artes marciais, tornando possível tudo o que vemos hoje nesse sentido, dos filmes de hollywood às competições de MMA. Foi um professor duro e agressivo, assim como o Kyokushin é. Perdeu a vida para um câncer, aos 70 anos, com um legado inestimável. Mas viveu o seu karatê, estúpido e direto, como seu tsuki que destruia chifres de touros.

O caminho das artes marciais é universal e todos os desejos egoístas devem arder no fogo endurecedor dos rigorosos treinos.

8 ideias sobre “O Japão que você devia conhecer: Masutatsu Oyama, estúpido karate”

  1. vai aqui meus respeitos á todos os karatecas da acadêmia OYAMA, e em especial ao seu dirigente da AMÉRICA DO SUL O SANSEI CHI RAN…..OSSSSSSSSS

  2. Muito bom o post mesmo!

    Eu tenho um fascínio por histórias como esta. É incrível para onde a determinação de uma pessoa a pode levar.
    Esta frase do final me parece muito acertada, já fiz vários esportes, já tentei yoga também, mas foi o judô que me ensinou algumas das lições mais valiosas que aprendi.

    Ah! Obrigada Mestre Oyama pot inspirar o Street Fighter :)

      1. Porque ele usava o termo “karate baka”, que poderia ser traduzido para “louco por karatê” ou “aficcionado por karatê”, mas perderia a nuance de baka também ser usado para idiotas, estúpidos. E estúpido, em português, também é usado de forma positiva, quando é exagerado, desnecessariamente opressivo. Ou seja, eu penso em coisa pra caramba antes de escolher as palavras, viu? :)

        1. Acho que como grande estudioso das artes marciais, ele, Oyama, não colocaria um termo pensando em suas variantes, ainda mais variantes que poderiam levar a palavras de baixo escalão.

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