Sumô Internacional

Sumô só existe no Japão? Ledo engano! Conheça os gigantes dos dohyôs mundiais!

Bem-vindos às sextas-feiras do Gyabbo!, onde os falsários são boçais!

Em janeiro de 1993 o tradicionalíssimo esporte nipônico sumô sofreu um abalo nas suas estruturas arcaicas. Pela primeira vez na história um não-japonês, Akebono Tarou, tornou-se yokozuna, atingindo o mais alto ranking do esporte. Nascido nos Estados Unidos, seu nome real é Chad Haaheo Rowan. Seu feito foi um grande golpe no orgulho para os tradicionalíssimos amantes do esporte e explicitou uma situação curiosa: enquanto, desde os anos 90, o sumô decai no Japão, ele fica cada vez mais forte e prestigiado no exterior.

Desde a conquista de Akebono, nunca mais se ouviu falar de um yokozuna japonês. Todos os que vieram a seguir eram também estrangeiros – mais precisamente da Mongólia, onde o esporte tem uma força incrível. Aliás, países periféricos das ilhas nipônicas, como China, Coréia e a própria Mongólia são os que mais entregam novos e poderosos lutadores.

Kunisada_sumo_1851Fora do Japão, o sumô sempre foi visto como um esporte, na melhor das hipóteses, exótico – e na pior, ridículo. Para vencer é simples: basta fazer com que o adversário encoste qualquer parte do corpo, com exceção das solas dos pés, no dohyo, o ringue do sumô (ou empurrado para fora dele). Mesmo assim, a sua simplicidade não encoraja muita gente a praticar – inclusive dentro do Japão o esporte está vivenciando o início de uma crise. Mas isto não impediu que muitos não-nipônicos começassem a desenvolver um interesse pela modalidade.

Recheado de rituais xintoístas (pois o esporta nasceu, primeiramente, como parte do culto religioso pré-budista), hierarquias rígidas que são vistas como humilhantes aos nossos olhos contemporâneos (nos chamados “estábulos” de treinamento, os lutadores novatos precisam fazer todo o serviço doméstico, enxugar as costas dos veteranos e comer o que sobrar da panela) e além, é claro, do vestuário (a tanga chamada de mawashi) vista como… hã… bizarra, sobretudo quando enfiada em homens com mais de 130 quilos. Tudo isto apenas colaborava para que os estrangeiros vissem o sumô apenas como algo que precisava ser “desvisto”.

11115580_919855551391108_1902285076974990260_oNo Japão, esta ilha tão cheia de tradicionalismo, o sumô continua a vigorar como um dos esportes mais populares. Mas ele só detêm este título por causa da população adulta e idosa do país. Estes sim gostam muito de sumô e sempre assistem na televisão ou ao vivo. Mas os jovens japoneses não ligam mais para o esporte. Tanto que esta pode ser uma das razões pelo qual um dos mangas de mais qualidade da Jump atualmente, Hinomaru Zumou, que conta a saga de um garoto do ensino médio lutador de sumô, não venda tanto quanto o esperado de um título que tem sempre boas colocações dentro da própria revista – sobre ele já falamos AQUI e AQUI.

Aliás este esporte realmente é muito pouco representado nos mangas. Fiz uma pesquisa na internet e os títulos que encontrei dava para serem contados nos dedos de uma só mão! Uma curiosidade: Takeshi Obata, em seus primeiros anos da Jump, desenhou um manga de sumô chamado Rikijin Densetsu (“rikijin” é o equivalente a “lutador iniciante” no esporte). Durou apenas três volumes.

Rikijin

Mas se no Japão ele mingua, em outras partes do mundo floresce. Além dos já citados China, Mongólia e Coréia, os povos do lado oeste do globo também estão de olho no sumô. Os americanos vem prestando atenção nesta modalidade há tempos como um bom estilo de luta para se praticar – e não é só porque o tamanho médio da cintura dos gringos está crescendo não!

California Sumo Association,  uma das mais representativas na América do Norte, tem conseguido fazer uma boa publicidade, conseguiram até colocar o esporte na ESPN! Vários campeonatos são disputados no país atualmente.

México, Argentina, Inglaterra, França… todos estes países estão criando lutadores de sumô, prontos para bater de frente com os japoneses! Nunca antes na história o esporte esteve tão em alta fora do arquipélogo! Para se ter uma ideia, o campeonato mundial de sumô realizado em 1997, em Tóquio, foi disputado por representantes de 45 países!

zzzE no Brasil? Bem, nós temos a honra de ter sido o primeiro país estrangeiro a sediar um campeonato deste esporte! Foi na colônia de Guatapará, no interior paulista em 1914. Trazido, obviamente, pelos imigrantes nipônicos, o sumô antes era uma das várias tradições restritas apenas para membros da colônia. Mas aos poucos ele foi ficando cada vez mais e mais conhecido fora dela. A Confederção Brasileira de Sumô foi criada em 1998, com o país sendo ainda um dos fundadores da Federação Interncional de Sumô (IFS), além de realizar a primeira competição mundial amadora fora do Japão em 2000, no Ibirapuera, em São Paulo.

Entre nossos atletas mais conhecidos, temos Willian Takahiro, conhecido como Taka, um dos grandes divulgadores do esporte em São Paulo, treinador experiente e dono de um simpático e apertadinho bar na Liberdade chamado Kintaro. Ele e o irmão cuidam do bar à noite, trabalham como advogados de dia e ainda têm tempo de treinar três vezes por semana no ginásio Mie Nishi, no Bom Retiro.

