VN REVIEW: Saya no Uta

Saya no Uta, eroge (18+) de horror escrito por Gen Urobuchi (Madoka Magica, Psycho-Pass, Aldnoah.Zero), é uma visual novel de muito sucesso lançada em 2003 pela Nitro+, disponível oficialmente também em inglês. Apesar de curta (6-10hrs), as três possíveis rotas exploram diversos temas com um horror muitíssimo original, impressionando com um plot excelente, lindo visual e uma OST hipnotizante, capturando os sentidos do leitor por completo.

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Após sofrer um acidente de carro durante uma viagem familiar, é duro para Sakisaka Fuminori sentir-se feliz por ter sobrevivido. Assim que recobre a consciência, seus sentidos mostraram que não havia perdido somente seus pais, como também toda a vida que costumava levar antes da fatalidade. Preso a uma percepção de mundo em que as demais pessoas são criaturas desformes que fedem a carne em decomposição, em que tudo lhe parece amontoados de carne e sangue, nada resta ao nosso protagonista senão náusea e repulsa pela realidade que o cerca. Nada, com exceção de Saya.

Em meio ao horror do mundo de Fuminori, Saya, uma misteriosa menina, aparece uma noite à sua cama de hospital, o único traço de beleza e pureza que não foi afetado por sua esquizofrenia. Encantado com sua aparência, projetando na menina sua própria salvação, o rapaz e ela fazem um trato: em troca de ajudá-la a encontrar seu pai, antigo médico do hospital, ela deveria ir morar com ele quando fosse liberado para casa. Sozinha no mundo e enfim tendo encontrado alguém que valorizasse sua presença, Saya realmente passa a amar a companhia de Fuminori, da mesma forma que ele depende cada vez mais dela. Logo os jovens se veem vivendo como recém-casados (em todos os sentidos), compartilhando uma vida completamente alheia às demais pessoas.

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Ao longo das 9 horas e 30 minutos de leitura, Saya no Uta me impressionou de diversas maneiras, sempre positivamente. No entanto, se for para escolher o ponto mais forte da vn, diria que é a riqueza com que a história lida com o tema da insanidade. Mesmo que os personagens, em sua maioria, não sejam profundamente trabalhados, todos cumprem muito bem o papel de expor a fragilidade do ser humano diante do horror e do desespero. Quanto ao cumprimento dessa proposta, não tenho dúvidas de que a vn foi perfeitamente executada, mas há muito mais para analisar.

Afinal, para que as situações de horror tenham peso, é importante enxergarmos o contraste que elas representam com os momentos paz. O jogo entre o estável e instável se faz presente o tempo todo, explorando o ponto de vistas dos diversos personagens. Como a atitude de nosso protagonista causa suspeita desde o primeiro contato pós-cirurgia com seus amigos, a sombra da dúvida está sempre presente. Mesmo que Kouji queira acreditar na recuperação de Fuminori, a nova postura do melhor amigo não inspira confiança alguma. Oumi, a namorada de Kouji, está especialmente desconfortável com a situação, mas não mais que Yoh, ainda mais confusa graças aos sentimentos que nutria pelo rapaz. Não há inocência ou mesmo muita perspectiva de que as coisas melhorem, então mesmo os momentos mais tranquilos expõem o constante peso no coração dos personagens. Ainda assim, fazem uma dança interessante entre os pontos mais tensos da história, de maneira que o leitor compreende o abismo que há entre experienciar o inferno e apenas temer sua existência.

As primeiras horas são basicamente para familiarizar o leitor à condição desesperadora de Fuminori, a sua relação com Saya e as poucas demais personagens. Por sinal, acho legal apontar como o formato escolhido para a caixa de texto favorece a condição do principal como personagem, não apenas um canal para o jogador interagir com a história. Para a situação tão extremamente específica, a opção pelo NVL (caixa de texto ocupando a maior parte da tela) e por atribuir voz e rosto ao protagonista foram essenciais para ilustrar o peso da vida de Fuminori, que é o que importa. Como é impossível identificar-se e compreender na íntegra o que ele está passando, a equipe fez uso de todos os recursos para ilustrar o personagem, uma decisão muito correta em minha opinião.

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Outro detalhe que merece ser exaltado na vn, além da excelência dos três possíveis finais, é o espaço à livre interpretação de quais finais seriam “bons” ou “ruins”. Dependendo do ponto de vista, essa ponderação poderia ser aplicada a qualquer um dos finais. Mais do que saber jogar com os personagens que dispõe, apresentando situações intrigantes e envolvendo o leitor em tensão, Saya no Uta reproduz com genialidade as tensões entre conflitos pessoais e sociais. Mesmo agora, não sei dizer qual seria o melhor fim para cada personagem, quanto menos para a humanidade como um todo. A vn conquista ao colocar a própria moral do jogador em questão, atribuindo a nós mesmos a responsabilidade de analisar cada final sozinhos.

Após a intensa exposição às cruéis verdades acerca da conduta humana, é impossível não se envenenar. Assim como o oxigênio puro é prejudicial à saúde, também a realidade nua e crua põe em cheque a sanidade de qualquer um. Desta maneira, melhor se deixar embriagar pela escuridão e conhecer cada possível desfecho da história! Minha recomendação seria ver o 2º final, depois o 3º, para só então o 1º. Seguindo esta ordem, que eu ousaria dizer que começa com o mais provável “true ending”, o 1º final (bem mais rápido e “tranquilo”) ganha muito mais peso e significado. Só após tendo visto os rumos que a história poderia ter seguido, a sobriedade deste último compreende-se como um final tão ou mais solitário que os demais. Por sinal, meu final favorito é de longe o 2º, e o de vocês?!

Saya no Uta explora tudo que eu queria e muito mais. Um prato cheio para quem gosta de horror e ainda temperado com um pouco de ficção científica. Enfim, espero que tenham gostado do jogo tanto quanto eu (e da review também!). Não se esqueçam de comentar suas experiências, opiniões e também sugestões para o próximo post! Estou pensando em Muv-Luv, cuja adaptação para mangá foi anunciada pela Nova Sampa (na verdade, foi o Muv-Luv Alternative, mas chegaremos lá!). Preferem DRAMAtical Murder primeiro, que logo terá seu anime concluído, ou mesmo outra visual novel? Fico no aguardo, até a próxima!

mainArtMuv-Luv!

Sobre Clara

Sou apaixonada por quadrinhos desde que me entendo por gente, mas desenhar tem espaço no meu coração há mais tempo ainda. Nas horas vagas, costumo ler, assistir anime e fingir que toco piano. Quando não estou tendo pesadelos, estou sonhando com as figures que nunca terei. </3

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One thought on “VN REVIEW: Saya no Uta”

  1. Poxa, excelente review! É uma pena que tenham parado com as postagens sobre Visual Novel, tento sempre acompanhar as matérias sobre o assunto, ainda mais agora que passei a desenvolver roteiros para VN’s. Acho que seria um bom momento para arriscar no gênero novamente, já que a Steam e o App Store têm nos mostrado que o público que aprecia Visual Novel aumenta a cada dia!

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