A tênue linha entre o prazer e a obsessão – Um diálogo com os animes BTOOOM! e Chuu2Byou

Qual é o limite da irresponsabilidade?

Assim como eu fiz no artigo “O que faz de nós seres humanos?” quando utilizei os animes Jinrui wa Suitaishimashita e Kokoro Connect para falar um pouco sobre aquilo que nos diferencia dos animais, venho através desse texto buscar exercer um diálogo entre diferentes animes dentro de um mesmo foco.

Se fiz poucos posts sobre as primeiras impressões da atual temporada de outono 2012 (e isso ainda vai ser explicado em um futuro post), das obras que gostaria de ter comentado certamente BTOOOM! e Chuunibyou Demo Koi ga Shitai! estariam na lista.

A primeira é um anime da Madhouse e tem como roteiro base pessoas colocadas em uma ilha simulando um famoso jogo online homônimo onde devem matar uns aos outros utilizando diversos tipos de bombas para que possam sair de lá, quem sabe, vivos. Já a segunda é um slice-of-life do famoso estúdio Kyoto Animation onde o protagonista busca deixar seu passado pré-adolescente onde se auto-intitulava e acreditava ser um “Dark Flame Master” para trás enquanto é confrontado por uma garota em sua nova turma que possui o mesmo problema, tomando para si a persona da “Wicked Eye”.

Apesar de tão diferentes em suas concepções – um jogo brutal de assassinatos versus uma comédia com toques de moe – BTOOOM! e Chuu2byou conversam entre si quando nos viramos para falar sobre até onde vai o limite da irresponsabilidade durante o crescimento.

Apesar de inicialmente não ter me empolgado com o BTOOOM!, uma cena, já próximo do final do primeiro episódio, me marcou muito mais do que todo o resto que viria nos episódios seguintes.

Ryouta Sakamoto, o protagonista da série, com seus 22 anos, possui como grande glória ser um dos melhores jogadores do Japão, mesmo sendo um Hikikomori na realidade. A cena que emoldura o início desse texto foi o que mais me marcou: a amargura marcada no rosto de uma mãe desesperada pelo filho que não segue em frente na sociedade que o rodeia, quase não sai do quarto. Glorifica sua vida através das artificiais vitórias de um jogo.

E é nesse ponto que precisamos retornar a falar de Chuu2byou, com adolescentes criando um mundo artificial em suas mentes e nos seus relacionamentos, um escapismo que apesar de toda comédia em cima, mostra-se complexo e sério se olhado por outra ótica. Rikka Takanashi, a outra protagonista da série, deixa isso bem claro quando afirma que “nessa dimensão” apenas duas pessoas realmente reconhecem a sua existência.

A verdade é que a mera mudança de perspectiva demonstra que Rikka está muito próxima de Ryouta do que a camada kawaii nos permite perceber em um primeiro momento.

Assim, chegamos ao ponto onde queria: Até onde vai a linha que separa o diferente, o estranho, o inédito, da alienação, da patologia, do pedido de socorro silencioso? Apesar de falar por mim, acredito que muitos leitores já passaram por algum tipo de “olho-torto” por causa de seu hobby, animes e mangas.

Fatalmente aquilo que não se encaixa no padrão de “normalidade” de uma sociedade será sim deixado de lado, ridicularizado ou pelo menos achado estranho. Mas afinal, quem determina que usar um cosplay na rua é errado? Quem pode afirmar que sair para as festas todos os fins de semana é o correto? Que passar várias horas em um jogo que lhe diverte é errado? Que acreditar na sua imaginação e fingir ser alguém por diversão, mesmo sabendo a realidade, é doentio?

A verdade é que a o próprio conceito do que é “normal” é altamente complexo para ser utilizado como parâmetro. É claro que temos normas sociais comuns a um mesmo grupo em um determinado tempo histórico, mas todas essas normas são mutantes, modificando-se a cada dia.

O normal não está no seguir fielmente aquilo que a maior parte das pessoas é ou entende como correto, mas o ser normal é aquele que consegue, dentro das suas possibilidades biológicas, sociais e psíquicas se adaptar e reagir “conforme a dança” (Desculpe, esse conceito é uma simplificação absurda do entendimento do filósofo francês Georges Canguilhem, mas o objetivo do texto não é teorizar demais, apenas dialogar), criando e recriando as normas.

E invariavelmente é aqui que chegamos à linha que separa o muito da obsessão. A questão não está na pessoa ser de um jeito ou de outro, mas sim se apesar de tudo isso ela consegue criar suas normas e responder bem a tudo que se coloca no seu caminho ao amadurecimento.