Enquanto a vida deles segue em jornada dupla aqui no Brasil, no exterior um dos nossos atletas tupiniquins conseguiu chegar ao rank de sumotori profissional:  Ricardo Sugano, ou Kaisei Ichirou como é conhecido no Japão. Um jovem gigante de quase dois metros de altura e mais de cento e sessenta quilos, ele sabe como usar a sua força física privilegiada para dar um baile nos japoneses. É uma das mais novas promessas de futuros yokozunas. O tão cobiçado título corre o risco de escorregar de novo entre os dedos dos japoneses.

Ah, vale citar algo importante: todos os campeonatos de sumô fora do Japão são classificados como “sumô amador”. O único que realmente vale é o disputado no Japão. E isto é apenas uma das muitas barreiras que precisam ser derrubadas para legitimar o esporte e popularizá-lo em outros países.

tttHá algum tempo tem havido a discussão de tentar levar o sumô para as Olimpíadas. Porém, o tradicionalismo bate de frente com um pré-requisito muito simples: é preciso que o esporte tenha uma modalidade para mulheres. Como veio de raízes patriarcais xintoístas, o sumô não permite que mulheres sequer entrem no dohyô – pois assim estariam “quebrando a pureza” do local. Um dos episódios mais emblemáticos desta política foi quando a então governadora de Osaka,  Fusae Ohta, foi impedida de entrar na arena para oferecer o prêmio ao vencedor – os campeonatos estaduais sempre convidam seus líderes para entregar as premiações. Seus pedidos de entrar na arena foram veementemente negados pela associação de sumô até que ela terminou o mandato em 2008. Este episódio manchou um pouco a barra do esporte no exterior.

No entanto existe uma modalidade feminina de sumô que, para todos os efeitos, não é considerado o sumô “de verdade”. O chamado Onnazumo é praticado por mulheres há tempos no Japão, embora tenha sido ridicularizado pelas eras como uma “apresentação de bordel”. No exterior, ele é considerado como parte do sumô verdadeiro e é levado a sério – e sim, nesta modalidade as japonesas estão tomando um pau pesado das estrangeiras também! Talvez a foto abaixo exemplifique o motivo?

000A misoginia não seria um problema tão grande se os dohyôs japoneses realmente permanecessem puros: denúncias de lavagem de dinheiro, lutas forjadas para manipular apostas e comportamentos inadequados de alguns sumotoris apenas colaboram para que muitos japoneses, sobretudo os mais jovens, desenvolvam um asco pelo sumô. Sem falar das suas regras, já citadas nos primeiros parágrafos, de exagerada reverência e serviciência hierárquica. Para muitos, o esporte é a representação de um Japão antigo que não cabe mais existir.

Entretanto, no ramo do sumô amador, os esportistas estrangeiros levam a vida bem mais tranquila. Nada de “estábulos” opressivos, mas sim dohyôs que são tão amigáveis quanto a escola de kung fu na esquina de sua casa – o que não quer dizer que os treinos físicos lá dentro sejam menos intensos do que no Japão.

A alimentação dos sumotoris costuma ser regrada para que os esportistas, apesar de todo o seu peso, não tenham um infarto a cada luta. O ensopado chankonabe é feito para dar aos atletas uma avalanche de calorias saudáveis. Porém, em outros países, como os Estados Unidos, contanto que você não se encha de Big Macs e seu cardiologista esteja só um pouquinho puto com você, tá liberada a dieta que você desejar.

0000Apesar dos esforços dos aficionados pelo esporte, o sumô ainda tem um longo caminho a percorrer. No entanto, aos poucos ele vai abrindo espaço nos locais mais inusitados.

O lutador brasileiro do UFC, Lyoto Machida, foi, na sua juventude, um campeão brasileiro de sumô! Sim, magrinhos também podem entrar na roda! O sumô não tem nada a ver com ser grande ou pesado, apesar de lutadores altos e gordos levarem clara vantagem. Há também toda uma série de técnicas para se levar à vitória e estas são tão funcionais em uma luta no doyhô como em qualquer outro lugar – Lyoto utiliza, sobretudo, alguns movimentos de projeção do sumô em suas lutas no MMA.

Lyoto_Machida_by_Marcos_Joel_ReisE aí? Ficou interessado? Gostaria de assistir uma luta de sumô ao vivo ou mesmo começar a praticar?

No Brasil, é preciso pesquisar um pouco para saber em quais locais o esporte é ensinado. Em São Paulo, onde a colônia japonesa é mais atuante, existem vários endereços que você pode conferir AQUI, além de ficar por dentro de campeonatos que ocorrem no país. Há também alguns pontos em Londrina e Rio de Janeiro.

Há ainda muitas outras curiosidades para se falar sobre o sumô que não caberiam neste artigo. Espero que tenham gostado deste rápido apanhado. Até mais!

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3 thoughts on “Sumô Internacional”

  1. Gostei muito do artigo Jussara! Eu não sabia que o Sumô está ganhando tanta expressão e força competitiva em outros países. Espero que esse esporte ganhe cada vez mais espaço em vários lugares do mundo, tanto para que possa ser praticado por homens, quanto por mulheres.

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