Se em BTOOOM! Ryouta é claramente doente, emerso dentro de uma realidade cristalizada, sem conseguir dar respostas àquilo que lhe questionam. Com seus 22 anos, mesmo que seu gosto pelo jogo seja grande e isso traga prazer em sua dia a dia, existe a necessidade de conseguir equilibrar o prazer com as obrigações. Produzir, se sustentar, buscar novos objetivos, se reinventar diariamente mesmo que fora do padrão linear contemporâneo de estudo-trabalho-família tradicional, tudo isso diferencia a responsabilidade que o crescer exige e que o personagem não consegue responder até a redoma que ele própria criou à sua volta seja completamente destruída.

Nem Rikka, nem Ryouta precisam esquecer dos seus gostos e diversões para viverem bem, basta que consigam ser responsáveis, atender às demandas que deles se exige – ou mesmo reinventa-las de uma maneira que possa funcionar dentro das suas sociedades e grupos menores.

Amadurecer não é vestir a máscara de “adulto responsável padrão”, mas sim ter consciência de todas as particularidades inerentes a cada um dos mais de seis bilhões de seres humanos e a partir disso criar suas próprias normas que permitam o relacionamento com o outro.

A diferença entre o diversão e alienação é bem fina, o prazer da obsessão é mais tênue ainda, dentro de toda essa complexidade, para onde você está se dirigindo?

Qual é o limite da irresponsabilidade? Assim como eu fiz […]

13 thoughts on “A tênue linha entre o prazer e a obsessão – Um diálogo com os animes BTOOOM! e Chuu2Byou”

  1. Muito bom o texto. Realmente acho que a melhor forma de se tornar um adulto é assim, sabendo lidar com suas responsabilidades e seus gostos sem deixar que o hobby te atrapalhe. A questão é saber balancear essas duas coisas para que possamos viver em sociedade de forma saudável.

  2. Ótimo texto, e tenho mais um hobby contraditório além de animes/mangás. Mas isso não influi em nada a minha vida social. Logicamente o problema é a mente do individuo em si. Como temos fanatismos desenfreados para futebol e religião também. Só que estes a sociedade tolera.

  3. Cara, mto legal a questão que você levantou. Eu havia droppado Btooom no primeiro episódio, pois fiquei extramente desanimado com os clichês apelativos e o protagonista fraco. achei que fosse ser mais um desses animes com violência barata e mulheres sem qualidade. então nem havia parado para refletir um pouco mais sobre o mesmo e a sociedade. bem diferente do q eu faço qdo assisto Zetsuen no Tempest e Psycho-pass q eu vejo e gosto de analisar as relações dos personagens e pensamentos de cada um.

    Quem sou eu para argumentar com o Gyabbo teoricamente? q eu sei q estuda psciologia e sabe bem mais do q está falando sobre o comportamento das pessoas. Eu tenho só uma opinião clara sobre o amadurecimento e a relação entre vida profissional e seus momentos fora dela. Para mim, a pessoa tem que cumprir com suas obrigações. Se ela só almeja ter um simples emprego e uma vida simples, isso é problema dela. Se ela vai de manhã e a tarde trabalhar, cumpre mto bem com suas obrigações lá, o q ela faz depois é problema dela. Ela pode sair, se divertir, ir em festa, se viciar em jogos ou filmes. O que a pessoa faz como entrenimento nos momentos de descanso dela cabe ao gosto dela decidir e eu não vou ir contra. Mas isso até o ponto em q ela não afeta outra pessoa. Pessoas sem responsabilidade podem sair, beber, causar acidentes e isso afetaria outras pessoas. Uma pessoa viciada em jogos podem causar problemas à própria família. Afinal que mãe gosta de um filho que não se envolve com a família? E com relação ao vício, qualquer vício é ruim. Uma pessoa que é fanática por algo e só sabe fazer aquilo, dificilmente conseguirá viver bem em sociedade. isso pode ser vício em bebida ou vício em jogos.

  4. O problema de Rikka parece mais complicado porque além de ela não se relacionar com mais pessoas, não aceitou a morte do pai, foi abandonada pela mãe e o avô a rejeita por causa de suas fantasias como foi demonstrado no episódio seguinte a esse que você assistiu.
    Em BTOOM, só não gostei do protagonista ter ficado com amnésia e mudado de personalidade porque tomou um choque elétrico na cabeça como foi revelado em episódio mais a frente, acho que foi o ep. 3.
    Acho que fizeram isso para torná-lo mais aceitável, pois o ep. 1 faz a gente torcer contra ele!

  5. Somente queria falar uma coisa cara, você escreve muito bem gostei muito do seu texto.E se vc não fez Enem ainda faça, pq se depender da redação vc consegue uma federal fácil fácil kkkk

  6. Olá, Gyabbo!
    Bem que você poderia fazer uma enquete, para saber qual é o perfil dos(as) fãs de animes e mangás/otakus brasileiros(as), ao menos os que frequentam este blog.
    A enquete poderia ser mais completa se incluísse coisas como:
    1.Qual a renda dos(as otakus? Se eles(as)trabalham ou vivem de mesada?
    2.Quanto é que ganham de salário ou de mesada?
    3.Qual é a classe social a qual pertencem ou se consideram pertencer: classe alta, média alta, média baixa, baixa ou remediados?
    4.Como acessam a internet: de casa, de lan house, da casa de parentes, amigos ou colegas, ou de outros lugares?
    5.Qual a velocidade: se é banda estreita (linha telefônica) ou se é banda larga (e de quantos MBs é a velocidade)?
    6.Quanto gastam em mangás, eventos, etc. por ano?
    7.Usam cartão de crédito (próprio ou dos pais) ou dinheiro para fazer as compras?
    8.Qual a faixa etária deles(as)?
    9.Quantos importam (ou compram de lojas que trabalham com produtos importados) mangás animes, games, etc?
    10.Onde moram (em que Estado, em que cidade, se na zona urbana ou rural)?
    11.Qual é o grau de ensino deles(as): Universitário, secundário, primário ou nenhum?
    12.Quantos(as)ossuem gravador de DVD ou BD?
    13.Quantos(as) baixam animes na internet?
    14.O que fazem com os animes baixados: assistem e depois deixam no HD, gravam no DVD ou BD ou simplesmente deletam?
    15.Onde compram os animes: nas lojas, na internet ou no camelô?
    16.O que os(as) fariam preferir comprar os animes legalizados (lançados no Brasil ou importados) ao invés de baixá-los dos fansubbers? Isenção ou redução de impostos, inclusive de importação, preços mais baixos, facilidades de pagamento, crédito facilitado, menos burocracia para importar, parcelamento de preços, etc.?
    17.De quanto dinheiro eles(as) acham que precisariam para comprar todos os animes, mangás, games e outras coisas relacionadas a animes e mangás? Qual a quantia que eles(as) achariam suficiente ou mais que suficiente para passar a comprar tudo o que querem, ao invés de baixar de graça?
    18.O que eles(as) seriam capazes de fazer para obter dinheiro para comprar todos os animes, mangás, etc. que quiserem (fazer “bicos”, jogar na Mega-Sena (ou no jogo do bicho), assaltar bancos, traficar drogas, sequestrar milionários, falsificar dinheiro, hackear contas bancárias para desviar dinheiro, aplicar golpes, prostituir-se, mendigar, pedir doações, vender o próprio rim, vender a virgindade, vender a alma, etc.)?
    Além dessas perguntas, poderia-se fazer mais outras que não me ocorreram colocar aqui.
    De qualquer forma, seria muito interessante ter um perfil completo (ou mais completo possível) dos fãs de mangás e animes/otakus brasileiros, para que se possa ter uma idéia de como eles são realmente, e dessa forma, entender melhor as suas ambições, desejos, reclamações, linhas de pensamento, etc. Não concorda?

  7. Muito interessante fazer essa conexão entre os animes. Também sempre gosto de tentar ir um pouco além do que o anime apresenta e fazer uma “filosofiazinha” ;)

    Também não sou nenhum psicólogo (pelo contrário, estou em Exatas), mas acho muito importante se perguntar se suas particularidades (aquelas que fogem à norma) são realmente particularidades, fugas saudáveis da realidade, ou te imobilizam, impedindo seu amadurecimento.

    Só para comentar mesmo: agora que Chuu2Byou terminou, pelo que eu entendi a Rikka aceitou a morte do pai, e toda aquela realidade que ela fantasiava passou a ser algo saudável em sua vida. De fato, uma particularidade, parte da sua identidade, e não uma “doença”.

  8. Eu acho que amadurecer não tem nada aver com um cara assiste futebol e torce para time (a) ou time(b) , ou ele assiste ufc então ele é mas adulto que aqule ali que está lendo aquela historia em quadrinhos , as pessoas jugam sem saber as vezes nada sobre nos Fanimes , eu fiz este nome porque eu acho muito ofencivo otaku, uma mulher de igreja me pegou lendo Berserk na rua foi falar que a isso é do demonio a que isoo num pode se ler você tem de ler a biblia a quele velho bababababbababababbaba, de sempre sempre que eu vejo um anime como estes que fala para com o espectador eu analiso da seguinte forma ou ele quer dar uma mensagen super importante ou ele é aluno de gonagai e foda-se tudo kkkkkkkkk, estas não são as primeiras obras sobre Fanimes e nem seram as ultimas, eu credito que quando comessarem a nos compreender então no futuro eu creio em um brasil cheio de nos e com cada vez menos pessoas do pão e circo .
    :D

  9. Enquanto eu dava uma olhada nesse post um cara passou do meu lado e perguntou o que caralhos eu estava lendo, tentei inutilmente explicar e fui metralhado com olhares e questionamento de por quais motivos eu vejo esse tipo de coisa.

    ps: Estou no trabalho que normalmente é frequentado por adolescentes entre 15 e 17 anos e só queria comentar sobre essa situação.

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